"I don't eat
I don't sleep
I do nothing but think of you
You keep me under your spell"
Under your spell, Desire.
Gizelly estaria mentindo se dissesse que ouvir Marcela chama-lá de "amor" não a afetou de todas as formas que poderia ser afetada.
Amor, amor, amor, amor...
Apenas quatro letras, uma dissílaba dita num tom tão singelo e espontâneo, repetindo em sua cabeça como um mantra. Não deveria ser algo que a desequilibrasse tanto, afinal, apelidos carinhosos são comuns nas mais diversas esferas afetivas. Mas ela e Marcela? Saber em qual categoria se encaixam é uma incógnita que a segue como uma sombra. A ideia de compartilhar com a médica uma união sólida e romântica é o suficiente para o sangue subir e acumular-se na região das bochechas, avermelhando-as.
Gizelly sabe muito bem que na vida as coisas não são contidas no preto e no branco absolutos. Ela é advogada criminal, se alguém conhece moralidade cinza é ela. Até antes de entrar nesse programa, ela navegava nas duas áreas com confiança em diversos contextos, segura de sua lógica.
Mas agora? Tudo que ela consegue ver-se submergindo junto com a médica é uma substância viscosa preta-e-branca, uma daquelas misturas heterogêneas que estudou sobre nas aulas de química do ensino médio. Próximas, mas nunca unidas, separadas pela densidade e algo que Gizelly não consegue apontar conclusivamente. Marcela é o paradoxo insolúvel, escapando por entre seus dedos.
Seu raciocínio é interrompido ao colocar seus olhos em Marcela. Ela consegue sentir o rúbio de suas bochechas espalhando-se pelo resto de seu rosto. Seu cérebro realiza mil cálculos para processar a pele exposta, os dedos longos cobertos por um tecido fino e com singelos detalhes, feito um véu. Sob sua observação não escapa a perplexão no rosto de Marcela se dissolvendo numa expressão tranquila e relaxada junto a um sorriso libertino. Aquece o coração dela saber que ela é tem a honra de causar esse efeito na moça.
"Vai querer comer macarrão? Vou fazer um bacon pra gente pessoal vai comer um beiquinho lá você come com bacon?" sua sentença saiu um tanto rápida e embaralhada, mas congratulou-se por conseguir expressar-se sem gaguejar ou dizer muito pausadamente.
Marcela não lhe responde, apenas vira-se em sua direção, oferecendo uma visão frontal de seu corpo e descobre seus dedos, a peça que segurava é lentamente revelada, como o mais profundo segredo. A performance é perfeitamente arquitetada, feita especialmente para que que Gizelly desestabilize-se sob sua presença. Os pulmões da advogada esforçam-se para soltar uma transpiração falha, revelando a vitória da médica. Defensivamente, Gizelly desvia o olhar para a peça de roupa.
"Linda essa lingerie".
Gizelly mataria para saber como lidar com essa situação, a pressão em seu peito e em sua garganta. Sente-se como uma viciada, seus olhos estão drogados e sempre voltam para Marcela. Marcela, tão perfeita que chega a doer. Marcela, trazendo à tona aquela onda de emoções não-moderadas e perguntas reprimidas. Marcela, ressuscitando a Gizelly irracional e à mercê de seus sentimentos, o oposto da persona equilibrada e judiciosa que a advogada demorou anos para desenvolver. Marcela, imprevisível e soberana, adicionando cada vez mais compostos e dúvidas à essa mistura cada vez mais instável. Marcela. Marcela.
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Entalpia
RomanceDessa vez, Gizelly não foge quando Marcela aproxima-se dela no quarto do céu.