— Hank, entrega esse dez conto pro moleque que foi buscar a massa. Aqui tem dois donos tá ligado? Ele trabalha pra um outro mano e eu sou o outro dono, essa área aqui é tudo nossa, da avenida até o campinho. — O traficante da rua diz e traga um cigarro. O outro ainda estava pesando as flores da planta ilegal do outro lado da rua. — Não que tenha treta, mas é melhor manter a contabilidade separada.
— Pode crê, seria ruim pra vocês se o Bozo legaliza-se a maconha? — Hank pergunta pro empreendedor de rua. — Pode pá, ia ter que aumentar a qualidade e a produção de cocaína e das droga dos boy, tipo doce e balinha. Ou quem sabe partir pra esse negócio da maconha com imposto, tá ligado? Esse é o futuro lemão. — O moleque termina de pesar a erva e volta atravessando a rua correndo devagar. Hank entrega os dez reais e parte a pé. Sob o sol de sábado conversa com seus demônios enquanto programa o futuro próximo.
Em casa escreve no computador de mesa que divide a sala com o piano de parede. Tenta se lembrar de uma frase de Kerouac na qual ele explica a origem da palavra Beatnik que, assim como Punk, era um termo pejorativo na língua inglesa. O nik no final era para ligá-los aos soviéticos. Era bem na época que o Sputnik foi à órbita da Terra pela primeira vez. O discurso dele diferencia os escritores de sua subcultura dos clássicos ao dizer que os beats trabalham, portanto tem uma visão mais realista e não tão imaginada sobre o cotidiano da vida urbana.
Escuta Idles enquanto estuda sobre Klong Toey. Só tem o fim de semana para se dedicar à atividades intelectuais. O trabalho na fábrica consome muitas horas e energia vital. "The best way to scare a torie is to read and get rich... " grita o vocalista da banda nos fones de ouvido de Hank. Ele concorda com a afirmação em partes. Realmente ler não é um hábito que a coroa inglesa ou o 1% mais rico da população brasileira incentivaram aos trabalhadores se olharmos a história desde que essas categorias existem. Mas Hank questiona o que é ficar rico. Sua compreensão sobre isso pode ser comparada à compreensão de um rato de laboratório para com a realidade além de seu labirinto asséptico.
A erva não é das piores e Hank se lembra que é hora do almoço. Felizmente tem um churrasco pra ir a tarde. Só se preocupa em quantas cervejas vai tomar, seu filho de quatro anos estará na festa. Tem de manter a sobriedade e o exemplo pro moleque. Sorri ao se lembrar de uma cena dos Simpsons na qual Nelson, numa das tantas vezes que lidera a gangue juvenil, aponta para Bart e diz ao garoto amarelo — Ha ha, o Bart tem um pai! — Aqui essa piada faz mais sentido e tem menos graça ainda do que em Springfield.