1º Capítulo: Carolina narrando

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Eu não fui habituada demais à questão família. O que eu tomava como família era: minha mãe, minha vó, eu e meu pai. Agora as coisas estavam completamente diferentes. Tão diferentes que eu senti o choque e a dor juntamente com todos os novos membros da família. Quando um membro morre, todos nós morremos um pouco. Nós nascemos sabendo que vamos morrer hoje eu sei que ao nascer por pouco experimentei um pouco da morte e entendi o lado dos meus pais sobre quererem me proteger. O olhar triste de todos ali era desolador. Era alguém que compartilhava do meu sangue, alguém que por semanas me contou inúmeras histórias enquanto me mimava. Mimos que por anos fora privado por conta do que aconteceu lá no passado. Eu choro silencioso da minha mãe dava suporte a montanha do meu pai que por agora estava em pleno deslizamento. A Gabriela, que sempre demonstrava ser durona, estava trancada no quarto por horas. Eu havia aproveitado tão pouco da minha vó, mas o cheirinho gostoso, o colo e os lanches da tarde sempre estariam guardados em minha memória. Babi, como gostava de ser chamada, deixou para trás um marido, dois filhos, quatro netos e milhares de amigos que a amavam. A morte ela vem de várias formas e dessa vez preferiu vir silenciosa, sem machucar, sem deprimir e natural. Ela levou a minha vó para o descanso eterno, me deixando o gosto de uma vida inteira não aproveitada e agora eu estava sentada no sofá da minha nova casa esperando meu tio Pezão vir me buscar para o velório.
Gabi: Carol, meu tio já ligou? – Ela sentou ao meu lado no sofá.
Carol: Ligou e disse que já estava vindo.
Gabi: E o pai?
Carol: Ele já está lá com a minha mãe.
Gabi: Certo. – Eu não sou boa com palavras de conforto. Era a primeira grande perda que havia passado. Já a Gabi, bem, a mãe dela havia a abandonado, a avó materna não ia muito com sua cara por não gostar do nosso pai e por anos nossa vó Babi fora sua presença materna.
Carol: Ei, vai ficar tudo bem, ok?
Gabi: Primeiro foi a tia Patrícia, o tio PH e agora minha vó? Eu não aguento mais isso não, Carol. – Eu sequei suas lágrimas e a abracei mais apertado.
Carol: Claro que aguenta amor. A vó precisava descansar, Deus estava precisando dela lá no céu. – Ela assentiu com a cabeça deitada no meu peito

Meu tio Pezão chegou, entramos em seu carro e fomos para o velório que estava acontecendo na quadra do outro lado do morro. Havia um monte de gente ali, mas só deixaram os familiares se aproximarem do caixão. O meu pai abraçava a tia Catarina que chorava sem parar, enquanto meu avô estava sentado em uma cadeira de plástico ao lado da minha mãe.
Gabi: Você vai comigo até lá, Carol?
Carol: Vou sim. – Eu segurei em sua mão e fui com ela até o caixão.
Gabi: Ah vózinha... Vai em paz. – Ela beijou a testa da nossa vó e eu fiz o mesmo.
Carol: Você foi a melhor vó do mundo. – Acariciei sua bochecha sentindo meu coração se apertar fazendo lágrimas rolarem pela minha bochecha. Abracei a Gabi de lado e fomos até onde o Guidin estava sentado com a Kiara e a Lorena no colo dele. Subimos os degraus da arquibancada e sentamos ao lado dele.
Guidin: Oi meninas. – Ele deu um sorriso sem graça sem mostrar os dentes.
Carol: Oi.
O olhar de todos ali era de pura tristeza e eu não tinha mais ânimo para nada. Ficamos a tarde toda e a noite toda. Quando a madrugada começou a chegar, meu pai pediu que o Guidin levasse a gente pra casa.
Carol: O senhor vai ficar? – Olhei pra ele.
Imperador: Vou meu amor. – Ele fez carinho na minha bochecha com o polegar.
Carol: Então eu vou também.
Imperador: Oh Carol, vai pra casa descansar.
Carol: Mas e a mãe? – Minha mãe havia falado tão pouco hoje e eu entendia sua forma de luto.
Imperador: Eu quero que ela vá pra casa também, mas ela não quer.
Carol: Logo mais ela vai. – Eu o abracei forte e ele fez carinho na minha cabeça.
Imperador: Vai lá vai. – Ele beijou minha testa e então fui com o Guidin.
A Gabi já esperava do lado de fora com a Kiara que tinha a Lorena no colo.
Guidin: Vamos?

Kiara: Uhum. – Fomos até onde o carro do pai do Guidin estava. Entramos e então ele foi dirigindo até a minha casa.
Gabi: Vocês não querem passar a noite aqui?
Guidin: Vamos Kiara?
Kiara: Vamos sim. – Saímos do carro e o Guidin o colocou na garagem. A Gabi abriu a porta para entrarmos. Eu fui para o quarto da Gabi com a Kiara, que colocou a Lorena para dormir na cama.
Kiara: Dia difícil né? – Ela sentou na cama ao lado da Lorena.
Carol: Dia cinza. Prefiro chamar assim.
Kiara: Miguel se faz de forte, mas ele está a ponto de desabar.
Carol: Se pra mim está sendo difícil, eu imagino pra ele e pra Gabi que eram mais apegados ainda a ela.
Kiara: Muito difícil. – Nós duas deixamos a Lorena dormindo e descemos as escadas. O Guidin estava deitado em um sofá e a Gabi no outro.
Gabi: Vamos ajeitar o chão lá do meu quarto pra gente. Deixa que a Kiara durma na cama com a Lorena na cama e nós três dormimos no chão.
Guidin: Concordo tô cansadão. – A Gabi trancou a porta e fomos lá pra cima. A Gabi emprestou uma roupa pra Kiara que foi tomar logo um banho enquanto eu e a Gabi ficamos arrumando o chão. Eu peguei minha roupa e fui tomar o banho no banheiro do andar debaixo. Terminei meu banho, voltei para o quarto da Gabi e deitei no meu espaço.
Logo todos já estávamos ajeitados pra dormir, mas ninguém dormiu. Ficamos conversando, eles falavam sobre a dona Babi no momento da infância deles. E eu pensei logo na minha vó que ficou em Minas, peguei meu celular e já enviei uma mensagem perguntando se estava tudo bem. Eu e ela nos falávamos quase todos os dias depois que a minha mãe conversou a sós comigo a respeito do passado das duas. Por um lado eu entendia a minha vó, por outro eu tinha a minha opinião sobre o que aconteceu. Eu não sei se seria capaz de perdoar alguém dessa forma.
O dia logo amanheceu eu havia cochilado um pouco. A Lorena fez uma sequência de perguntas para o Guidin, que preferiu ficar em casa com a Lorena. Levá-la a um cemitério não seria bom para uma criança. Não era bom nem para nós e a Lorena mal entendia. A Camille, filha da Luana de idade aproximada da Lorena, ficou também com o Guidin. Ele poderia ser um bocó, rei das piadas fora de hora, mas o menino era bom pra caralho com crianças.

Todo vilão tem sua donzela 3 tempOnde histórias criam vida. Descubra agora