Capítulo 2

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Estou tentando não pensar no assunto. Já é quase meia-noite. Coloco uma das minhas musicas preferidas para tocar. "Ai oboete imasuka". A letra e a voz de Mary Iijima sempre me fazem chorar. Mas dessa vez não caem as lágrimas de sempre. Tudo porque não consigo tirar o maldito regador de minha mente!

Já estava quase escurecendo quando despertei com a cara enfiada nas flores de meu jardim. Estava todo sujo e dolorido, mas, ao mesmo tempo. Muito alegre. Tudo havia sido um sonho, um maldito pesadelo possivelmente provocado pelo excesso de calor, ou pela falta de sono ou algo do tipo. Nada que eu tivesse com que me preocupar, afinal, é uma coisa normal às pessoas desmaiar em por esses motivos.

Fui para casa e mandei uma mensagem ao meu chefe, explicando que tinha passado mal e por isso não havia ido. O máximo que ele faria seria né escalar para trabalhar no natal e no ano novo mas e daí? Pelo menos eu estava aliviado.

Fui fazer o meu jantar com, só cortar uma abobrinha, me lembrei.

"E o regador?"

Fui até o quintal e revirei tudo. Nem sinal do negócio. Olhei dentro de casa e... Nada!

Aonde eu havia colocado aquela droga? Sim, pois é óbvio que não havia deixado dentro de meu pesadelo. Devia estar bem debaixo de meu nariz... Eu poderia estar com ele na minha frente e simplesmente não o notar. Isso já havia acontecido com facas no açougue. Não seria algo inédito.

A música mudou de Mary Iijima para Coco. "Equal Romance". Sim, sou um pouco masoquista. Nunca tive um bom relacionamento mas adora músicas românticas. O bom de morar sozinho é que dá pra escutar o querer gosta sem medo de ser julgado ou analisado. O ruim é que desenvolvemos uma tendência de ficarmos falando sozinhos, muitas vezes nos analisando. E comum até mesmo saírem altas discussões entre eu e eu!

Como abobrinha com arroz e feijão. Minha mente muda do regador para o pesadelo. Geralmente esquecemos rápido o que sonhamos mas, contínua tão vivido aquele sonho! Lembro-me das lápides, das estátuas... Só não consigo lembrar o que estava escrito na "minha". Se eu pudesse escolher alguma frase, talvez colocasse "não se diz estátua, mas monumento!", Só pra deixar os visitantes intrigados com essa escolha.

Tentei procurar qualquer sinal do regador nas proximidades do jardim. A lua cheia brilhava no céu sem nuvens, parecendo um queijo amarelado. Costumo ficar olhando para ela, perdendo tempo tentando ver aonde as pessoas enxergam são Jorge nela quando eu vejo somente um coelho.

Tum!

O regador vai com tudo em minha cabeça. Por ser de plástico nem doeu, mas quase morri de susto!

Fiquei paralisado por alguns segundos, olhando o regador no chão. Logo depois, comecei a olhar só redor, para ver se achava o imbecil que o havia jogado em mim. Minha casa é cercada por muros altos de ambos os lados, mas poderia ser um um idiota em uma escada. Nada.

Fui em um muro , depois em outro, encostando minha orelha nós muros para tentar escutar alguma coisa,talvez uma risada ou coisa do tipo. Silêncio.

Será que eu coloquei o regador em algum lugar alto, me esqueci do que fiz e depois não percebi o regador quando o procurei? Muito difícil, e seria sinal de que eu estava enlouquecendo. Não gostava de pensar nessa hipótese, mas fazia mais sentido eu perder um parafuso ou dois devido à solidão e a tragicomédia que se tornou minha vida, do que um regador sumir e aparecer do nada!

Já imaginava as manchetes nós sites sensacionalistas: "açougueiro enlouquece e começa a ver coisas, além de falar com peças de carne e cabeças de frango".

Restávamos apenas eu e o regador. Fui pegar e notei que alguma coisa estava dentro dele. Mexi um pouco e notei que seu interior estava totalmente seco, como se não colocasse água nele há algum tempo. E nele tava uma espécie de moeda. Peguei e tentei ver de que tipo era. Tinha uma efígie em um dos lados e do outro uma inscrição.

"AVE HOMINIBUS, MORITURI TE SALUTANT"

Meu sangue gelou. Deixei o regador no chão e entrei com a moeda, que parecia ter sido fabricada ontem, em minha cozinha. Com as luzes acesas, fiquei contemplando o objeto.

Alguém brincava comigo. E essa pessoa me conhecia muito bem. Em minha adolescência, participei de um grupo religioso, do catolicismo ultraconservador, que era sedevacantista. Eles acreditavam que o Papa atual era um farsante e que por isso o trono papal estava vago e assim ficaria até que um bispo, da mesma linha de pensamento que eles, assumisse. E pensar igual a eles, significava principalmente uma coisa: reconhecer como válida e verdadeira apenas a missa rezada em latim. Para seus seguidores, eles ofereciam cursos dessa língua de forma gratuita.

"Salve Homens, os que estão para morrer te saúdam!"

Foi a primeira língua " estrangeira " que aprendi. Nunca contei sobre isso para ninguém, nem mesmo minha ex.

Quem brincava comigo me conhecia muito bem.

Olhei para a figura presente na moeda. Ela era familiar, mas não conseguia me lembrar de onde. Era uma pessoa de cabelo Chanel, uma mulher pelo jeito...

Minha playlist continuava a tocar. " Little date" , cantada pela banda Ribbon.

A mulher de meu sonho. A estátua no cemitério!

Deixo a moeda cair em cima da mesa, de tão aterrorizado! Meu coração dispara, quero fugir, correr... O que está acontecendo?

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⏰ Last updated: Dec 09, 2019 ⏰

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Um cemitério em meu jardimWhere stories live. Discover now