— Isso não pode ficar assim — concluiu o namorado da irmã.
Ela concordou: — Se não fizer nada, depois vai acontecer pior.
— Você vai deixar pra lá e passar por idiota? — indagou o irmão.
— Se fosse comigo ele ia ter o dele — garantiu a tia.
— Um sustinho, só pra aprender a respeitar os outros, não é má ideia — concordou o pai, incentivando.
Só a mãe era contra a retaliação. "A vingança pertence a Deus, meu filho, não precisa você ter pressa nem fazer justiça com as próprias mãos. Confia e espera", dizia dona Celina.
O problema era essa última palavrinha. Esperar até quando? Mauro se sentia ultrajado como ser humano, como homem e como profissional. Sabia de vários casos em que um sócio passou a perna no outro, mas achava-se imune ao risco, tamanha a confiança que tinha em Fernando.
Esperar pelo castigo divino para o ladrão? Por quê, para quê? Que nada! Era preciso agir antes que a raiva passasse e sobrasse apenas a vergonha que sentiria dele mesmo.
De nada adiantava a pressa para ir à forra, porque afinal não sabia o paradeiro de Fernando. A lição que, segundo seus conselheiros, deveria aplicar, era consequentemente inviável. Enquanto não tivesse uma chance concreta de se vingar, o máximo que podia fazer era alimentar o ódio.
Até ser passado para trás, sentia que a relação com o amigo seria melhor definida como cumplicidade, não sociedade, tal a proximidade entre os dois. Apesar das diferenças de gosto e personalidade, sempre se afinaram e apoiaram um ao outro em momentos de dificuldade.
Mas hoje, olhando em retrospectiva, achava que o tempo todo Fernando agiu de modo a esconder intenções que teve desde sempre. Não demonstrava grandes ambições. Jamais revelou ânsia em usufruir de uma parceria com o amigo rico. Deixou que tudo acontecesse naturalmente. "De quem foi mesmo a ideia para abrirmos um negócio e virarmos sócios nesse fast food que acabou virando uma rede? Foi minha. Eu era quem achava que precisava dele como sócio pra coisa dar certo. Que idiotice!"
Além de vergonha, culpa. "Logo eu, que sempre disse que nenhuma mulher era digna de confiança, sou enganado por esse moleque barbado", martirizava-se.
Mudava de ideia. Não tinha sido um plano friamente traçado. Só pode ter sido algo que aconteceu nos últimos tempos, que transformou o caráter do ex-amigo. "Não é possível, ele não era assim. Eu não sou tão burro". Procurava identificar em que momento notou alguma mudança e era pior, porque não conseguia lembrar nada. A conclusão se alterava novamente. "Sou burro sim. Porque ou esse babaca sempre foi mesmo isso ou mudou e eu não fui capaz de perceber, trabalhando do lado dele todos os dias".
Dois meses tinham se passado desde o dia em que encontrou a maior parte das contas da empresa raspadas, os investimentos sacados e um bilhete, escrito a mão, em cima de sua mesa na sala que os dois dividiam. Um bilhete cínico, no entendimento de Mauro.
"Tive que fazer isso. Me perdoe. Um dia eu te explico. Um dia eu te pago".
Gelou ao ler, porque não sabia o que era "isso". A última frase antes da assinatura, no entanto, dava uma pista clara.
Abriu os aplicativos bancários e foi vendo uma a uma as contas zeradas. Quase teve um troço ao constatar o mesmo nas corretoras onde mantinham aplicações. "Meu Deus, como vou pagar os fornecedores, os funcionários, como vou comprar mercadoria pra manter tudo funcionando?"
Foram inicialmente duas semanas de desespero e tentativas de negociação. A falta de capital de giro assumiu contornos dramáticos. Os bancos amigos dos tempos de vacas gordas negaram empréstimos ou ofereceram a taxas abusivas.

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Sócios - até que a traição os separe
ContoMauro confiou cegamente no sócio, até o dia em que Fernando deu um desfalque na empresa e sumiu. Agora ele tem que se esforçar para que o negócio sobreviva, enquanto procura o amigo que lhe enganou, com ajuda da namorada do fujão, que também se sent...