PRÓLOGO

3 0 0
                                    


Havia uma casa abandonada no fim da rua. Era em estilo antigo, meio colonial; com uma vasta varanda na frente, de onde pendia um sino que cintilava quando o vento, eufórico, vinha pela mata que existia em volta do terreno onde estava a residência. De longe, ela era estranha; de perto, poética. Poderia ser refúgio para meliantes, camundongos, fantasmas, aranhas, Elviras rebolando seios; poderia ser tudo, menos um lugar para quem temia qualquer aparição de fantasmas mortos-vivos errantes.

A casa tinha uns três andares, além de sótão e porão. De aparência velha, com defeitos expostos para quem quisesse ver, ela estava carcomida pela ação do tempo. Na frente, um jardim abandonado e sem vida escondia uma fonte que, quiçá, um dia jorrou água pelos querubins de aço que ainda resistiam à ação do tempo. No fundo, atrás da varanda que existia depois da casa, já no canto, se aproximando do muro que havia ali também, um pequeno duende espiava tudo que acontecia dentro da casa. Ninguém duvidava de que algo acontecera ali, mas por que ninguém se interessava mais por aquilo? E por que não consta nenhum registro desses acontecimentos? Era um mistério que, pela disposição da vizinhança e da cidadela, continuaria a ser destruído pela ação do tempo. Talvez aqueles moradores estivessem esperando que aquela ela desabasse ou que alguém, mais insano ou rebelde, chegasse ali com um isqueiro, uma vela, um coquetel molotov e desse fim a agonia de ver a casa se desfazer.

Não havia registro de um crime pavoroso, algo que pudesse inspirar um filme hollywoodiano. Por toda a rua, imperava a lei do silêncio. Ninguém falava nada e nada era sabido sobre aquela mansão caindo aos pedaços no fim da rua. De certo, só o fato de que, mesmo com anúncios na imobiliária da cidade, sites de compras na internet ou algo do tipo, ninguém se interessava em comprar/alugar aquele trambolho.

A velha casa no fim daquela rua era uma incógnita que deixava qualquer forasteiro abismado pelo mistério que havia nela e pela indiferença dos conterrâneos em não falar sobre sua existência. De fato, só mesmo sua existência fatídica no fim daquela rua bonita e vivaz onde não havia espaço para qualquer melancolia, além da extrema felicidade e das cores dos jardins que existiam antes de haver a presença daquela velha casa abandonada no fim da rua.

Havia uma dezena de casas de cada lado da rua. No seu fim, porém, estava a construção abandonada. Na frente dela, um terreno abandonado. Do outro lado, onde estava o fim da rua de casas alegres com a casa velha no seu fim, um muro que dava para uma floresta. Uma floresta medonha e fechada; carregada de mistérios e de mitos. Depois do muro e da floresta, uma montanha pendia no fim de tudo. Lá de cima, parecia tocar o céu. Era de lá que o sol se punha e trazia a noite que vinha se arrastando pela montanha, caindo sobre a floresta, atravessando o muro do fim da rua e alcançando a velha casa abandonada. Só depois de todo esse percurso, a rua inteira era tomada pela escuridão. Quando isso acontecia, fachos de luzes desciam dos postes prostrados geometricamente sobre as calçadas que pela inexatidão em muito lembrava as velhas ruas das cidades velhas da Europa de séculos atrás. Se durante o dia, a rua parecia pular das páginas de um conto de fadas; quando anoitecia, era como se toda aquela plasticidade e beleza se tornasse cenário de um filme B de terror de espanto duvidoso.

O movimento nas calçadas ou sobre o asfalto pouco diferia se fosse dia ou noite. A verdade é que, apesar de tudo e da discrepância que havia da casa no fim da rua para as demais, pouco se via ou se sabia das pessoas que moravam naquela região. Nada. Não havia quase movimento nenhum: vez em quando um carteiro aparecia, um carro de som ou algum morador dava às caras; vez em quando ou quase nunca.

Aquela rua era evitada pelos moradores da cidade. Havia uma lenda urbana sobre o que, de fato, havia acontecido e por que tudo era assim. O que ninguém entendia era como uma velha casa abandonada tinha feito fama, e má-fama, a ponto de afugentar dezenas de outras casas e mudar a rotina dos moradores que ainda persistiam em viver ali.

O que havia acontecido? Por que ninguém morava ali? Quem foram os últimos inquilinos? Para onde eles foram? Por que ninguém se interessava pela pelo local? Onde estavam os vizinhos das outras casas da rua? Essas eram perguntas para os poucos que ainda tentavam desvendar os mistérios da velha casa abandonada no fim daquela rua de casas coloridas que se encontrava com a floresta.

fim do prólogo

You've reached the end of published parts.

⏰ Last updated: Jan 02, 2020 ⏰

Add this story to your Library to get notified about new parts!

O CURIOSO CASO DA CASA 83Where stories live. Discover now