O meu quarto novo é o oposto do antigo. Em casa tenho, quer dizer, tinha, um quarto muito mais pequeno. Os móveis daqui combinam uns com os outros e, apesar do design antigo, são bastante espaçosos. Tenho uma cama enorme virada para uma janela alta que proporciona uma vista descomunal de um lago verde rico em flora e fauna.
Vantagens de estar na divisão 7, lembrar de apontar: ter os dormitórios numa das torres do palácio.
Ao longe consigo ver outras casas e carros em movimento. Só de pensar que passei de uma vida comum para uma vida mágica de um dia para o outro, o meu cérebro reage contorcendo-se contra os ossos do crânio.
Começo a desfazer as malas, apesar de não ter grande coisa. Não são permitidos objetos que façam ligação com quem fomos no passado. Vai ser estranho ter outro nome, quando toda a vida fui Jasmim.
Vantagens de estar na divisão 7, parte 2: o uniforme. Não ter de pensar diariamente no que vestir. É um alívio não ser uma saia e sim jardineiras.
Abro ainda mais as cortinas, deixando a pouca luz entrar. Nesta cidade está sempre nublado e tempo chuvoso. Pelo menos, foi o que me disseram assim que cheguei.
"-Espero que tenhas trazido roupa quente, faz aqui um frioooo."
Estou exausta depois de todos os testes que fiz esta manhã. Para entrar na academia é necessário realizar um conjunto de provas com o Diretor e existem vários fatores de escolha. Começam por te pedir que faças os testes mais simples, para descobrir se o teu poder é um dos mais comuns, sendo a raridade do poder um critério para entrar na academia.
Realizei provas relacionadas com a empatia, com o controlo da meteorologia, com o controlo dos 4 elementos, com a aptidão intuitiva, com a linguística, com todas as super coisas que podes ser capaz de fazer. Tens super-força, ou super-elasticidade? Parabéns, és comum no meio dos ativados.
Como não fui capaz de fazer nenhuma daquelas coisas, passei para o segundo critério. O meu poder já existe na escola? Pois, se já existe, tens de ir embora.
Último critério: o teu poder é completo? Existe alguém dos candidatos que possui o mesmo poder que tu, mas consiga fazer mais e melhor?
Fiquei eu, pelos vistos, tenho um poder raro. Não sei se é uma coisa a festejar; passar de ser diferente no meio dos não ativados, para ser diferente nos ativados.
O problema é que ainda não me habituei à ideia que tenho poderes, que é mesmo fulcral abandonar a minha vida anterior para treinar nesta academia e um dia trabalhar para o governo em missões ainda mais importantes. Tudo isto se assemelha àqueles sonhos amargos que temos: um sonho feliz em que acontece uma coisa boa que tu querias que acontecesse na realidade.
-Posso? – Uma rapariga entreabre a porta muito lentamente, talvez com receio da minha reacção.
-Claro.
A rapariga tem o cabelo cinzento e olhos muito pretos, quase sem vida. É magra e está a usar um uniforme igualzinho ao meu. Fica-lhe bem o violeta.
-Sou a dois. – Apresenta-se, estendendo a mão com as unhas pintadas de prateado. Tem uns dedos muito finos e com ossos salientes. De repente, tenho um arrepio, como se o meu corpo já se estivesse a preparar para fabricar mais calor, caso a mão dela fosse gelada como a antártida.
-Sou a Z. – Digo, desconfortável. A mão dela é gelada, mas suave. Sinto perto dela uma energia no ambiente sugadora e repelente. Como se as partículas envolventes estivessem a travar uma batalha umas contra as outras e a serem atiradas em todas as direções.
