Fim do encontro

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Ouviu-se choro, gemidos, e ganidos cortando o ar em todas as direções enquanto caminhava.

Corpos animalescos quebrados, olhos vidrados para os céus cheios de fumaça sufocante, a crueldade e o sangue por todo o lugar, ela conseguiu sentir o gosto amargo da dor e do desespero em sua língua.

Se desviara dos corpos e dos feridos, ninguém a notara, cada qual em seu mundo de sofrimento. Os tufos preguiçosos de cinzas se agarrando em suas vestes, sua pele. No entanto, a deusa não conseguia desviar os olhos do que vira.

Ao longe avistou os dois corpos que, mesmo quebrados, tentavam se arrastar em meio à miséria para estarem juntos.

Tanto sangue, tanta dor.

Sentiu seus olhos queimarem e mesmo que seu coração lhe implorasse para ajudá-los ela não ousou. Apenas assistiu.

Ela devia assistir.

Viu o braço do macho tentando chegar à sua companheira. A corrida para estar com ela antes que a morte por fim viesse lhe reinvidicar. Viu lágrimas nos olhos dela, os lábios trêmulos se mexendo, suas promessas de amor vacilando pela dor, seus dedos lutando para se encontrarem. Um último toque desesperado.

Por fim ela não se aguentara.

Correu.

Correu com todas as suas forças, as lágrimas escorrendo pelo rosto vazando sua tristeza, suas pernas tentando levá-la o mais rápido possível até ambos.

Ela prometera que estaria ali em seu último suspiro.

Então, se lançou em seus joelhos; ambos haviam, por fim, conseguido se unir, os dedos se tocando sofregamente, e um pequeno suspiro foi dado pelo macho, antes de seu peito parar completamente.
A fêmea iria logo em seguida, mas antes se colocou sobre seus olhos para que a visse.

Olhe-me!

A fêmea cansada focou seus olhos na deusa.

Eu prometo.

Ela fechou os olhos, parecendo aliviada, antes de dar um pequeno sorriso cansado e seguir seu companheiro.
A deusa ficou ali por um tempo sentindo suas lágrimas caírem no solo, todo seu luto por aqueles que morreram na horrível guerra, cada criação perdida em meio ao caos do ódio, cada um deles tendo sofrido. No entando, se sacrificaram sem medo da morte que encontrariam ao final de tudo.

Gentilmente, uniu as mãos que lutaram com tamanha teimosia para se tocarem no fim. E puxou suas essências.

Sem limpar o rosto, apenas se levantou, deu as costas àqueles corpos quebrados, completamente ocos.

No entanto suas mãos agora os tinha.

A cada passo dado sentia que a promessa que havia feito por fim fechava seu coração ferido e, antes de voltar para os céus, abriu seus dedos e espiou suas queridas estrelas brilhando e aquecendo suas mãos. Sem perceber, um pequeno sorriso triste curvou seus lábios.

Suas belas preciosidades, seus filhos, que logo iriam renascer e se reencontrar.

Naquela noite a Lua chegou mais cedo e ela sangrava, vermelha e brilhante no céu, por seus queridos que haviam partido.

O selo de sua promessa.

Para um novo recomeço.

Para um reencontro.

Homens, Estrelas E LobosOnde histórias criam vida. Descubra agora