00 - o começo de tudo

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Jimin rodopiou sem conseguir impedir o sorriso tímido que surgia em seu rosto.

Ele tinha a mania de dançar em frente aos espelhos, embora não conseguisse fazer um décimo dos passos que executava ali na frente de qualquer outro ser humano.

Gostava de olhar nos próprios olhos enquanto ondulava o quadril, ele mesmo surpreso com a facilidade que possuía para fazer movimentos tão suaves e sensuais.

Gostava de passar as mãos pela pele suave do seu pescoço. Quente, pulsante, como ele mesmo se sentia.

De emaranhar os dedos entre os fios descoloridos. De olhar a si mesmo enquanto ia ao chão e voltava, suspirando enquanto sentia os próprios toques subindo da panturrilha aos joelhos.

Jimin era lindo.

Jimin era absolutamente lindo, mas não conseguia enxergar isso quando não dançava.

Gostava das batidas graves da música ditando o modo como seus ombros iriam se movimentar.

Fechou os olhos, quase em êxtase com o refrão. O volume estava tão alto. Era como se só ele existisse no mundo.

Só daquela vez, Jimin não se culpou tanto.

Ele merecia um descanso.

Só hoje, faltaria aos ensaios. E à faculdade. E ao mundo.

Hoje, seria somente ele e ele mesmo.

Fazendo sua própria refeição.

Saboreando o toque picante que o tempero argentino acrescia no molho de tomate.

Sem distrações.

Só hoje, sem seu celular.

Fitando o Sol se pondo apoiado no parapeito da varanda.

O vento no rosto.

Fitou as suas mãos.

Mãos tão delicadas, mãos tão frágeis, mãos tão doloridas de treinar sempre. Mãos alvas, com algumas pintinhas aqui e ali.

Tirou as roupas.

Colocou a música preferida para tocar.

O banheiro estava alaranjado, com os últimos filetes de luz solar tornando o ambiente um tanto quanto enevoado e místico.

Mal conseguia se enxergar na penumbra, mas não seria necessário.

Estava, de novo, em frente ao espelho.

Notou a barba por fazer, lançando pêlinhos eriçados em todas as direções.

Os mamilos entumecidos de frio.

O umbigo, rodeado por algumas cicatrizes de quedas antigas na infância.

As estrias nos antebraços.

As celulites nas coxas fartas demais para os padrões coreanos.

Os tornozelos fortes, resilientes, mesmo depois de tantos tropeços.

Os pés rosados, as unhas redondas.

Se sentia um pouco tímido, mas reuniu toda a coragem que possuía.

Olhou-se. Nos próprios olhos.

Estavam vermelhos, e ele não lembrava de já ter chorado tanto.

Conteve os soluços, achando que deveria falar qualquer coisa, mas era impossível.

Eles vinham incontroláveis. Então só restava dizer o que queria em pensamento.

Jimin,

você é amado. Você é querido.

Você tem se esforçado tanto, seria absurdo se não estivesse tão cansado.

Mas também vem se cobrando demais.

Não dá para carregar o peso do mundo inteiro nas costas.

Me perdoe, eu sei que você faria isso se pudesse. Mas não dá.

Você é um só, e já é tanto.

Tudo bem precisar das pessoas.

Tudo bem continuar se apaixonando vez atrás de vez por caras que fogem de relacionamentos.

Tudo bem pedir ajuda.

Tudo bem confessar.

Jimin, está tudo bem.

Você é amado.

Você é querido.

Você é especial e não venceu a corrida dos espermatozoides por mero acaso.

Sabe, há coisas que esperam por você em algum lugar.

Seja na Coreia do Sul ou em Bogotá, em algum lugar do mundo, existe um propósito esperando para ser desvendado.

Talvez você se realize apenas dançando.

Talvez, mesmo que um pouco improvável, o Jimin verdadeiro se encontre dando aulas de álgebra.

Nós não sabemos. E tudo bem.

Um segundo a menos ainda é um segundo a mais, Jimin.

Pare de correr tanto. Olhe as flores.

Veja o mar. Enfrente seus medos e apresente-se em público pela primeira vez.

Não se deixe enredar pela correria.

Pelos estudantes morrendo por causa de um vestibular. Pelos empresários atolados em planilhas financeiras. Pelos reclamões de plantão que nunca têm notícias boas para dar.

Seja mais.

Você é mais.

Trate a si mesmo com carinho, por favor - porque como se não bastasse o mundo lá fora gritando que não somos bons o bastante, ainda temos que lidar com nossas auto cobranças o tempo inteiro.

Eu mereço viver bem. Eu mereço ser feliz. Então me trate melhor. Faça do amor próprio mais do que os versos que você reposta no Instagram.

Jimin respirou fundo.

Entrou no box, ligou o chuveiro.

Deixou a água gelada lavar.

Começou em um ritmo lento, espalmando o pênis há muito tempo intocado.

Suspirou, sentindo a característica fisgada nas bolas, indicando o orgasmo latente. Depois de tanto tempo sem, estava absurdamente mais sensível. Mas não era isso.

Gozou, sentindo, mesmo sob a água corrente, lágrimas grossas verterem.

Jimin gozou na alma.

Estava, pouco a pouco, entendendo o significado real de amor próprio.

Não seria fácil, fez questão de se lembrar.

Doloroso é um eufemismo para os momentos que ainda viriam.

As autodescobertas. Os gatilhos inconscientes. Ele sabia.

Mas tinha a si mesmo. Era completo. E estava pronto.

Jimin era lindo.

E agora, só esperava que pudesse lembrar disso mesmo quando não pudesse dançar. 

dimple [park jimin]Onde histórias criam vida. Descubra agora