Conto Dois - Por que?

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O restaurante tinha música ao vivo, tocava All Star de Nando Reis. A brisa que vinha do mar, embora longe, era suave. Eu amava minha cidade. Amava meu Rio de Janeiro. Pensei que um restaurante ao ar livre e que me proporcionasse a vista da Baía de Guanabara seria perfeito. Tudo parecia perfeito, mas não estava. Ela não saia da minha mente. Aquela era apenas mais uma noite em que eu tentava esquecê-la, tentando encontrar alguém novo, outra  mulher que a superasse, porém, nenhuma se comparava a ela, qualquer outra mulher não significava nada perto dela. 

A garota era minha maldição, queríamos um ao outro, mas ninguém queria assumir primeiro. Já fazia minutos que eu não me pronunciava, eu queria gritar, estava cansado de enganar a mim mesmo, eu sempre era sincero com as garotas com quem eu saia, sempre falava dela. Todavia, naquela noite, eu cansei de procurar.

— Desculpe. — Disse, exausto, massageando as têmporas.

— Você está bem?

— Não. Quer dizer, sim, mas...

— Sou eu?

— Não, não... É que.. Você é ótima Jasmine, te acho incrível, conheço seu trabalho há anos, sempre lhe admirei como profissional, sempre falaram tão bem de você e lhe conhecendo melhor agora sei que tudo era verdade. Você é ótima. Você é ótima... Mas não é ela.  — A última frase saiu num tão baixíssimo, como se eu estivesse falando para mim mesmo, Jasmine não pôde ouvir. Ela sorriu, simpática, o que era incomum.

— Tudo bem. — Ela falou pegando sua bolsa e fazendo menção de sair. — Não queria algo sério, Hugo, imaginei que você também não. Só queria lhe conhecer melhor antes de qualquer coisa, eu sou assim, mesmo que seja algo informal, gosto de conhecer as pessoas. Notei seu interesse em fazer o mesmo, mas agora já não sei se nossos pensamentos são os mesmos. Mesmo que seja algo casual, também não quero alguém com a cabeça em outro lugar, em outra pessoa. Você é um cara legal, espero que pare de enganar a si mesmo e vá atrás da pessoa que você REALMENTE QUER. — Ela frisou as duas últimas palavras, como se pudesse ler minha mente, desejou-me boa noite e saiu.  Compreensiva, paciente, simpática, inteligente, divertida e muito bonita. O que tinha de errado comigo?

Tive uma péssima noite de sono. Os rostos das mulheres que tentei usar para esquecê-la passaram mil vezes pela minha mente, só para no final de tudo, o rosto dela prevalecer, seu sorriso era algo que eu nunca conseguia esquecer. As coisas melhoram um pouco quando ela foi transferida para um escritório em outro bairro, embora a possibilidade de nos encontrarmos ainda fosse gritante. Alguns dos  nossos amigos ainda eram os mesmos. Quando comecei a lembrar do nosso último encontro ficou mais difícil voltar a dormir. Ela disse "oi" como se tivesse acabado de me conhecer. Um soco no estômago doeria menos. Eu queria poder dizer a ela que ela é tudo que eu quero, contudo, meu orgulho prefere fazer com que eu finja que ainda não estou pronto. Quando finalmente consegui pegar no sono, meu alarme tocou. 

Pensei que trabalhar me faria esquecer tudo, eu estava errado. Reconheceria sua voz há quilômetros, fiquei a observando de longe, ela falava enquanto folheava alguns papéis ao lado do nosso chefe. 

— Oi, Hugo!

— Adelaine, que susto!

— Espiando?

— O que ela faz aqui?

— Foi promovida, parece que aparecerá mais vezes por aqui a partir de hoje. — Adelaine deu dois tapas leves no meu ombro, como consolo.

— Vocês deveriam conversar, vocês não conversam mais? — Disfarcei e dei uma desculpa para sair dali. Era isso que sempre fazíamos quando perguntavam sobre nós, tentávamos disfarçar.  Geralmente era: "Oh, como não estão mais juntos?". 

Fui para minha sala e me afundei nos textos de retrospectiva do fim de ano que eu teria que editar. Graças a Deus, há muito tempo eu não ficava responsável pelos textos românticos da revista. Quando eu ficava, inúmeros poemas saiam da minha cabeça, não mandava nenhum para o redator chefe, ficaria óbvio demais para todo mundo quem era a musa inspiração lá do fundo dos meus pensamentos de escritor. Ela era diferente, quase cara de pau. Ela continuava com seu blog onde postava as letras das suas músicas e de vez em quando um vídeo cantando e tocando violão. Eu nunca conseguia resistir a tentação de visitar o site. Quando a ouvia cantar, ficava difícil respirar. Não conseguia evitar pensar que toda canção era sobre mim. Esforcei-me ao máximo para focar no trabalho e entregar o texto pronto e revisado para o chefe ainda naquele dia. Meu prazo ainda estava longe, entretanto, queria evitar sair da sala e encontrá-la. Deve ter ficado explícito também, mas eu já não tinha controle da situação.

Mais uma noite mal dormida.  Tentei assistir uma série, porém, acabei no blog dela novamente, sua voz era como um feitiço. Horas se passaram e eu continuava ouvindo suas músicas e pensando em como era claro que as letras eram para mim. Minha ansiedade só aumentava. Por que tinha que ser assim? Por que? Por que tínhamos que passar por esse inferno? Por que não deixávamos o orgulho de lado? 

Após horas, naquela noite, cometi a maior ação impulsiva que eu poderia cometer. Peguei o telefone e disquei seu número, eu não ligava de ter que acordá-la, nem lembrei desse detalhe.

— Hugo? 

— Te acordei?

— Curiosamente, não. — Sua voz estava surpresa, na verdade eu também estava. Acho que nem eu mesmo acreditei que estava fazendo aquilo. Ficamos em silêncio por quase três minutos. Ela finalmente rompeu a mudez.

— Hugo? Por que me ligou? 

— Eu... eu... Eu não consigo dormir. Há muito tempo não consigo... São as mesmas perguntas que martelam minha cabeça e a mesma história.

— Por que não me conta a história, me diz as perguntas e talvez eu tenha as respostas? — Sua deixa me deu coragem para continuar;

— Eu conheço uma garota, ela é como uma maldição. Nós queremos um ao outro, mas nenhum dos dois quer assumir primeiro. Nas últimas vezes que eu a vi, nas festas do trabalho, não quis perguntar sobre isso, tinha medo dela tentar disfarçar. Tenho medo de que ela ache que isso tudo não significa nada. Eu sei que na verdade nós agimos como se realmente não significasse nada. Não sei porque não admito que ela é tudo que eu quero. Eu tenho que parar de fingir que não estou pronto para começar do zero. Não sei porque temos que passar por esse inferno. Por que? Por que não deixamos essa merda de orgulho de lado? Por que não tentamos de novo?

Silêncio. 

— Alô? diga alguma coisa e juro que nunca mais te incomodarei. 

Silêncio.

— Oi? — Perguntei novamente. Eu ouvia sua respiração forte. Ela parecia estar pensando. Chamei novamente:

— Oi?

— Hugo, eu posso ir ai?

Inspirado em Why do Shawn Mendes.

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⏰ Última atualização: Jan 30, 2020 ⏰

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