Capítulo 1

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Capítulo 1

- Clara para de ser chata, vamos participar. Nós duas adoramos dançar e o concurso de dança é uma oportunidade única. As inscrições vão terminar amanhã!
Caminho em direção à sala de aula com Laura atrás de mim pegando no meu pé para participar de um maldito concurso de dança. Ela sabe que eu sou tímida e que não consigo participar desse tipo de apresentação, ainda mais para um público grande e com pessoas que eu nem conheço.
- Laura eu já disse, eu não vou participar. Eu não tenho coragem, sou muito tímida e você sabe disso. - Entro na sala e sento na minha carteira. Laura senta logo em seguida na carteira ao meu lado juntando a dela com a minha.
- Por favor Clara, esse mês é o meu aniversário e...
- Nem pense em me chantagear. - Digo cruzando os braços mas ela continua.
- ...você sabe que eu não vou fazer uma festa porque eu não gosto, então como meu presente de aniversário você poderia se inscrever no concurso. - Fala fazendo cara de pidona.
Ai que droga!
Ela sabe que eu tenho o coração de manteiga. Por mais dura que eu possa ser às vezes no fundo eu faria qualquer coisa por ela e pelos que amo. E o pior é que ela sabe disso.
- Ai, não sei Laura. E se eu fizer alguma coisa errada, se eu tropeçar, pisar em falso ou torcer o pé, ou pior e se eu cair do palco! - Me viro em sua direção com os olhos arregalados e toda paranóica.
E isso é um defeito meu, a paranóia. Eu sou paranóica com qualquer coisa, uma dor de cabeça me faz pensar se não é um tumor. Pois é meus caros, eu sou bem doida, mas o que importa é que meus amigos me amam.
- Relaxa, não começa a surtar. Ainda faltam dois meses para o dia do concurso e nós estamos na segunda semana de aula. Temos bastante tempo para ensaiar. E caso você erre algum passo, - arregalou os olhos e ela pega na minha mão - o que não vai acontecer, você improvisa. Você é ótima em improvisar. - Diz encostando na cadeira e cruzando os braços toda confiante.
Uma coisa que eu admiro na cacheada ao meu lado é sua autoconfiança. Isso é uma coisa que eu desejo muito ter.
Depois de muito ponderar eu decido aceitar a proposta de Laura.
- Espero não me arrepender dessa decisão.
Ela dá um gritinho e me abraça me fazendo revirar os olhos.
- Eu sabia que você iria aceitar, essa é a nossa chance de mostrar o nosso talento. - Me solta e agarra meu rosto dando um beijo na minha testa. - Vamos rebolar a nossa raba naquele palco e esbanjar o nosso brilho.
Dou risada jogando a cabeça pra trás até que do nada alguém tapa meus olhos.
- Enrico? - Pergunto mesmo já tendo certeza que é ele.
- Acertou miserável. - Diz tirando as mãos dos meus olhos e sorrindo, me fazendo sorrir também.
- É claro que eu acertei, você é meu irmão gêmeo te conheço mais do que você mesmo se conhece. - Falo e ele revira os olhos sentando na mesa de Laura e entrelaçando os dedos nos dela.
Na verdade nós não somos irmãos de sangue, meus pais me adotaram recém nascida aqui no Brasil e um mês depois de eu ter nascido fomos para Itália, terra natal de meu pai Matteo. Dez dias após termos chegado, meus pais estavam fazendo um tour e voltando para casa escutaram o choro do meu irmão e o encontraram perto de umas lixeiras apenas coberto com uma manta. Logo se encantaram por ele e o adotaram. Por coincidência temos muitas características parecidas e até iguais e nos damos muito bem, por isso nos consideramos gêmeos. Claro a diferença mínima de idade também é um fator que nós consideramos.
- Oi amor. - Meu irmão diz se inclinando sobre Laura e dando um selinho em seus lábios.
- Oi. - Ela responde sorrindo toda boba me fazendo sorrir também. Eu adoro esse casal, até porque fui eu que ajudei esses dois a ficarem juntos. Se não sou eu na vida desses dois o que seria do relacionamento deles?
Quando olho para a porta vejo Theo, Gael, Calebe e Maitê entrando juntos e começamos a nos cumprimentar.
