O dia estava extremamente frio naquele final de manhã. Embora eu suasse pelo trabalho pesado que eu viesse fazendo desde cedo, cada gotícula que corresse por meu corpo era gélido. O vento cortante, que penetrava por nossas roupas grossas, desmascarava o inverno rigoroso que se aproximava. Foi um desacerto a decisão de iniciar a colheita tão próximo ao fim da estação.
Frio semelhante foi visto apenas há anos. Sem dúvida, não será um inverno fraco o que se aproxima. Espero apenas termos comida o suficiente para todos que se juntaram ao orfanato nos últimos meses.
Entretanto, qualquer argumento não será desculpa para me livrar de minhas tarefas, que no momento são indispensáveis. E é com tal pensamento que me orgulho de ter um sorriso no rosto – junto com a terra e o suor, ao colher as batatas junto com meu prestativo companheiro, Lako Bolger.
Nós, sendo os mais velhos entre todos os jovens que aqui residem, éramos os encarregados das tarefas mais pesadas. Foi uma semana longa para nós dois, então estávamos realmente satisfeitos e alegres com uma atividade tão simples, como a que nos foi disposta.
Inalando grande massa daquele ar frio, me levantei e comecei a carregar a cesta repleta de batatas.
- Vais conseguir carregar sozinha? – Perguntou Lako, olhando-me com os olhos semiabertos, por conta do sol.
- Sou muito mais forte do que pensas – Respondi, convicta. Acho que isso ficou claro ao longo da semana.
O garoto suspirou, cabisbaixo.
- E vais me deixar sozinho? Digo, essas meras batatas não são de boa companhia. Sem querer ofender, batatas.
- Entendo. Pois venha me ajudar, Lako – Falei agora em alto tom. Este cesto está decerto muito pesado.
- Mas é claro! Será de grande agrado te ajudar!
Ele se levantou, entusiasmado, e tomou para si um dos lados da alça.
- Muito obrigado – sussurrou.
Não tive receio em soltar um riso abafado.
A casa estava com um cheiro espetacular do que a Sra. Had preparava para nós. A mulher em si nunca fora muito simpática, mas o que ela cozinhava era divino. Ela tinha o prazer de cozinhar, e para nós, alguns órfãos e outros abandonados acabavam por nos sentir especiais por ter tal agrado. O senhorio da casa fazia questão de que nos sentíssemos especiais.
A mistura de aromas complementava meu apetite e despertava uma fome depois de uma longa manhã de trabalho.
Foi ao pisar meu pé na cozinha que uma garotinha levantou-se de suas obrigações e correu até mim, com um dos pés mancando. Della, uma garotinha de oito anos que foi recentemente enviada para cá. Fiquei surpresa pela alegria que a cercava, há dias ela não passava apenas de uma criança abandonada com um coração partido e solitário. Agora ela, animada de modo que nunca vi segurava minha mão e sorria.
- É permitido eu perguntar o motivo da alegria? – Perguntei, não conseguindo evitar um sorriso.
- Hoje é sábado! – Declarou ela, entusiasmada. Além de ser o teu aniversário, hoje é o dia que você vai nos contar mais uma...
- Ah! Lembrei-me! – Falei a interrompendo. Não recordava que hoje é meu aniversário, muito obrigada. Sra. Had, nós poderíamos nos ausentar de nossas atividades por ora?
A mulher limpou as mãos e me olhou nos olhos, com seu jeito ligeiro. Seu olhar de desgosto me era desagradável, mas tentava sempre ser gentil e respeitá-la. Afinal, nunca se deve comprar briga com quem faz sua comida.
Ela desviou o olhar para a mesa agora cheia de batatas e tornou a me encarar.
- Vou permitir, só porque é o seu aniversário. O Sr. Arvo voltará hoje mais cedo e almoçará conosco, então preciso que todos estejam apresentáveis.
- Sim, Senhora.
Ela tornou a me encarar, até que se virou e tornou a fazer seu habitual trabalho.
Della agarrou minha mão e me conduziu pela casa freneticamente, Lako vindo logo atrás, atrapalhado e confuso pela situação. Eu já entendia que ela estava me levando ao porão, local costumeiro onde eu contava histórias para as crianças do orfanato.
