Uma semana antes.
O ar era gelado, estávamos poucos centímetros de uma queda alta. Os carros pareciam com formigas perambulando, os postes luzes de natal e os prédios se erguiam como se nascessem do chão e tocassem o céu. Ele ria a risada dele era única, estava com uma jaqueta de couro, uma calça jeans clara e uma camisa do Nirvana e por alguns instantes foi como se eu não estivesse ali, me senti seguro. E ao lado dele Malu, a menina de cabelos curtos que depois das férias pintou as pontas de rosa e simplesmente explodiu. Todos nós estamos a ponto de explodir, alguns apenas conseguem se controlar por mais tempo.
Conheço esses dois a muito tempo, dês de criança. Maria Luiza era minha vizinha, lembro-me do dia em que os caminhões de mudança pararam em frente da casa, depois ela saiu de uma vã com caixa de papelão nas mãos, um boné para trás e tênis all star. Mesmo ela dizendo que não lembra eu tenho certeza que ela me viu olhando da janela, provavelmente esqueceu-se disso no mesmo minuto já que antes de irmos para a escola ela era apenas "minha vizinha" e eu era apenas "o vizinho dela". Então, primeiro ano. Foi horrível, nunca tinha ido para a escola. Eu não fui uma daquelas crianças que chorou o dia inteiro e que a mãe teve que me buscar. Eu sempre fui calado, o garoto que quando diz algo todos parecem surpresos porque, olha só! Descobrimos que ele não é mudo!
Então eu conheci Luan, ele sempre foi diferente de mim, era o garoto que sempre estava na diretoria e que todos conheciam o nome. Até hoje eu não consigo entender o porquê ele se importou em falar comigo. Ele pediu um lápis emprestado, desenhou uma caricatura infantil da professora e ela descobriu. Ele levou um bilhete para casa que provavelmente a mãe dele nunca assinou. Eu sinceramente não sei se esse foi um bom inicio de amizade.
Alguns dias depois eu falei com a Malu. Foi quando me empurraram no intervalo, fiquei segurando o choro até chegar ao final do corredor e sentar no chão — atrás de alguns armários. — e então Malu estava lá. Um tênis rosa com luzinhas, chiquinhas no cabelo e um sorriso gentil.
Ela: "posso sentar aqui?".
Eu: "Ah... pode".
Ela: "Quer dividir um sanduiche?".
Eu: "Humm. Pode ser.".
Não demorou muito para viramos melhores amigos. Daqueles que vão fantasiados de personagens de filme de terror no halloween. O grupo desajustado... Às vezes penso que nossas diferenças se encaixam também, eu me sinto outro alguém quando estou com eles.
— Porra! — o grito ecoa por toda a cidade, navega por cada avenida e quadra.
Eu vejo em câmera lenta Luan cair.
Sua jaqueta farfalha, seus olhos brilhosos parecem seguros de si, meu coração bateu forte naqueles estantes.
Ele cai para trás e cai no piso gelado gargalhando.
— Cara você quer me matar do coração?! — digo me concentrando no equilíbrio. Estava com os braços abertos iguais a um equilibrista.
Ele tenta se recuperar da crise de risos, depois que para de rir deita no chão e olha para o céu.
— Porra... — repete quase que sussurrando.
Malu olha para mim rindo como uma explosão de sentimentos. Caminha até mim sobre os tênis brancos, ela parece com uma bailarina; é delicada sem medir esforços e aterrissa perfeitamente até minha frente, coloca as mãos nos meus ombros e diz baixo, só para mim.
— Você está tenso...
— E obvio.
— Então não fique... Pessoas tensas têm mais probabilidades de morrerem situações de risco.
Ela da uma risada que até tentou controlar, mas perdeu a postura.
— É assim que você quer que eu me acalme? — pergunto e noto meus pulsos; o sangue está bombeando forte, é o mesmo sentimento de quando estávamos na apresentação do The Weeknd no Lollapaloza.
Ela também pula do parapeito e deita ao lado de Luan. Os dois ficam ali, dois corpos gelados. Rindo e contando as estrelas. "Vamos?". Eu tomo impulso, caio de pé e depois deito também, rolo minha cabeça e vejo Malu e seu sorriso leve.
— Nós devemos ser os piores estudantes da Monte Cristo, — nosso colégio — e vocês são as melhores pessoas que eu já conheci.
Eu concordo.
Ela aponta para a única constelação que conhecia...
Estávamos no ultimo andar do Palace Gold, não era o maior da cidade inteira, mas era alto, tão alto que conseguíamos ver todos os trajetos que traçávamos de bicicleta quando éramos criança. Três crianças da mesma idade enfrentando todo tipo de valentão e indo tomar sorvete na sorveteria do Senhor Campus. Eu tenho saudade disso, e sei que vou ter depois que as aulas acabarem.
— Consegui se decidir Jão? — pergunta Malu. Ela gosta de me chamar assim, e eu prefiro a que João Vitor Romaria, que geralmente ela usa quando está furiosa comigo.
— Eu ainda tenho tempo.
— Você... Sempre confuso...
— É o futuro. É pra ser confuso.
Ela da de ombros com um sorriso pequeno.
— Bem. Eu vou dar o fora dessa cidadezinha idiota.
— Vocês acham isso tudo idiota? — pergunta ela vidrada no céu.
— Malu, — Luan se vira de bruços. — Você é a típica garota que prefere morar na cidade que nasceu, e que quer viver a vida inteira com um gato... — ele pigarreia com sarcasmo — "e eu não estou falando de seu marido" — Maria ri e empurra-o. — Você tem a vida inteira programada, e vai ser feliz com isso. Já eu não.
Só então eu percebo que ele está fumando.
— De onde surgiu esse cigarro?
Ele revira os olhos.
— Em momentos especiais podemos quebrar um pouco as regras. Essa é uma data especial.
Eu me afogo na nuvem de fumaça. Sento e olho fitos para ele. Quase não consigo brigar com os olhos castanhos escuros.
— Você me prometeu.
Ele preme os lábios e parece refletir. Então pressiona o cigarro esmagando a ponta no piso e apagando-o, apenas um rastro de fumaça fica.
Ele me encara como se dissesse; "está satisfeito?" e até consegue me fazer sentir culpado.
O celular de Malu toca. Ela atende e sussurra algo. Consigo ouvir; "sim, eles estão comigo", "sério, aonde?", "não temos bebida", e depois ela desliga com um "beijo amiga".
— Ok... Precisamos ir! — ela ordena pegando algumas coisas que deixamos no chão.
— Ir aonde? — ele pergunta.
— Para a casa da Ema.
— Por quê? — eu pergunto.
— Estão comemorando o fim das provas, uma festa... Vamos príncipes... — ela da um umas batidinhas no ombro de Luan e somos obrigados a acompanha-la.
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Fraco, frágil e estúpido
Fanfiction"É que eu sou fraco, frágil, estúpido pra falar de amor Mas se for com você eu vou", livro baseado na musica "Imaturo".