- Oi ridículos. - Falo para os três que sorriam. O jeito que nós nos cumprimentamos é diferente. Nossa intimidade é quase sem limites.
- E aí casal e vela! - Theo exclama me zuando sentando no meu colo em seguida.
De todos do conseguíamos nosso grupo - tirando meu irmão - Theo foi o que eu mais criei afinidade, ele é o meu melhor amigo e nós não escondemos nada, vivemos de mãos dadas e somos muito carinhosos um com o outro. Já chegaram a nos perguntar se éramos namorados e nós só conseguíamos negar e rir.
- Ela tá mais para tocha olímpica. - Calebe se pronuncia.
- Nossa hoje vocês acordaram piadistas né. - Falo revirando os olhos mas me divertindo também.
Somos interrompidos do nosso momento tentando descobrir que tipo de utensílio de fogo eu sou pelo professor de sociologia, Júlio, que entra na sala junto com um garoto - que não me é estranho mas é muito gato.
- Pessoal sentem em seus lugares, por favor! - Fala alto por conta da falação das pessoas na sala. O que não adianta muito. Então ele colocar dois dedos na boca e assovia, assim então chamando a atenção de todos. - Vamos lá pessoal, todos em seus lugares!
Todos finalmente sentam em seus respectivos lugares e Prof. Júlio volta a falar.
- Gente, esse é o Lorenzo. Ele é o aluno novo e ele irá se apresentar. - Ele olha para Lorenzo - Você poderia se apresentar?
- Claro. - Diz o garoto olhando pro professor e logo em seguida para a classe. Eu ainda acho que o conheço de algum lugar. - Bom dia pessoal, meu nome é Lorenzo e eu sou da Itália mas vim para o Brasil porque meus pais foram solicitados pelo trabalho para virem pra cá. Então foi assim que eu vim parar aqui. - Fala sorrindo espontaneamente. E devo admitir que é um belo sorriso. Será que usou aparelho? Mas por que estou pensando nisso?
Enrico - que está sentado atrás de mim - me cutuca me fazendo virar.
- É impressão minha ou a gente conhece esse garoto? - Ele pergunta olhando para o garoto com uma sobrancelha levantada.
- Eu tenho a mesma impressão.
- Pode sentar em alguma carteira Lorenzo, obrigado pela apresentação. - Prof. Júlio fala dando um tapinha nas costas de Lorenzo.
Lorenzo caminha até uma carteira ao lado de Enrico, colocando a mochila sobre a mesa e pegando o material.
- A gente se conhece? - Meu irmão pergunta sem nem esperar o garoto sentar direito. Paciência não é uma virtude do meu "quase" gêmeo.
- Enrico! - Dou um tapa no braço do meu irmão. - Desculpe a indelicadeza do meu irmão. Eu sou a Clara e esse é o meu irmão, Enrico. - Digo estendendo a mão.
- Tudo bem. - Ele aperta a minha mão, me cumprimentando de volta. - Eu sou... Bom, na verdade você já sabe meu nome. - Ele aperta a mão do meu irmão também.
- Bom, tenho que concordar com meu irmão, você nos parece familiar. Nos conhecemos?
- Não sei, mas vocês também me parecem familiares. - Lorenzo diz arqueando uma sobrancelha e colocando a mão no queixo pensativo.
- Pode ser que vocês tenham se conhecido na Itália. - Gael fala se aproximando e estendendo a mão. - Eu sou Gael.
- Prazer Gael. - Lorenzo retribui o cumprimento. - Vocês são italianos? - Diz dando um sorrisinho de canto.
- Bom, eu não mas Enrico sim.
- E de onde exatamente vocês eram? - Pergunta nos observando.
- Nós éramos de Vomero*. - Digo dando de ombros.
- Eu também... espera, vocês são Clara e Enrico De Lucca? - Lorenzo aponta para nós franzindo o cenho.
- Somos, como você sabe? - Enrico pergunta surpreso.
- A gente se conhece, eu sou Lorenzo Costantini. - Ele sorri de orelha a orelha.
- Enzo? - Arregalou os olhos percebendo o porque me senti atraída por ele e sinto o meu rosto corar.
Nós estudamos juntos do 1° ao 5° ano do ensino fundamental e eu tinha um crush nele, só que ele acabou viajando para a Alemanha porque seu pai também é modelo, - nossos pais se conheceram no ensino médio e desde então ficaram inseparáveis - e desde então nem pensava mais nele. Nunca imaginei que o reencontraria mais bonito do que nunca. Ele ficou bem mais alto e até criou barba.
- Clara!
