I - Breaking the routine

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Rotina.

substantivo feminino

1. 1.

caminho utilizado normalmente; itinerário habitual; rotineira.

"vai sempre à cidade pela r. antiga"

2. 2.

fig. hábito de fazer algo sempre do mesmo modo, mecanicamente; rotineira.

"não suportava que hóspedes lhe quebrassem a r."

Eu estava exausto de todo dia fazer a mesma coisa. Como dizia o próprio dicionário, eu havia chegado ao estado de fazer tudo mecanicamente, e não conseguia me sentir mais do que um pontinho simples no meio da multidão. Desde pequeno eu queria fazer algo grande, diferente, torcia para que estivesse destinado a um futuro grandioso, fazendo arte. Mas não. Minha infância passara e eu era só mais um adulto frustrado com a vida, seguindo uma carreira infeliz e insatisfeita.

Minha mãe adorava dizer que eu devia reclamar menos e agradecer mais, pois eu tinha um emprego, salario no fim do mês, um teto e comida; não tinha nenhuma doença pelo corpo e nem no meu psicológico, ainda era jovem e ‘’bonito’’, por isso deveria aproveitar os anos que viriam.

Mas eu não queria mais aquilo. Acordava todo dia cedo, pedindo a deus que derrubasse um raio na minha cabeça, para que não precisasse levantar do conforto da minha cama para ir a um lugar em que eu odiava. Logo depois tolerava um metrô lotado, sentindo o estomago roncar de fome e, quando chegava em meu destino cogitava iniciar um incêndio em um dos banheiros, só para poder sair cedo. Trabalhar naquele escritório me sufocava, escutar aquela falação de pessoas, o barulho alto do ar condicionado velho junto com a sinfonia de dedos tocando o teclado era aterrador. Sobretudo o toque dos telefones em meus ouvidos o dia todo. Eu podia ouvi-los mesmo no silêncio de casa, pois aquele som parecia se gravar em meu cérebro. Quando chegava o horário do almoço me encaminhava para o restaurante em frente, só para me sentar sozinho em algum canto e engolir rapidamente a mesma comida sem gosto de sempre, aproveitando o resto do tempo mexendo em minhas redes sociais, enquanto via as outras pessoas socializando.

E ai minha tarde se encerrava monotonamente, fazendo as mesmas planilhas de sempre, preenchendo os mesmo documentos de sempre, atendendo as mesmas ligações de sempre e bufando irritado como sempre. Então, finalmente me via livre, caminhava até a estação sentindo o frescor da rua bater em meu rosto e minhas músicas favoritas tocarem aleatoriamente nos fones de ouvido.

Eu gostava dessa parte do dia. Gostava da sensação de liberdade, de ver as pessoas para lá e para cá, do movimento constante dos carros. Era reconfortante, pois eu fazia parte de alguma coisa: era mais uma pessoa que seguia pela maré de gente, saindo cansado do trabalho, louco por um banho e uma janta quentinha; desejoso de uma boa noite de sono, para poder aguentar o próximo dia, aguardando ansiosamente o fim de semana.

Quando finalmente chegava em casa me dava conta de mais um dia havia se passado. Quando eu me jogava em meu sofá velho e confortável, parando para pensar sobre os acontecimentos do dia eu não sabia se ficava preocupado ou feliz. Por um lado, eu tinha conseguido suportar mais um dia, por outro, era um dia a menos até minha morte, em que eu desperdiçava fazendo uma coisa que odiava. E nesse ponto do raciocínio eu começava a chorar.

Chorava pela angústia de não poder seguir meu sonho, pelo menos não naquele momento, chorava de saudade dos meus pais, chorava pela falta que minha infância fazia, chorava por me sentir vazio e inútil, chorava por não ter amigos e por não saber qual a última vez que havia sorrido de verdade sem ser forçado. Eu olhava da minha janela as pessoas transitando na rua e sentia inveja. Então chorava. Me sentia ingrato, não sabia das dificuldades dos outros, mas ainda sim queria para mim a vida que eles tinham, pois eles pareciam viver. Eu estava sobrevivendo a tempos.

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⏰ Última atualização: Mar 25, 2020 ⏰

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