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| Sáfira |

Pego minha bolsa de cima da mesa e coloco meu celular dentro, me olho novamente no espelho observando bem se estava legal.

Hoje tava tendo um pagodinho maneiro na pracinha da Rocinha, eu que não perco esse frevo né amor!?

Mando mensagem para kakau falando que já estava colando lá, saio e fecho a porta, coloco a chave na bolsa e começo a descer.

Cresci na Rocinha, criada e educada aqui. Uma trabalhadora como todos daqui, sempre no meu corre pra crescer, família humilde, caçula da casa tendo só uma irmã mais velha que mora fora.

Assim que minha mãe morreu meu pai deixou tudo pra trás, ficando só eu e minha irmã que na época era apenas uma menina assim como eu, sozinha. Começamos foi cedo, eu vendendo sacolé na praia, fazendo bolo de madrugada pra botar coisa em casa, a luta de todo brasileiro no dia á dia.

Sempre fui bixa solta, pra mim é sempre dente por dente e boca por boca, foi assim que  aprendi me defender, gosto de dizer que tenho sangue forte, que isso que me faz mais mulher.

Giovana foi embora do Morro pra estudar, quis me levar por causa das minhas confusões aqui mas acabei ficando.

Já passei por mal bocado, aprendi na raça o certo! já fui amante, sofri pra um caralho na mão de bandido meia boca.

Eu novinha, na boca dos 13 e 14 anos, conhecendo tudo, não sabia de nada ainda, me faziam de gato e sapato, era surra de fiel, paulada de macho e humilhação.
Até que tomei um pouco de vergonha e conquistei minha dignidade de novo.

Mas sei que tudo isso foi só pra me torna a mulher que hoje eu sou, experiente e forte pra tudo que se pode imaginar.

Hoje em dia eu bato no peito, deixei de ter medo, tenho sorte de ter me saído em tempo dessa minha fase, agora sou pipa voada que segue o rumo do próprio vento.
Vivo do meu suor, apesar de ainda ter meus lances sei bem o certo, passo longe do rumo de antes.

Chego na pracinha e o movimento já era grande, olho meu relógio de pulso, 20:30 ainda, gostosinho de curtir.

Avisto Kakau dançando ao lado de uma mesa com uma latinha na mão, ela me ver e me chama com a mão.

Passo por uma galera e recebo alguns olhares, uns de cobiçacam e outros de enveja. Vários vaporzinhos e bandindinhos jogando piadinhas, outras fiéis olhando torto e cochicando, me empino mais e passo sem olhar.

Não vou dizer que sou Santa nem nada, mas tô fora de envolvimento com esses caras. Canso de ver essas mulheres se matando aqui em praça pública por conta desses  que não valem o cuspir.
Claro que tenho meus lances, mas não passa de diversão.

Kakau_ Chegou a Boa!_ fala animada e levanta a latinha.

Sáfira_ Pelo visto já tá bêbada né!?

Kakau_ Que isso?_ faz cara de paisagem e do risada_ Pega ai!

Me entrega uma latinha, coloco minha bolsa sobre mesa que tinha alguns conhecidos e  bebo um pouco, observo o lugar com calma.

Tinha até uns carinhas bonitos, estilo playboy do asfalto que vem curtir no Morro.

Começo a dança e beber junto com kakau, a praça só enchia, era carro subindo e descendo e gente parando.
Depois de um tempo o samba parou e começou o som no paredão, sentei e peguei outra bebida.

Sáfira |M O R R O|Onde histórias criam vida. Descubra agora