Na praia. Cap 1

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-Majestade, você precisa tentar caminhar. - A empregada colocou mais alguns panos quente sobre a testa da jovem rainha. Ainda assim, ela continuava a suar frio, sentia arrepios e não conseguia mover as pernas.

-Isso tem que... -parou para respirar.-...ficar entre nós do barco. Você entende?

A pobre empregada apenas consentiu.

- Eu sou uma rainha. Doença é fraqueza. Se eu cair, ou... -engoliu seco, procurou as mãos da empregada, e apertou-as. -... morrer, meu reino vai morrer, as pessoas de Romena estão contando com isso.

Elena tremia e batia com os dentes um no outro, mesmo com o calor sufocante do barco. Os quartos eram muito abafados. Na memória da jovem rainha vinha somente os rostos das pessoas que ficaram em frente ao castelo para se despedir. Pela primeira vez a tempos, ela viu esperança, viu sorrisos no rosto de um povo que vive em plena miséria. Um povo magro e que clamava por comida. Agora, reavido as esperanças, gritavam na despedida:
-"Salve a rainha Elena."

Buscava na memória, para reconfortar a dor agonizante da doença, um rosto familiar. Lembrava de Georgia, uma amiga especial, a quem secretamente amava de um jeito que seria punido se fosse descoberto. Georgia havia ficado em Romena, não suportaria ver sua amada se casando.
A memória era como um quadro bem pintado e emoldurado. Fixo. Na pintura, elas estavam nuas, com os corpos entrelaçados, no chão da biblioteca, onde se encontravam em segredo. A despedida, era de tirar o fôlego. O desejo era de fundir os corpos pra que elas fossem uma só.
Elena parou de tremer.
A empregada olhava assustada, mas continuava molhando o corpo da rainha e massageando-lhe as pernas. Todos que estavam naquele barco eram de confiança e guardariam o ocorrido a sete palmos de terra.

-Traga-me folhas e selos. -Pediu a rainha, com a voz rastejando.

-Você tem certeza, majestade? -A empregada hesitou. Tinha medo de deixa-la sozinha, um segundo sequer. Admirava sua rainha e tinha um afeto amigável.

A rainha fitou-a com os olhos, agora com um brilho de vida. Mordeu os lábios. Uma ideia surgira.

-Falta apenas 5 dias para chegarmos.-Elena comentou.

-Você vai ficar bem, eu prometo. Vossa Majestade é forte como uma muralha. -a empregada sorriu docemente.

Elena gostava muito desta empregada. Era a jovem Luzia, uma mulher que se parecia muito com ela. Tinha olhos castanhos claros, cabelos negros, longos, ondulados na ponta e uma pele branca, acizentada, devido ao clima de inverno predominante em Romena.

-Por favor, Luzia, traga-me o que lhe pedi. E convoque todos que puder.

Apesar de estar adoecida. A rainha ainda tinha uma voz firme e  ostentava sabedoria.

Luzia obedeceu, desta vez sem hesitar. Levantou-se do pé da cama e fez exatamente o que a rainha pedira.
Primeiro trouxe as folhas e a caneta.
Ajudou a rainha a ficar em semi leito para que pudesse escrever.
A rainha escreveu ao todo; três cartas. Em meio a algumas tosses, paradas para respirar e a pertinente fraqueza.
Entregou todas na mão da jovem e apontou.

-Esta é para Georgia. Esta para o rei Ian, e esta é para você. A do rei Ian você só entregará se for necessário e a sua quero que leia após eu conversar com a tripulação e o restante das pessoas que embarcaram comigo nesta jornada. -A rainha disse tudo num só ar. Retirou de si toda força que sobrara. A doença talvez sempre esteve lá, no entanto com os limitados recursos do barco, Elena se via a beira da morte. Se culpava por ter esquecido de levar consigo uma curandeira, seria útil. Talvez.
Ela ja havia aceitado seu destino, podia ver luzes saindo do espelho do quarto. Também via de relance, sua mãe, com uma aparência jovem, como ela lembrava aos 6 anos de idade. A imagem sorriu pra ela e depois sumiu, num piscar de olhos. Ela deduzia que já estava nas ultimas.

A porta do quarto se abriu e imediatamente foi ficando sem espaço. Todos rodiavam a rainha.

-Majestade. -O oficial da viagem fez reverência, tirou o chapéu e ajoelhou-se.

Todos estavam em silêncio, alguns se perguntavam como a forte rainha Elena chegara aquele ponto. A maioria tentava evitar o olhar de pena, e a fitava com respeito. Ela ainda era a rainha.
Foi como o destino. Ela disse o que havia pra dizer e simplesmente fechou os olhos. Elena foi a rainha mais gentil e reverenciada que Romena teve. Todos queriam pensar assim. Ela apenas fechou os olhos e um vento vindo do mar, a levou para reinar em outro reino.

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Luzia deixou derramar uma lágrima que a brisa do mar, rapidamente, fez secar. Estava na parte de cima do barco, vendo a manhã surgir. Poucas pessoas haviam acordado.
Sentia tanto. Tinha tantas dúvidas. O vestido que usava agora era outro. Bem mais bufante que o de costume. E ele fazia aumentar seu nó na garganta. Uma noite. Só faltava uma noite pra encarar sua nova missão. Que já não era tão simples como esfregar roupas e servir a mesa.

Elena. Elena. Elena.

Ela repetia pra memorizar seu novo nome. Um misto de insegurança, receio e ansiedade.

Eu nunca serei como ela. Pensou.

Segurava numa mão, a carta que sua rainha escrevera para ela. Demorou 3 dias para criar coragem para ler. E agora já nem estava tão certa de que devia. Respirou fundo e tomou a coragem necessária.

"Luzia, a escolhida

Não tema. Nada acontece por acaso. És forte e descobrirá isso no caminho. Você, agora, está encobrida de salvar Romena. O povo pobre, sofre. Você faz parte desse povo, e é por isso que sei que fará melhor do que eu faria. Não quero que volte para lá. Georgia será regente. Faça sua vida em Zaspen. Seja feliz acima de tudo, mas nunca se esqueça da sua terra. Você agora é uma rainha, nunca deixem que te digam o contrário. Se imponha. Seja firme. Acredito em você. Você foi a minha esperança, por isso estou indo em paz.

Reine como uma mulher forte de Romena"

As lagrimas desceram, desta vez, sem censura. Sentiu o peito doer, algo apertando-lhe os pulmões e ganhando espaço no seu corpo. Um mal-estar. Era o luto. Era o medo. Era tudo.

Luzia aceitou fazer a viagem para ajudar os pais. Ganhariam uma quantia boa que os poupariam por um tempo da fome. Sua mãe, seu pai e seu irmãozinho mais novo, Julius, eram uma motivação para salvar seu reino e fazer aquilo que antes parecia ir contra todos os seus valores.

Ela retornou ao quarto e ficou por lá até o dia do barco atracar.

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⏰ Última atualização: Apr 07, 2020 ⏰

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