I

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Eu estive quieta por muito tempo, mesmo nas milhares de vezes em que você olhou para o céu e me implorou desesperadamente por uma resposta.

"Por que?"

Estive quieta mesmo quando você desejou não ser você. Quieta mesmo quando a dor foi tão sufocante que você pensou que se reduziria a pó ali mesmo. Quieta nos dias em que você desejou não existir, porque isso doía, doía e doía o tempo todo.

Estive quieta também nas várias noites em que você chorava sozinha. Nas vezes em que te bati aparentemente sem piedade e você desabou violentamente, nas vezes em que te tirei tudo te deixando sem nada, menina.

Apesar do meu silêncio, isso jamais significou que eu não estivesse lá por você.
Eu sei quantas gotas de lágrimas escorreram de seus olhos e atravessaram o seu rosto. Sei quantos soluços escaparam por entre seus lábios, eu sei de cada mísero detalhe, até como os seus olhos cintilam após arderem e se encherem de lágrimas.

Todas as vezes que te fiz pensar não ter nada, foi porque quero que sinta seu coração bater e que tenha orgulho de cada batida. Orgulho de senti-lo se movendo em seu peito. Quero que a cada lufada de ar que vai para seus pulmões, você as respire prezando para que aquele ar dure mais tempo, não que ele cesse rapidamente. Quero que sinta prazer em viver, sinta a felicidade de estar viva preenchendo cada átomo de química espalhados pelo seu corpo. Que sinta tudo à flor da pele e que viva todo segundo como se fosse o último.

E não, eu não te odeio. Pelo contrário, eu a amo. A amo como nunca amei nenhum destes seres vivos, e eu estive aqui desde sempre. A amo como sequer poderia, mas eu a amo. E como quem ama, eu preciso te ensinar.

Te ensinar a ser forte e, principalmente, a amar como eu. A amar o sol se chocando contra a sua pele, a amar a grama sob os seus pés, a amar como a sua mãe sorri e o seu pai te conta a mesma coisa várias vezes, porque a memória não está mais tão bem assim. A amar banhos quentes e a água fria da chuva. A amar músicas melódicas e profundas, a amar o silêncio e as flores.

Ensinar-te a me amar, menina. Porque eu sou desde as mais belas coisas até as mais irrisórias. Desde enormes cascatas até uma pequena poça após o temporal. E se você puder me amar em cada parte e defeito, então eu te amarei de volta como sempre desejei.

Como você sempre mereceu.

Me perdoe por nunca ter dito antes, por toda a quietude que te entreguei durante esses anos. Eu também sou cheia de defeitos e você nunca estará errada em duvidar de mim, porque não há nada nem ninguém neste universo mais imprevisível que eu.

Contudo, nunca duvide do que eu sinto, porque amar-te é tão certo quanto a própria morte aos humanos.

Algum dia você me entenderá, mas eu preciso que você viva. Intensamente e sem medo de errar ou sentir.

Porque é exatamente isso o que é viver.

Sentir.

Com amor, Vida.

Com amor, vidaOnde histórias criam vida. Descubra agora