Finalmente... Esse silêncio gostoso... É tão bom te ouvir pela última vez! Oi!?! Quem é você!? Acabou de surgir, foi? É uma pena, já que logo morrerá. Você quer... Que eu te conte sobre minha vida? Saber como seria ter me acompanhado é?! Tá bom pequena, só porque foi uma das poucas que quis me ouvir ouviu... Bem, do começo então.
Ainda me lembro muito bem do dia que elas apareceram, uma de cada vez com o passar do tempo. A primeira tinha uma voz masculina rouca e surgiu no meu aniversário de 4 anos. Olhando de forma vidrada para a pequena labareda na velinha azul em cima do bolo tão bem decorado de azul e branco. Quando ele surgiu, logo falou "Vá! Toque o fogo!". Eu não sabia o que fazer, olhei para onde a voz vinha, mas não havia ninguém lá, novamente a voz veio e disse "Vamos, não tenha medo, toque o fogo!". Eu não sabia o que fazer e acabei cedendo ao desejo da voz, tentei tocar, mas logo antes de chegar a chama, minha mãe segurou a minha mão e me impediu de tocar.
A segunda voz veio pouco tempo depois, contradizendo o que a primeira falava, sendo feminina e calma, me falando para não queimar as coisas, para tomar cuidado com as chamas que prendiam a minha atenção.
Com o passar dos anos, muitas outras foram surgindo, havia uma divisão delas, sendo 3 grupos ao total, as que desejavam ver as chamas, pediam incessantemente para me ver queimar as coisas, essas eram a grande maioria, vou chamá-las de braseiros, as que se opunham, desejavam mais que tudo que eu me cuidasse e não cedesse aos pedidos das demais, compunham quase que todo o resto, elas serão as inacesas. E por fim as incendiárias, seu desejo era o fogo... Consumindo qualquer coisa... Se fosse feito de carne... E estivesse vivo... Seria o melhor para elas. Ainda bem que se mantiveram em calmaria por boa parte de minha vida.
As chamas que eu criava, me deixavam preso a olhar elas até desaparecerem. Quando isso acontecia, os braseiros se acalmavam, enquanto as inacesas protestavam, o tumulto que criavam em minha mente era um pouco desconfortante, mas não o suficiente para me desconcentrar, já as incendiárias, no fundo de minha cabeça, me incentivaram a ir mais além, mesmo tão fracas as vozes, essas me ajudavam a me concentrar na chama.
Meu comportamento era preocupante para meus pais, alguém tão novo e tão dedicado aos estudos, ocasionalmente pegava coisas para queimar enquanto observava sem pestanejar. Até meus 10 anos, frequentemente eu era levado ao psicólogo para tentar entender o que havia comigo, mas sempre que eu tentava falar das vozes, minha boca não se abria, no lugar, eu falava sobre qualquer outra coisa que era sussurrada para mim pelas incendiárias. Desde minha infância eu estava preso a elas sem ser capaz de pedir socorro.
A primeira vez que elas se silenciaram depois de não pararem de gritar. Ouvia gritos de todos os lados, seja das vozes perturbadoras, seja dos meus pais discutindo sobre mim, sobre as diversas reclamações que recebiam por minha causa. Na época eu só tinha 10 anos. Ainda me lembro como as vozes de ambos, mesmo não estando tão altas assim, conseguiam facilmente ultrapassar o barulho daquelas em minha cabeça. O ódio de ambos, um contra o outro e contra mim, culpando sem achar um responsável de fato. Enquanto isso, as vozes gritavam comigo e com sigo mesmas, pela primeira vez, dois grupos concordaram, as inacesas e os braseiros, concordaram em não fazer nada e apenas esperar o fim daquele problema todo, elas estavam contra as incendiárias e seu desejo insano.
O silêncio, mesmo que por poucos minutos, pareceu uma eternidade, eu vendo aquelas chamas se alastrando e queimando tudo. As incendiárias me fizeram atear fogo a minha casa com meus pais dentro, suas vozes tão insistentes gritando, me levando a insanidade, um perfeito inferno dentro de minha cabeça. Assim que eu acendi alguns fósforos que deixava escondido no quarto e joguei no corredor no carpete perto do quarto deles. Caminhei pra fora de casa, o último pedido delas foi de trancar meus pais dentro de casa, e fiquei observando da calçada, as chamas tomarem conta de tudo.
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Peso das Vozes
FantasyOuvindo vozes desde a infância, nunca pude estar realmente em paz, a vontade do fogo que elas transmitiam me queimou. Mas finalmente estou livre!