Querido Estranho

1- O novato

Primeiro dia de aula e provavelmente serei obrigada a ir sem tomar banho. Esqueci de dizer que tenho um irmão mais velho chato e que adora implicar comigo, principalmente nas manhãs que sabe que acordo já mau humorada.

- Richard eu preciso tomar banho! - Reclamo.

- Quando? - O deboche dele causa mais raiva.

- AGORA! SAI LOGO DESSE BANHEIRO! - Perco a paciência.

- Estou com dor de barriga e não vou tirar a minha bunda do vaso tão cedo. - Sou capaz de ouvir um barulho de peido atrás da porta.

- Se tivesse levantado na hora que avisei teria entrado no banheiro primeiro. - Ela faz questão de lembrar.

- Só eu que acho que nessa casa deveria ter dois banheiros? - Indago.

- Toma banho quando chegar da escola. Já está atrasada. - Observo minha mãe descer as escadas de madeira.

Tomar banho de perfume não deve se tão ruim como parece. Acho que não tenho outra opção já que Richard não quer sair do banheiro. Volto para o quarto correndo antes que escute minha mão reclamando mais uma vez que estou atrasada. Pego minha calcinha da sorte na gaveta que está um pouco rasgada, mas ainda me traz sorte. É difícil de acreditar, mas todas as vezes que a usei aconteceu algo de bom no meu dia. Tiro a roupa que estou e começo a colocar o uniforme. Essa saia rodada sempre me deixa desconfortável, ainda mais que quanto mais lavo na máquina, mais parece encolher. A blusa branca de botão com o pequeno símbolo da escola na parte esquerda do seio está apertada, sinal que também está encolhendo ou que engordei nas férias. Prendo o cabelo, já que quase quebrei o pente tentando tirar os nós e antes que me esqueça preciso esconder um pouco essa espinha na ponta do meu nariz. Pego um pouco da base e espalho, fazendo com que disfarce um pouco. Calço as minhas sapatilhas preta e pego a mochila que já deixei arrumada com o material para hoje. Desço as escadas correndo e quase sou capaz de tropeçar entre meus próprios pés. Observo de longe o sonho de doce de leite que está sobre a mesa e não penso nem duas vezes em correr para pegá-lo.

- Nem pense em pegar o sonho. - Minha mãe estraga minha felicidade. - É do seu pai.

- Será que os homens aqui em casa tem mais direito do que as mulheres? - Sento na cadeira e vejo que minha única opção na mesa é o pão integral.

- Sua glicose e seu colesterol estão um pouco alto. Sabe que tem que cuidar mais da sua saúde. - Mais um esporro para começar o dia.

- Animada para o primeiro dia de aula do seu último ano na escola? - Vejo meu pai entrar na cozinha e pegar o sonho de doce de leite que tanto desejo.

- Animada mesmo só estarei no último dia de aula. - Sou sincera.

-Acho que já deveria pensar em qual faculdade quer fazer. - Minha mãe é especialista em iniciar o dia reclamando e principalmente me cobrando.

-Bom, está na hora de eu ir. Até mais tarde. - Me levanto da cadeira e pego a mochila antes que minha mãe comece com o sermão sobre a faculdade.

-Não escovará os dentes? - Ela indaga.

-Na escola, já que Richard morreu no vaso. - Lembro a ela. - Beijos e amo vocês!

Dizem que a pressa é inimiga da perfeição e, com certeza, também é a minha inimiga. Para minha sorte a escola não fica distante da minha casa, mas chegar quase atrasada todos os dias é minha especialidade. Vejo o portão da escola já quase fechando e corro com a mochila pesada nas minhas costas para entrar a tempo. Sem perceber tropeço entre meus pés e perco totalmente o equilíbrio, caindo de cara no chão. Vamos dizer que voei de cara no asfalto. Com certeza o ventinho que estou sentindo entre minhas partes íntimas não são nem um pouco agradáveis.