Capítulo 2

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"Verdes acinzentados". Eu nunca notei ela antes, seus olhos eram lindos. Ela desceu agora.

Eu sai me esbarrando numa velha mal educada, foi de propósito, essa ai é estressada, vai acabar morrendo do coração.

Tomas me espera inerte, a cabeça encostada de lado na parede daquele ponto de aparência desgastada.

"Você demorou!" sem raiva, só cansaço.

"O ônibus atrasou. De boa aí?"

"Fui demitido."

"Merda, foi culpa dele não foi?"

"Não, foi minha. Vem comigo, abriram uma nova cafeteria e o cappuccino chega a ser decente."

"Tá okay , só não posso demorar."

Você percebe o lugar de longe, a fachada chamava atenção, era azul com flores de tinta.

O cappuccino era bom o suficiente e o cheiro de bolo fazia minha escolha medíocre valer apena. Ele em compensação estava terrível e quase me fazia repensar.

"Mas você tinha que ir até ele, aquele embuste só quer confusão."

Segurei sua mão e encarei seus olhos. Castanho escuro quase preto, pareciam os meus só que mais cansados e vermelhos, aspiravam ressentimento e colidiam em satisfação culpada.

"Eu sei garota mas eu não consegui pra falar bem a verdade, ele mereceu e você sabe."

"Porra Tomas, você tem que esfriar, tu não é nenhum super-herói não, tenta cuidar de si mesmo na próxima e se meter um pouco menos na vida dos outros."

"Garota" suplica, sorriso torto, mais culpa.

"Até qualquer hora, tenho pouco tempo e uma matéria para escrever do zero."

Me despedi com um beijo em sua testa.

"Certeza que não quer carona?"

"Preciso andar, mas valeu Tom."

"Se Cuida Be, sem enrolação, você conhece seus dons em procrastinação."

"Até mais, vê se tu consegue se ajeitar antes da tia descobrir em."

«»«»«»«»«»

O meu apartamento fica perto, quinze minutos e já estou olhando para as escadas. O elevador quebrou meses atrás e ainda não foi consertado, pelo menos eu moro no terceiro andar.

"Poderia ser pior" Um homem respirando pesado, a voz é afinada demais, "locutor talvez?" Sussurro baixinho.

Ele estava longe, suas palavras chegavam com o eco do corredor, ele era otimista. Resolvi ir rápido, gente otimista sempre quer conversar.

Vou passar o resto da noite escrevendo e bebendo meu café preto sem açúcar, eu tenho uma cafeteira mas nunca uso, para mim o ritual é tão necessário quanto a cafeína.

A água fria batendo no metal. O som das faíscas elétricas. A boca do fogão acessa em azul. Metal contra metal e seu contraste no meu silêncio metódico. Água quente quase fervente, vapor. Três colheres de café artesanal vindo da quitandinha simples de tia Lurdes. A água que escorre lenta e precisa no filtro adentra a garrafa térmica vermelha, me exulto no cheiro forte de café fresco.

Catarse.

Isso é tudo que preciso para virar uma máquina capaz de escrever por horas a fio, que é o exatamente o que faço até tarde da madruga.

Joguei meu corpo já exausto em minha cama antiga que parece ter vindo de tempos nobres, aqueles onde tudo era construído de madeira maciça feita para durar, mas agora ela é quase mal assombrada e só me lembra que quem dormiu nela antes de mim provavelmente já morreu.

Fico espiando o meu teto sem realmente conseguir ver nada além daquela escuridão rotineira correndo pelas paredes, até que percebo eles ali, são os olhos verdes me olhando. Verdes e imponentes. Sérios.

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⏰ Última atualização: Oct 30, 2019 ⏰

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