oitavo andar.

se meu amor não chegar

dois copos vazios sobre a mesa. nada além de dois copos vazios sobre a mesa. uma cadeira sem corpo na minha frente e um gosto amargo na garganta. amargo de cerveja velha. amargo de amargura.

amargura que você causou. mas não posso lhe culpar já que ainda estou na incerteza. incerteza se você vem.

para o bem dos outros bêbados, espero que me amor chegue logo. chegue em breve. espero que meu amor se apresse. que alcance o trem. que desça do táxi e que venha a pé. que corra depressa, mas que não me deixe aqui. que não me deixe só.

talvez a violência torne-se necessária se meu amor não chegar. talvez eu quebre a mesa. aviso-lhes que não pagarei pelo estrago que eu venha a causar. talvez meu amor não venha e talvez eu quebre essa mesa se meu amor não chegar.

agora são três copos vazios sobre a mesa. um copo repousado, a espera do meu amor, e meus dois copos. esvaziei eu. eu solitariamente os esvaziei. esvaziei só. bebi o que meu amor e eu beberíamos se estivéssemos juntos. na incerteza se meu amor vem, bebi pelo meu amor.

por onde será que anda? anda só, como eu? anda murmurando? anda triste? chuta o meio-fio pela frustração? será que meu amor sente tanto o vazio que vem quando nos separamos quanto eu?

meu peito aperta em saudade e, sadaudeando meu amor, ainda hei de saudadear algo mais, como essa sensação de se embebedar desesperadamente, sem perspectiva de quando vou estar estufando-me de bebedeira.

não há sorriso tão horrendo quanto o de quem não sorri por dentro ao mesmo tempo que sorri por fora. e acho que quando não sabe-se nem para que direção roda o chão, sorrisos de desespero. sorrimos de forma quase irônica.

talvez se confundiu. talvez meu amor errou o lugar. talvez suma esse vazio se encontrar meu amor em outro bar.

e sem querer levo uma vida boêmia, procurando meu amor entre botecos e ruas vazias durante madrugadas melancólicas com choro e ranger de dentes.

talvez não encontre mais meu amor.

e talvez eu quebre essa mesa se meu amor eu não encontrar.