Ao chegarmos ao depósito, situado abaixo das escadas que levavam ao segundo andar, dela agachou-se e abriu a portinhola que levava ao porão. Uma fraca luz alaranjada vinda do cômodo se estendia pelo depósito. Lako foi o primeiro a descer, logo, eu e ele ajudamos Della a descer e em seguida fui eu, fechando a portinhola.
Sem ao menos dar tempo o suficiente para que meus olhos se adaptarem à negridão, a garota apanhou minha mão bruscamente e me conduziu a um quarto que pertencia a uma antiga serviçal.
Não sei exatamente se era quilo que eu esperava.
Cerca de sete crianças, quase todas que viviam no orfanato e de diversas idades, estavam sentadas ao chão, formando um semicírculo em torno de uma cadeira e uma vela. Todas elas notaram que eu havia comparecido àquela seita secreta e se alegraram. Era de se estremecer. Parecia devidamente um culto ou ritual que estavam prestes a fazer. Mas tudo certo. Eu já sabia do que se tratava tal "reunião", era formidável saber que eles estavam tão empenhados a ouvir histórias, mas eu esperava algo como um bolo e congratulações.
Reparei que Lako e Della foram se sentar junto aos demais. Lako havia se entusiasmado com a ideia, o que me fez ceder. Se não o fizesse, estaria sem meu companheiro. Retirei a cadeira na qual rodeavam e me sentei, à altura deles. Suspirei e tentei meu melhor sorriso.
- E então? O que desejam ouvir?
Glorin, um rapaz poucos anos mais novo que eu, levantou a mão. Admirei sua atitude e o deixar falar, assentindo.
- Bem, eu estava pensando... No último sábado contastes sobre a divisão de Asdin. Sobre Rui e Rij, os filhos de Drummer, enviados por Niylith diretamente da prisão dela para dividir Asdin pois estava tendo confrontos demais entre os homens e os seres mágicos, e isso estava corrompendo o reino mágico e etc. Mas, você nunca contou sobre a história da formação de Algriv em si. Por exemplo, antes de Algriv e os demais reinos, só existiam Thudgruk e Jörtron, mas agora temos...
- Seis reinos – Completei. Jörtron, Wankron, Norling, Statgard, , Algriv e Yerzin. E as ilhas Rismorgum, ao leste de Rui. É, de certo, uma longa história. Eu estava lendo sobre, esses dias, mas o assunto é... ahn... - Me aproximei das crianças, para dar ao local um ar de suspense. – Proibido pelo rei.
Eles começaram a murmurar entre si, surpresos pelo anunciado.
- Por que ele não quer que seu povo saiba sobre a história de seu próprio reino? – Perguntou Tom, do outro lado do minúsculo quarto.
- Porque aí, Tom, sabendo de nossa história e dos eventos que ocorreram, iriamos assim compreender que tudo que ele está fazendo é errado. É esta restrição que funciona como instrumento para que não surjam criticas a seu reinado, evitando uma revolução. Lembram-se do assassinato do rei Sulcor? É o que ele tenta evitar. E este é mais um caso da história se repetindo.
- Mas discutir sobre os deuses é restrito da mesma forma – Argumentou Agnes, sua voz tão enfraquecida. Mas te ouço discutir sobre e até cantarolar versos antigos. Eu, como todos aqui, ouvimos frequentemente tu dizer que sempre deveríamos ir atrás da compreensão e da razão. Mas agora está fazendo a si mesma uma contradição ao não nos permitir isso.
Um momento de silêncio se passou com todos aguardando de mim algo para contradizer Agnes. Porém ela estava certa, não poderia eu, privar tantos que aguardaram para conhecer mais do mundo, por simples má vontade.
Suspirei, aceitando minha derrota.
- Está bem, irei contar a história. Muitos anos atrás...
- Espere! – Gritou Della, interrompendo minha fala.
Ela pegou, de dentro de sua bolsa de couro, uma joia azulada, uma pedra e um recipiente de argila, entregando-as para mim.
- Você poderia fazer aquilo?
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Karen lê essa merda
Adventurekaren le isso aqui o capitulo não tá completo mas fodase