| Parte Um |

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Dulce María

A professora mal havia terminado de nos dispensar e eu já corria como louca pela faculdade. Eu não poderia nem sonhar em perder o ônibus, se eu chegasse atrasada hoje dona Sophia faria picadinho de mim. Meu Deus, como eu queria sumir daquela casa e nunca mais olhar para trás. Esperei uns dez minutos e minha carona amarela e desajeitada chegou e eu entrei rapidinho, dando "bom dia" ao motorista e ao cobrador, antes de me acomodar em um banco.

Durante a próxima uma hora eu fiquei passando e repassando tudo eu tinha que fazer no dia de hoje, começando por preparar o almoço fit de dona Sophia e suas filhas, depois teria de passar e fazer os últimos ajustes nos vestidos de cada uma, dar brilhos aos seus sapatos de gala organizar – pela segunda vez no dia – seus quartos e isso era o que tinha que ser feito antes das cinco horas, quando as três voltariam no spa.

Assim que cheguei em frente a minha casa – uma enorme mansão, localizada em uma das regiões mais caras de Curitiba – entrei pela porta dos fundos depois de verificar se nem uma delas estava em casa e já fui prendendo os cabelos, trocando meus tênis surrados por um par de chinelos que eu deixava propositalmente em um cantinho escondido da cozinha. Na meia hora seguinte era crucial que eu estivesse concentrada e fizesse tudo com precisão, caso contrário eu já podia esperar ouvir as reclamações de minha madrasta e suas filhas.

Eu até hoje não tinha conseguido entender onde as coisas deram erradas. Nós poderíamos ter sido uma família tão feliz.

Meu pai tinha casado com Sophia Magalhães quando eu tinha dez anos, depois de ficar cinco anos de luto, após a súbita e prematura morte de minha mãe. Quando ele conheceu Sophia ela parecia ser legal, me dava alguns presentes e era sempre bem educada e carinhosa quando nos encontrávamos quando ela e meu pai começaram a se conhecer melhor e eu em toda a minha inocência infantil acreditei que ela podia ser como uma mãe – ainda que eu jamais a colocasse no lugar de minha verdadeira mãe – por isso e por ver a felicidade de meu pai eu apoiei o relacionamento e todas as noites pedia ao papai do céu para que eles dessem certo.

Porém depois que eles firmaram noivado, a coisa começou a mudar de figura. Eu conheci Belinda e Paola, ambas filhas do antigo casamento de Sophia, elas tinham a mesma idade que eu mas ao contrário do que eu esperava, elas não eram legais. Não brincavam comigo e eram maldosas sem motivo e para piorar, Sophia que outrora fora quase uma mãe para mim, passara a ser cruel comigo. Só que há essa altura era tarde para eu convencer papai a mudar de ideia, sempre que tentei falar com ele, Sophia ou as filhas apareciam do nada e me impediam de falar com ele ou o convenciam de que eu só estava com ciúmes das minhas novas "irmãs".

— Mãe, você não vai acreditar no que aconteceu. — De repente ouvi a voz de Belinda, seguida de bateres de salto e sacolas.

— Acredita que a Marília Espinhosa acusou a gente de estar usando uma Chanel falsa. — A voz de Paola atrapalhou a da irmã.

— É Esttinhozá, sua retardada. — Implicou Belinda e eu tive que conter uma risada.

Apesar de não gostar muito delas, gostava de ouvir suas discussões e as inevitáveis pérolas que Paola acabava soltando. Eu nunca consegui entender esse problema que ela tem com certas palavras, ela simplesmente esquece a pronúncia ou troca por alguma coisa nada a ver.

— Ai, meninas não sei por que vocês falam com aquela invejosa. Ela fala isso só porque a família dela está falida e ela não deve poder nem comprar uma Gucci da coleção passada. — Você também não, pensei. Sophia as consolava como se nós mesmas não estivéssemos falidas. — Dulce! — Ela gritou do nada. — Dulce!

Mais Uma Cinderela - VondyOnde histórias criam vida. Descubra agora