Dou um pulo na cadeira quando o professor grita meu nome chamando minha atenção e interrompendo meus pensamentos.
- Eu te fiz uma pergunta. - Ele diz com cara de poucos amigos.
- E qual seria? - Digo me virando totalmente para frente e olhando pro professor.
- Você poderia me dizer o que significa M.S.T? - Prof. Júlio pergunta arqueando uma sobrancelha e cruzando os braços.
- Hã, eu não...
- É o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra. - Lorenzo responde à pergunta de Júlio, me interrompendo.
O professor vai até a mesa dele e dá um sorrisinho irônico.
- Obrigado Clara por responder à minha pergunta.
- Estou ao seu dispor. - Lorenzo responde arqueando a sobrancelha e sorrindo assim como Júlio.
- Já que você é tão espertinho você poderia me dizer em que consiste esse movimento? - Pergunta se inclinando na direção de Lorenzo.
- Ele consiste em um movimento de ativismo político e social brasileiro e teve sua origem em 1970. - Lorenzo responde também se inclinando em sua direção e eu o olho impressionada.
Os dois permanecem se encarando e a classe os olha em silêncio e expectativa.
- Muito bem espertinho, mas da próxima vez não se meta. - Prof. Júlio diz olhando sorridente para Lorenzo e volta para sua mesa.
- Ok professor, você que manda. - Lorenzo responde me fazendo rir.
- Garoto tu é um gênio. - Digo rindo surpresa.
- Tu não viu nada gata. - Recosta na cadeira todo cheio de si e sorri quando percebe que fico corada.
Ai que merda.
Por que eu fico assim? Odeio ser tão tímida.
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Estou caminhando de volta pra casa sozinha, - meu irmão foi pra casa de Laura e o restante pega ônibus no ponto da escola - quando percebo que tem alguém atrás de mim e eu como uma garota corajosa faço o que meus instintos - e meus pais - me pedem: ignoro e corro sem olhar para trás. Contudo sinto alguém agarrar meu braço e dou um grito.
- Clara, sou eu!
Vejo que na verdade quem estava atrás de mim era Lorenzo e fico mais aliviada e irritada.
- Ai garoto, tu tem demência é? Por que não fala, você não pode sair assustando as pessoas assim, nós não estamos na Itália! - Fico levemente exaltada - só que não - e coloco as mãos na cintura.
- Me desculpa, não era minha intenção, fique calma. - Ele fala rindo e levanta as mãos como se rendendo.
- Não ri não hein, não tem graça palhaço. - Dou um tapa no braço dele.
- É que eu vi você sozinha e decidi te fazer companhia até a sua casa já que você estava indo em direção de onde eu moro. - Se explica passando o braço pelos meus ombros percebendo que ele é bem mais alto que eu.
Na verdade qualquer coisa é mais alta que eu - tirando a Maitê.
- Ah, então vamos. Mas nunca mais faça isso. - Falo olhando séria para ele.
- Ok, já entendi. - Diz revirando os olhos.

Depois de uns 10 minutos chegamos à minha casa e escuto Lorenzo dar uma risada. E que bela risada meu pai. Por que eu pensei isso?
- Que foi? - Pergunto virando em sua direção com o cenho franzido.
- É que eu moro a três casas de distância da sua. - Ele sorri e passa a mão no cabelo escuro.
Que visão!
- Tá brincando? - Falo rindo também.
- Não. É bom saber, assim eu posso te encher o saco quando eu quiser.
- Isso se eu não te encher antes. - Falo dando um sorriso brincalhão.
Além de estudarmos na mesma escola, moramos no mesmo condomínio. Ele vai atormentar a minha vida - e os meus pensamentos - por um bom tempo. Deus, tenha piedade da sua filha.

*É um bairro situado em Nápoles.

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E aí meus leitores e leitoras queridos, me digam o que acharam nos comentários e não esqueçam de falar se estão tão ansiosos quanto eu para saber o desenrolar dessa história.
Planejo postar toda quarta e sábado. E se quiserem eu coloco fotos aqui de como eu imagino os personagens. Me sigam no Spirit, meu user é @Sabrina_Vilela. Salvem a história na biblioteca de vocês.

Até a próxima.

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