A alegoria da pós-morte

0. Bem-vindo ao plano espiritual(Piloto)

Bom, é difícil dizer como vim parar aqui, mas, entenda uma coisa: Eu morri. E eu morri acordando no nosso mundo, mais precisamente aqui em Porto Alegre. Tudo estava mais diferente, um lugar onde ninguém conseguia me ver, eu tentava conversar com as pessoas, mas nada adiantava, até perceber que as pessoas atravessavam meu corpo. Ok, eu entendi na hora que... eu era um fantasma. Não imaginei que esse tipo de coisa era possível, nem imaginei que depois da morte era aqui que eu iria parar, o que eu faço? Para onde eu vou? Eu estou livre pra fazer o que eu quiser aonde eu quiser? Bom, foi oque pensei, com desespero não sabia o que fazer até notar que existiam pessoas destacadas em meio a multidões, pessoas não tão diferentes de mim, eram brilhantes e transparentes, igual aqueles fantasmas de desenhos animados, como o Gasparzinho, porém, mais humano.

Não hesitei e fui direto aos semelhantes, perguntei com não tanto carisma a um homem com roupas meio rasgadas e um ferimento no pescoço. Nervoso, falei

— E-Ei, senhor, o que aconteceu? Eu estou morto? Isso é um tipo de limbo?

Ele parava, ainda sem olhar para mim. Respondia com uma risada

— Bom, garoto, sim, você morreu, você morreu com dividas ainda para pagar — ele virava na minha direção, revelando seu rosto deformado com oque parece ser um furo de uma bala no olho direito — E vai ficar aqui até concluir isso, garoto, agora, irei cuidar das minhas.

Sem muita conversa, ele se virava na direção que já estava indo e continuava seu caminho, junto com as multidões de pessoas nas calçadas. Ficava lá, me perguntando e refletindo sobre essas "dívidas", talvez eu até saiba, talvez eu só fique preso aqui para sempre assim como parece ser o caso de muitos. Uma crise de pensamentos, um atrás do outro, enchendo minha cabeça me fazendo ficar ali, estático, até eu sentir uma mão em meus ombros, uma sensação física depois de nem mesmo meia hora sem aquilo. Aquela voz que parecia de um radialista, falava com muito entusiasmo

— Olá, garoto perdido! Precisa de ajuda? Acabou de chegar na última etapa da vida e não sabe para onde ir? — Virava, vendo um homem de terno inteiramente branco de um lado e preto do outro, como o terno do Duas-caras do Batman — Bom, seus problemas acabaram, meu jovem! Você pode se registrar e cuidar de suas dívidas no seu tempo, garantindo que cumpra as regras do plano espiritual.

Perplexo, não sabia direito oque responder, então fui direto ao ponto que me intrigou, curioso

— Plano espiritual?

Ele, com um rosto estático olhando pra mim, percebeu

— Ah! Você é novo por aqui, é verdade — Ele rindo um pouco da situação, mas parecendo manter uma posição séria — Bem vindo ao plano espiritual!

Ao ouvir aquilo fez eu perceber tudo ao meu redor, todas as pessoas fantasmas, todos flutuando ou andando, parados ou dançando, entrando em estados de loucura ou tentando se acalmar. Notei seres estranhos ao lado desses espíritos, seres que pareciam "monstros" que seguiam as pessoas que pareciam não ligar pra aquela situação, pra aquela entidade seguindo-os. Aquelas criaturas estranhas que pareciam misturas de animais de uma forma bem bizarra, um parecia ser uma mistura de lobo com urso de uma maneira bem assustadora, com garras e dentes bem visíveis que parecia não querer atacar ninguém. Após perder meu foco no homem de terno, comecei a voltar na realidade que estava, a frente de um homem me olhando estaticamente para mim de uma maneira desconfortável aos meus olhos. Ele continuava, com uma prancheta na mão, aparentando querer anotar algo.

— Então, meu jovem, irá me dizer seu nome? — Perguntava com o maior tom de curiosidade na voz, com aquela voz de radialista — Basta me dizer seu nome que será aceito por aqui, desde que não faça nada de errado.