O Fantasma no espelho

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Tiquetaque. Tiquetaque. Os ponteiros iam e vinham devagar. Nunca paravam. E ele nunca parava de se observar.

Perdia-se nos olhos fortemente coloridos a preto e branco. Vislumbrava a própria boca que já tinha sido cosida e recosida tanto em sorrisos quanto em expressões tristes, mas que havia encontrado a posição ideal em linha reta. Também observava o resto, que não passava de pano branco rasgado.

O vento ria-se dele por de trás das paredes espelhadas. Não se ouvia nada mais que o seu riso lascivo. Além disso, atirava-lhe pedras diretamente ao paladar. Já não sentia as próprias mãos, mas não se importava, não precisava delas. O cheiro de morte sentia-se de longe, no entanto, apesar dos esforços do vento, o próprio cadáver mal parecia se aperceber deste.

Olhou tanto para si mesmo que nem viu o espelho a estender o braço e pintar-lhe os olhos de vidro, saindo, de seguida, pela janela que nunca existira, deixando os reflexos sem espelho algum que separasse as massas de nada que eram.

Separaram-se e flutuaram para cima.

Tiquetaque. Tiquetaque. Os ponteiros iam e vinham mais depressa.

O Fantasma no EspelhoWhere stories live. Discover now