Capítulo 1

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Sky Malloy


Novamente o par olhos azuis me encaravam fixamente, como se fosse capaz de ler minha alma e me decifrar em poucas palavras, com desconfiança, medo, terror e ansiedade. Penetrando-me tão profundamente que mais um pouco atingiria meus ossos, como uma presa fácil de se pegar e rasgar ao meio. Silenciosamente.


Com a respiração ofegante, fazendo o peito subir e descer de forma dolorosa, eles se alternam entre meus lábios, dedos e olhos e eu sinto cada vez mais o ar me faltar, deixando-me impossível de respirar.
Meu coração bate valente, como um tambor.


Estou com medo.

Mirados em meus lábios levemente tingidos na cor vermelho sangue — sua cor natural —, questionava-me silenciosamente se eu devia mesmo correr esse risco, de sair vagando por essas ruas escuras e melancólicas de Starlight, onde o cheiro de medo e morte estão impregnados do chão à parede, tendo a lua como testemunha de cada ação brutal.
Mordo o lábio inferior sem muita força e corro a mão pelo cabelo perfeitamente arrumado — caídos abaixo dos seios —, ao pensar na probabilidade, na quantidade de vidas que já foram tiradas por entre esses becos e vielas por coisas insignificantes. Um pouco de dinheiro, provocações e até por alguns litros de sangue e pequenos pedaços carne fresca.

Eu não sou como eles!

Não faço parte desse mundo!

Eu não deveria estar aqui...

Me afasto do espelho abruptamente, mandando para longe todas as cenas traumatizantes na qual já presenciei desde que me entendo por gente, e caminho de volta para meu quarto. Mordo o lábio inferior sem muita força, novamente, e me jogo na cama macia. Pego meu celular sobre o criado-mudo com urgência e vou direto no app de conversa, entrando no meu bate-papo com Giulia, minha única amiga. Encaro a imagem que ela mandou vestida em uma saia, botas e moletom, juntamente com um "vai ser legal" e deixo de me morder. Reviro os olhos e suspiro. Afasto o celular dos meus olhos, jogando-o para longe, fazendo-o se perder entre os lençóis bagunçados da cama. Me levanto em abrupto, determinada a pedir a meu pai para sair somente essa noite, nunca havia pedido nada parecido, mas queria sair somente essa noite, uma única noite, talvez ele permitisse somente essa vez, já que possivelmente não haveria nenhuma outra. Contudo, passos rápidos e pesados juntamente com o som de algo se quebrando no andar de baixo me fez afastar todos os pensamentos que me invadira e se arrepiar da cabeça aos pés.

Saio do quarto vestida no pijama com qual estava e desço as escadas calmamente, dando um passo de cada vez. Talvez fosse somente algum animal que tivesse entrado e mexido em algo.

— Papai? — Chamo-o, estranhando o silêncio claustrofóbico instalado nos cômodos escuros. — Papai! — Chamei-o novamente, descendo os últimos degraus da escada e olhando desde a sala à cozinha.
Avancei na sala e pela janela fiz uma rápida vistoria na varanda e Starlight parecia ainda mais sombria do que já aparentava diariamente. As casas vizinhas estavam com as luzes apagadas e não se via pessoa alguma passando por ali, nem mesmo animais. Nem os postes estavam funcionando direito, bruxuleavam sem parar. Talvez seja por causa da festa que está acontecendo no centro da cidade ou Starlight realmente é assim e eu nunca havia reparado, de fato.

Me afastei da janela e olhei para além da sala, vendo o lustre no vão da cozinha bruxulear, relutando entre manter-se ligado ou desligar de vez e levar a casa para o breu completo, mais do que já estava.

— Papai? — Tentei novamente, direcionando-me para o único vão que tinha a luz ligada.

Capturei cada detalhe que meus olhos podiam alcançar do cômodo, com atenção, assim que entrei. Um jarro que meu pai havia trazido do evento Stella no sul do país, este que estava espatifado no chão, virando grandes pedaços inúteis de cerâmica. O balcão da cozinha com algumas coisas desorganizada e as facas que meu pai cuida com tanta cautela espalhada no balcão e chão. Arranhões no balcão do centro da cozinha e as cortinas que davam para o quintal abertas, expondo a noite escura e penumbrosa.

Há algo errado, eu sinto.

Um fraco e quase inexistente suspiro invadiu meu ouvido e tomou minha atenção, me fez pegar uma das facas largadas no balcão e olhar atenta para o meu redor. Eu não estou sozinha.

— Quem está aí? — Questionei, mesmo sabendo que seria inútil e ninguém responderia. Olhei em alerta para todos os lados do cômodo, com meu coração batendo acelerado no peito. Estou com medo.

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⏰ Última atualização: Dec 24, 2019 ⏰

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