Sonho Lúcido

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Baseado em: O Tempo Não Pára e Ideologia do Cazuza. Além de várias outras referências retiradas do MPB. Divirta-se com o capítulo!

"Para" do verbo "parar" antes do acordo ortográfico que vigora desde 2009 tinha acento agudo na sua primeira vogal, logo "pára". A música de Cazuza foi lançada em 1988. Não, não é erro de português.

Na madrugada de 23 de abril de 2001, o celular de Choi San toca incessantemente até que o homem o atenda.

— Sr. Choi? Me desculpe ligar a essa hora, mas você está na lista de contatos de emergência de Jung Wooyoung. É o único nela. Ele passará pelo processo de Eutanásia depois de amanhã, pediu exclusivamente para te ver antes de qualquer coisa. — Era uma voz estranha, feminina. Talvez fosse uma enfermeira ou médica, mas não se apresentou dessa forma.

Há quanto tempo já não ouvia o nome dele? Sentia o coração doer no peito. Mei, se esposa, dormia angelicalmente ao seu lado. Já Wooyoung, sua paixão intensa da adolescência que ainda fazia seu coração palpitar só com a sua menção, sabe-se lá onde estava.

— Eu não o vejo há 10 anos. Você tem certeza? — Espanto definia San, mas logo aquele mar revolto que era seu interior foi substituído por uma estranha calmaria, talvez esperando o momento certo para uma verdadeira tempestade marítima. 

— Você é Choi San?

— Sim. 

— Eu tenho certeza. Não posso dar mais informações, mas enviarei o endereço por SMS. Não o abandone outra vez. — Depois disso ouviu apenas a linha do telefone. E aquela última frase tinha sinto uma pancada, um baque, um choque. 

San teve um flashback, coisa que há muito tempo não se fazia presente na sua vida. Estava sempre visando futuro e nunca o passado. Levantou-se da cama, Mei nem sentiria sua falta. Ela nunca sentia e vice-versa. O relacionamento deles já estava morto antes mesmo de começar, pois seu coração nunca havia pertencido a ninguém além de Wooyoung. Entretanto, o medo de assumir os fatos concretos era tão real que chegava a ser palpável, doía no seu dorso inteiro. Ele precisou de ar, então foi até a sacada do quarto fumar um cigarro.

O ar de Seul enchendo os seus pulmões, às vezes, era pior do que inalar gás tóxico.

A sacada da sua cobertura em Seul era mais um motivo para a sua vergonha. O que o San de 1991 acharia desse cara agora? Bem, o San de 2001 tinha optado pelo conforto da sua família, mas o antigo sentiria asco profundo. A pessoa que tinha se tornado era repugnante em todos os seus sinônimos. Almoçava refeições que custavam milhões de wons todos os dias, enquanto outros milhões de esfomeados no mundo inteiro se esforçavam por um prato de arroz. Ele geralmente não se importava, a alienação era um modo mais indolor, mas ao ter se lembrado de Jung de repente, suas ideologias de jovem rebelde vinham à tona junto com o amor que sentia por Wooyoung. Ainda se lembrava das palavras de seu pai quando fez uma tentativa falha de assumir a homossexualidade. Ladrão, bicha, maconheiro. 

— Quando você vai deixar de ser moleque? Já tem tamanho de homem. Já 'tá na hora de parar de brincar de casinha com esse rapaz. 

Eles não estavam brincando de casinha, mas aquele prazer era risco de vida. Era amor, do tipo que fazia cócegas na boca do estômago, cada palavra era sincera entre cigarros e as cervejas mais baratas da distribuidora. Wooyoung não se importava com o seu dinheiro, com o que ele vestia, como comia à mesa, se ele falava palavrões, se ele era etiquetado. Tudo o que Jung queria era ser amado de volta. E San amava, mas tinha cometido o pior erro da sua vida ao ter tanto medo. Medo da vida, medo do futuro, medo do tempo. Medo de gostar do que gostava, de amar o que amava. Mas agora, ele não tinha mais nada a perder e essa realização veio com o telefonema. 

o tempo não pára ♡ woosanOnde histórias criam vida. Descubra agora