Capítulo I

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Inglaterra – Final do século XIX

— Ivinória Hiil, onde você está? — Quando a mãe de Ivi a chamava pelo nome ela sabia que estava em apuros.

— Estou aqui, mamãe!

Ivi desceu rapidamente da égua Ventania e desamarrou a cesta de ervas medicinais que estava presa aos arreios. Em questões de segundos já corria na direção da velha casa segurando a cesta com uma das mãos e o barrado do vestido com a outra.

— Quantas vezes já lhe disse que não a quero sozinha naquela floresta?! — Ermioni saiu na varanda secando as mãos no velho avental e encarou a filha com olhos desaprovadores.

— Ora, mamãe, não há qualquer perigo lá. O medo que as pessoas têm é fruto de superstições bobas, nada mais! Eu precisava de algumas ervas e cogumelos e...

— Filha, não se trata de superstição! Existe mesmo um perigo real lá! De uma vez por todas, não a quero sozinha naquele lugar. Estamos entendidas?

— Então porque não me conta qual é o perigo que existe lá, mamãe?

Ivi crescera ouvindo histórias sobre desaparecimentos de moças que estariam relacionados à misteriosa floresta; casos que nunca tiveram solução, por essa razão os mais idosos consideravam a região amaldiçoada. Mas ela não acreditava que um lugar tão magnífico pudesse abrigar mais do que animais silvestres, com os quais ela sabia lidar muito bem, diga-se de passagem.

— Não importa qual é o perigo! Basta saber que ele existe... — desconversou Ermioni. — Prometa-me que não voltará lá.

— Está bem, mãe. Não quero vê-la preocupada.

— Prometa, Ivinória! — insistiu Ermioni cruzando os braços com o semblante carrancudo.

— Sim... eu prometo! — disse ela com um suspiro resignado, largando a velha cesta sobre a mesa.

Ivi e a mãe moravam sozinhas desde que Enrico falecera. A morte do pai mudou profundamente a vida de Ivinória, que passou a ter sobre si o peso de muitas responsabilidades.

A casa em que elas moravam era simples e estava às margens de um pequeno lago, cercada por pomares, plantações e criadouros de animais que serviam para o consumo doméstico. A pequena propriedade ficava nos limites da grande floresta, que apesar das histórias macabras que a envolviam, fornecia lenha e muitos produtos medicinais que elas usavam para tratar inúmeras doenças.

Ermioni era extraordinariamente culta para a mulher de um humilde lenhador e transmitiu à filha o gosto pela leitura. Ela também lhe ensinou a arte de curar utilizando plantas medicinais e outros produtos naturais.

Apesar de os poucos recursos econômicos de que dispunham, que nos últimos tempos, invariavelmente, vinham da venda de chás, unguentos e xaropes, Ivi frequentava livrarias e bibliotecas quando ia à Londres. Os livros se tornaram companheiros nas horas de solidão e aplacavam a sede de conhecimento que tinha desde criança.

Aos 17 anos se apaixonou por um rapaz da nobreza e sofreu a primeira decepção amorosa. Gustav, Visconde de Merthaus, a assediou até conquistá-la e depois de lhe roubar a pureza teve coragem de desprezá-la em público, dizendo que moças pobres como ela serviam apenas para dar prazer a homens da posição social dele. Depois disso, Ivi se fechou para novos relacionamentos, não permitindo que outros rapazes se aproximassem.

— O que está preparando, querida? — quis saber Ermioni ao ver a filha selecionando ervas, mel, azeite e outros produtos.

— Vou transformar o sabão que produzimos em algo mais apropriado para o banho.

Uma doce coincidênciaOnde histórias criam vida. Descubra agora