Entre os trilhos do túnel do metrô algo como uma poça ondulante se movia, escorrendo em um reflexo amarronzado, vindo da estação Vila Mariana para a Santa Cruz. Um medo insinuou-se em mim, como se algo ruim caminhasse rápido pelo escuro, mas eu não tinha tempo para pensar naquilo; precisava ir trabalhar e talvez esse fosse o motivo do incomodo. Mesmo assim a poça marrom ainda se movia em direção à estação.
Primeiro foi o chão que tremeu desproporcional à trepidação dos trens, em seguida um estrondo abafado ecoou pelo túnel e a poça ondulante invadiu a plataforma lotada, como uma maré alta de baratas que trazia consigo um tapete cinza-encardido que chiava como ratos. O pandemônio teve início tão logo as pessoas deram-se conta da invasão: gritos histéricos, pulos, empurrões, gente caindo no chão e sendo encobertos pelas pragas e outras, submersas por elas ao caírem nos trilhos, tentando se salvar como se estivessem se afogando.
Outro tremor anunciou que havia um perigo maior que fazia baratas, ratos e pessoas fugirem juntos. As luzes piscaram e muitas luminárias se apagaram, várias estouraram e permaneceram soltando faíscas, iluminando em flashes macabros as cascas envernizadas dos insetos em todo lugar, inclusive nos rostos contorcidos de pavor. Um tremor mais forte fez o concreto se rachar e pedaços do teto caírem sobre os que tentavam subir as escadas uns por cima das outros.
Eu estava paralisado, encostado na parede, enquanto baratas velozes passavam sobre meus sapatos. O vento forte e quente vinha da direção da Sé, onde eu desceria para chegar ao trabalho, e a certeza de que um perigo poderoso estava a caminho tirou-me do torpor paralisante. A estação tremia como que num terremoto, o concreto em volta do elevador se partiu e a estrutura tombou sobre as pessoas, quebrando ossos e esmagando corpos, depois rolou com calma, caindo enfim nos trilhos.
Andei vacilante para frente, pisando em baratas atrasadas, e olhei para dentro do túnel. Pessoas corriam pelos trilhos, vindo da estação Vila Mariana, o vento rugia trazendo o anúncio da chegada de um trem veloz. Gritei e abanei os braços para que eles saíssem da frente, no entanto não fui ouvido, e o trem em altíssima velocidade, com fogo saindo pelas janelas quebradas, passou por cima de tudo e todos em seu caminho como uma besta abissal, descarrilhando em seguida e derrubando os pilares da estação.
A fumaça preta e a poeira tornando o ar rarefeito, pessoas tossindo e gritando ao mesmo tempo, o ar faltando e sem ar não fico nem fodendo! A força muscular movida pelo instinto de sobrevivência incendiou-se em mim. Corri empurrando as pessoas, escalei o que restou da retorcida estrutura do elevador ferindo as mãos na ferragem exposta, quando fui puxado para traz com um tranco, porque minha mochila enroscou em algo. Soltei-me dela e assim que levantei a perna para apoiar o pé no concreto quebrado da parede, fiz um corte longo na coxa. A porta do elevador não abria, por isso fui obrigado a sair pelo vidro quebrado e ganhei mais um corte, dessa vez na barriga.
No andar de cima as luzes piscavam e o concreto do teto caía sobre as pessoas, erguendo uma nuvem de poeira que rodopiava dentro de uma ventania muito mais forte do que o normal naquela estação. Dando braçadas como se nadasse num mar de pessoas, avancei alguns metros, pisando em buracos macios no chão onde os pés afundavam e era difícil dar outro passo.
Como em um campo de batalha a multidão se empurrava para o lado errado, pois quem vinha da rua ou do Shopping Santa Cruz fugia para dentro da estação e quem vinha das plataformas fugia para fora. O vento quente soprava com violência desmedida ali também, vindo de todos os lados como uma tempestade de areia e pedregulhos. As luzes que sobraram estouraram, lançando rajadas de finos cacos de vidro em todos nós, cravejando e ardendo na pele e a única claridade vinha das faíscas das luminárias. Na parafernália de barulho de gritos, vento rugindo, concreto caindo, todos os selvagens tentavam se salvar sem saber exatamente do quê.
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SÃO PAULO EM CHAMAS
Science FictionEnquanto esperava o metrô chegar, ele reparou em um movimento anormal no túnel e naquele momento soube que algo poderoso vinha rápido em direção à estação, mas aquilo foi só o começo do apocalipse. São Paulo em Chamas é ambientado no estressante met...