Capítulo 1

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Os ouvidos zuniam enquanto ela sentia diversos corpos esbarrando, agarrando, empurrando-a. O suor descia em gotas pela nuca enquanto as guitarras rasgavam a noite. Onde ele havia ido?

Samanta saiu acotovelando a todos enquanto buscava abrir caminho pela multidão de corpos desgovernados e alcoolizados. Deixando o vocalista para trás enquanto ele gritava um trecho que dizia: "You don't even answer the damn phone anymore!". Uma cotovelada foi desferida contra suas costelas, causando falta de ar. Ela queria esganar o Adriano. Ele simplesmente olhara para o celular que piscava pela chegada de uma mensagem, gritara um "Já volto. Não saia daqui" e saíra correndo. Isso fora há cerca de uma hora. Ela não tinha dúvidas sobre o ocorrido. Era óbvio que a Vanessa estava marcando território novamente. Mas que tipo de homem deixaria-se ser tão profundamente manipulado? Eles haviam terminado há dois meses. Na realidade ela terminara com ele, em um bar, com todos os amigos em volta e então beijara o melhor amigo dele, na cara dura. Que perrengue Samanta passara para retirá-lo de lá. E para não socar Vanessa na cara, afinal, Samanta e Luíz - o melhor amigo - estavam naquela fase em que não se sabe ao certo se estão ou não namorando. E então ela e Adriano passaram o resto da noite bebendo tequila em um bar mais afastado. Desnecessário dizer que acordaram apoiados um no outro com o sol batendo na cara, na belíssima manhã de domingo, em plena calçada na frente do bar em questão. Nenhum dos dois foi capaz de relembrar como aquilo aconteceu.

Ao passar pelo último grande aglomerado de pessoas, Samanta pode ver Adriano parado, de costas para ela, gesticulando com veemência para uma mulher alta de cabelos negros encaracolados que brilhavam azuis com a iluminação. Vanessa. Eles estavam discutindo.

Uma chama ascendeu-se em Samanta e começou a crescer. Quem ela pensava que era para ficar irritada com o Adriano por que ele saiu com a melhor amiga? Por que, com certeza, esse era o problema. Esse sempre fora o problema. Desde que Adriano e Vanessa começaram a namorar, ela havia invocado com Sam. Qual o problema com ela? Vanessa realmente achava que Sam representava uma ameaça? Por favor, ela e Adriano conheciam-se há mais de 15 anos. Se nada havia acontecido até agora, não aconteceria mais. Mas por maior que fosse o ímpeto de forçar seus pés à frente, Sam não conseguiu mover um músculo, ficando parada com cara de árvore enquanto os dois discutiam.

Até que Vanessa a viu, plantada próxima à entrada, observando a cena. O rosto dela fechou-se em uma carranca irada enquanto mirava Sam nos olhos, então desviou o olhar e transferiu toda a sua raiva para Adriano, desferindo-lhe um tapa feroz e saindo em seguida, batendo os pés, enquanto ele berrava: "Vaca! Nunca mais venha atrás de mim, sua desgraçada do caralho!".

Ele levou a mão à face e praguejou baixinho. Neste instante Sam sabia que deveria ter feito algo. Saído dali ou ter corrido até ele. Qualquer ação teria sido melhor - merda, até ter gritado "vagabunda" para Vanessa teria sido melhor - do que Adriano virar e vê-la encarando-o, estática. O silêncio que pairou entre os dois foi encoberto pela música alta.

"Você está aí há quanto tempo?", Adriano quis saber. Seu rosto estava sério. Chateado.

"Algum tempo", foi tudo o que ela pôde confidenciar. E então os pés começaram a se mover sozinhos e, antes que ela se desse conta, seus braços envolviam os ombros largos do amigo e a cabeça recostava-se sobre seu peito, acompanhando o ritmo estável e grave de seu coração, sentindo sua pele quente contra a bochecha.

Ele a abraçou de volta. Ela estava fria e o segurava com força, como se pensasse que ele ainda desmoronaria. E ele adorava isso. Ela sempre foi a melhor amiga dele, e às vezes agia como uma verdadeira mãezona. Os cabelos dela estavam suados na nuca, muito embora o vento frio açoitasse-os.

Eentão ela o soltou. Segurou sua mão e gritou enquanto o arrastava para aprofusão de figuras humanoides em movimentos desgovernados: "Você está bem?".Ele apertou sua mão e berrou em resposta: "Melhor impossível!",enquanto misturavam-se à horda caótica.

O conciliábuloWhere stories live. Discover now