HENRICO

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2 de agosto de 2018
Positano, Itália

E mais uma dia de verão começa, acordo logo com este calor abrasador que me entra pelas cortinas do quarto.
Honestamente, sou um pouco preguiçoso. Mas, só durante a manhã.
Antes de me levantar fico imenso tempo a apreciar as diferentes formas que consigo fazer com as mãos e a maneira como elas se refletem na sombra da parede do quarto pois fico sempre com imensos raios de luz nas mãos.

Vou-me levantar e vou à cozinha buscar um croissant e um sumo de laranja. Confesso, sou um bocadinho mimado neste aspeto pois todas as manhãs a minha mãe deixa-me sempre o sumo já pronto com as laranjas colhidas do nosso quintal que são bem doces.

Em toda a minha vida sempre fui só eu e a minha mãe, o meu pai abandonou-a quando ainda estava grávida. Se me custa não conhecer o meu pai? De todo. A minha mãe faz muito bem o papel de ambos e se um homem é capaz de abandonar a sua esposa que ainda por cima carrega um ser que também lhe pertence, obrigado mas não me identifico.

Nem sempre consigo ser muito bom a expressar aquilo que sinto então, tento demonstrá-lo através da arte.
Sim, a arte, há tanto para falar da arte. É como se fosse um universo distinto onde só entram aqueles que têm a genuinidade e a essência, que conseguem avaliar várias perspetivas, que vibram com as cordas de um instrumento musical, que sonham poesia, que pintam realidade. Ok, vou parar de me armar em homem sábio e profundo mas a realidade é que sem a pintura, não sei o que seria de mim.

Nunca disse a ninguém amo-te, nem mesmo à minha mãe. No entanto, dou-lhe imensos quadros iguais com rosas que pinto mas, não desenho espinhos mas sim ervilhas. Sim, eu sei parece um pouco aleatório e estranho mas, a minha mãe faz umas ervilhas com ovos ótimas e então associo-as sempre a ela.

Não me identifico com muitas pessoas da minha idade, quer dizer, quase nenhumas. Sinto que estão todas formatadas para o mesmo e ao longo do tempo fui percebendo que posso falar com cinco pessoas diferentes e todas têm o mesmo pensamento. Não me toca a essência das pessoas pois não consigo perceber onde está o seu verdadeiro eu. E assim, nem me esforço para criar laços.

Aqueles a quem chamo amigos são o Ricardi e a Chiara. Apesar de gozarem comigo por ouvir Vivaldi e falar por cartas, sei que são eles próprios. Infelizmente, há uma coisa que me deixa um pouco desconfortável, em diversas ocasiões, eles namoram. Atenção, eu gosto da relação deles, parece saudável. Não é que eu tenha tido alguma relação mas, pelo que vejo parecem-me bastante estáveis.

Isto do amor tem muito que se lhe diga e é bastante estranho também. Pois, ou das duas uma, ou são dois lobos da mesma alcateia que se unem num laço ou então são do género de gato, só pensam neles e não sabem viver a dois.
Não sinto que goste desse tipo de amor, nunca o senti também. Quer dizer, eu sinto imenso fascínio pelo sexo feminino mas não me sinto preparado parar criar um laço tão forte com alguém.

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