Capítulo único

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                 Me arrumei, despretensiosa, nervosa. Me arrumei, me maquiei e tirei a maquiagem. Me maquiei de novo e me arrumei mais uma vez. Eu estava nervosa, não podia esconder, era meu primeiro encontro com aquele cara que eu esperava já há tanto tempo. Idealizei todo dia, pensei todo dia, desejei diariamente que isso acontecesse. Consegui, conquistei. Mas agora me olhei no espelho e quis me rearrumar mais uma vez, não gostei do que vi. Não quis mais me olhar no espelho, respirei fundo. Peguei a bolsa e logo tranquei a porta atrás de mim. Respirei fundo mais uma vez, acho que minhas mãos estavam suando e eu tremendo. Ou o contrário, já nem sei mais.

                   A vontade de tocar a campainha era enorme, mas o tremor que tomava conta do meu corpo era maior ainda. Hesitei uma, duas, três vezes. Na quarta respirei fundo, e toquei a maldita campainha. A porta se abriu quase de imediato, não antes de ouvir um "já vou". A porta abriu e eu estremeci. Meu deus, como ele estava lindo. Que homem lindo, eu vou desmaiar aqui. As pernas bambearam, meu sorriso saiu tremido que eu mal consegui dizer oi. Fiquei eternamente me perguntando porque eu aceitei encontra-lo na casa dele. Eu não responderia por mim com toda certeza. Aquele sorriso sereno me inundou. Encheu meu coração e minha alma como nunca tivesse acontecido antes. Ele sinalizou para entrar e eu só o fiz, me acomodei no sofá admirando aquele rapaz de pés descalços perguntando se eu queria alguma coisa para beber. Disse que estava bem, por enquanto não seria nada.

                Ele sabia agradar, começou uma conversa distraída sobre pequenas coisas, pegou uma garrafa de vinho, e logo me serviu. Disse que eu parecia tensa e eu tinha certeza que estava. Meu Deus, eu queria era virar aquela garrafa inteira de uma vez, jogar o rapaz na cama e subir nele. Tudo junto de uma vez. Ou só gostaria de criar coragem dentro de mim e flertar com ele. Parece que desaprendi tudo, não estou aqui por mero acaso. O que caralhos estava acontecendo comigo?! Bebi duas taças de vinho seguidas, sem nem pensar sobre. Precisava relaxar, ele tinha certeza que eu precisava. Colocou uma música ambiente para tocar. Tão leve, tão gostosa que eu comecei a me embalar de pé apoiada no portal da varanda enquanto admirava as luzes da cidade. Ele tinha uma bela vista, impossível não admirar. Acho que me perdi um bom tempo olhando para fora, fiquei absorvida em meus pensamentos. Por vezes quis me beliscar e saber se aquilo tudo estava sendo real. Ouvi ele me chamar, mas não consegui sair daquele transe intenso. O vento, a música, o cheiro do vinho, as luzes da noite me inebriaram.

               O senti me puxar a mão, me convidar gentilmente para dançar. Aterrei, sorri. Relutei levemente, mas não resisti mais de 5 segundos sendo guiada até o meio da sala. A música era agitada, animada. Ele rodopiava desengonçado comigo, me jogava de um lado para o outro enquanto gargalhávamos. Nos servimos de mais vinho, continuamos em nossa dança desengonçada, mas sincronizada. Cheia de sorrisos trocados, de carícias discretas. Olhares profundos que se trocavam sem medo. Eu ainda me sentia nervosa. Ele sabia o que queria, sempre soube. Só esperava a brecha surgir, o momento certo. Aquele sorriso, como eu me perdia nele ao longe, agora tão perto que perco até o ar. Como se alguém tivesse feito de propósito a música mudou da água pro vinho. Um vinho lento, suave, calmo. Ele me puxou para si, segurou minhas mãos junto ao peito, beijou minha testa e encostou sua cabeça em mim. Dançamos assim. Em silêncio, querendo que o tempo se eternizasse no momento. Éramos um só. Devagar ele foi baixando minhas mãos para sua cintura. O enlacei comigo, e ele segurou meu rosto. Ajeitou meu cabelo. Sorriu gentil. Tomou meus lábios, lentamente. Como a música que tocava, ele se deixou levar por ela. E quanto a mim, já nem sabia mais nem mesmo meu nome. Me deixei ir por ele, era meu guia, era aquele que me mostraria seu mundo para mim. Mas por um momento tive vontade de parar tudo e ir embora correndo. Tive medo, tive ânsia. Meu corpo tremeu no primeiro toque e no segundo. Veio o terceiro. Relaxei, deixei suas mãos escorregarem pelos meus braços, envolverem meu corpo.

                Senti seu perfume se impregnar pelo meu corpo. Seu beijo se tornar ávido, veloz. Nosso desejo um pelo outro aumentar. Você fez questão de deixar tudo tão confortável. Você fez questão de mostrar que aquele momento era só nosso. Estava tão ansioso quanto eu, mas muito mais certo do que queria do que eu. Você me queria como eu sempre te quis. Tive medo novamente, medo de me entregar demais. Fechei os olhos. Deixei você me guiar no escuro, deixei você ser a luz. Deixei sua risada entrar em meus ouvidos e me fazerem acordar novamente. Te desejei outra vez, te quis cada vez mais. Você me quis como eu te quis mais uma vez. Por que esperamos tanto por isso? Porque não nos tivemos antes. E eu que estava com medo, me maquiei de coragem e me despi do medo. Me deixei embalar em seus braços e abraços. Me deixei ser levada por você. Tantos anos esperançosos, e eu aqui me questionando de novo porquê esperar tanto. Porquê esperar tanto tempo para te amar.

                 Sim, amar. Eu amava e tinha certeza disso cada vez mais. A cada ida ao céu, a cada vez em que a luz da lua batia em meu rosto. A cada momento eu tinha mais certeza. Nos despimos juntos do passado e nos embebedamos do presente. Nos enchemos até o gargalo um do outro. Ficamos sóbrios e bêbados. Era a nossa noite, a primeira de muitas. Tentei não fechar os olhos, tentei assistir o sol nascer contigo. Não consegui, senti o corpo pesar, os olhos arderem. O sono chegava com calma, como fora aquela noite, me abraçava e me dizia que o amanhecer seria ainda melhor. Senti seu calor me cobrir, envolver a mim e a você. E eu que tive medo, e eu que não quis sair. Hesite, repensei. Tive medo e quis voltar. Não queria arriscar. Agora sei que não me arrependo. 

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