ÚNICO

335 29 2
                                    

Naruto não me pertence.

MATRIMÔNIO

"Eu não quero me casar." A mulher pensou, talvez pela milésima vez. Encarava a imagem refletida no espelho que ocupava a parede inteira, tendo uma noiva encarando-a de volta. O vestido tomara que caia que lhe cobria, branco, como exigia o costume, era adornado por rendas, pequenas pérolas e pedrinhas cintilantes, espalhando-se em harmonia num arranjo maravilhoso que ia até a longa cauda da vestimenta. Os cabelos loiros-escuro quedavam-se numa elegante e fina forma de coque trançado, e flores brancas adornavam-lhes, dando-lhe uma aparência delicada. Ela nunca parecia delicada.

"Eu não quero me casar." Abriu a porta e saiu para varanda. O vento tocou-a de leve, acariciando seu rosto. Encostou-se à amurada, encarando a paisagem lá embaixo. Luminosa, florida, requintada, apinhada de gente. Chegou mais perto, a barriga pressionada na grade que era agarrada pelos dedos lânguidos. As pessoas que aguardavam pelo início da cerimônia não tomaram conhecimento dela.

"Eu não quero me casar." Esticou-se, fazendo seu tronco sair dos limites da varanda. Os olhos começaram a encher de água, mas ela não deixou descer. Estragaria a maquiagem. Todos estranhariam se ela adentrasse o salão com o rosto todo manchado em tons de preto, vermelho e dourado.

"Eu não quero me casar." Voltou o olhar oliva para o céu. Não havia nuvens, e, fora a lua redonda, prateada e dominante, também não havia estrelas. Sentiu vontade de ser como o satélite.

"Eu não quero me casar." Ouviu a porta abrir novamente. Por cima do ombro, viu uma loira de olhos azuis se aproximar. O sorriso que ela mostrava não chegava aos olhos. Com uma voz ríspida, avisou que seu amigo merecia ser feliz, e que era seu papel ajudá-lo a alcançar tal felicidade. Tudo bem, a noiva respondeu, a voz impassível. Ela sabia que ele merecia. A outra puxou-a para um abraço. Declarou que estava orgulhosa de sua atitude antes de sair.

"Eu não quero me casar." Entrou e se sentou na cama. A única coisa a fazer agora era esperar. Esperar por seus irmãos. Esperar pelo início do ritual. Esperar.

"Eu não quero me casar." Os irmãos, enfim, chegaram. O mais novo ficou parado no umbral da porta, analisando-a. Perguntou, com preocupação, se ela tinha certeza se queria fazer aquilo. Parecia ver através dela. Não, desejou dizer, tenho certeza do oposto. Mas não o fez. Ao invés disso, viu o irmão do meio sorrir-lhe e abraçá-la pela cintura, dizendo que é claro que ela tinha certeza, ao que ela sorriu e concordou. O homem de cabelos vermelhos pediu que ela esperasse dois minutos antes de descer, e avisou que eles a esperariam ao pé da escada. Disse-lhe um raro 'eu amo você'.

"Eu não quero me casar." A mão feminina voou com violência em direção à coroa de flores, mas caiu flacidamente ao lado do corpo antes que a alcançasse. Querer não era poder, nunca fora. Deveria casar. Deveria. Mas, ainda assim...

"Eu não quero me casar." Parou no topo da escada, segurando a respiração ao ouvir a marcha nupcial.

"Eu não quero me casar. Eu não quero me casar. Eu não quero me casar." Sorriu, pousando a mão no corrimão. Os olhos voltaram a marejar. Não se reprimiu dessa vez.

"Eu não quero me casar." Desceu os degraus com graça, uma expressão de felicidade transbordante no rosto. Os convidados contemplavam-na de pé, os olhos fixos em sua figura esguia. Chegou ao térreo e pegou um braço de cada um dos irmãos, que sorriam; um discretamente, o outro, de forma ampla.

"Eu não quero me casar." Respirou fundo, o aroma de copos-de-leite invadindo-lhe os pulmões. Odiava copos-de-leite. Detestava a brancura esverdeada e acetinada que o salão ostentava. Não suportava toda aquela beleza radiante, por simplesmente não combinar com seu estado de espírito.

"Eu não quero me casar." Fez o caminho até o altar a passos firmes. O noivo virou-se para ela, e ela leu em seus olhos o receio sufocando a felicidade. Ele sabia que ela não queria se casar. E tinha medo de que ela desistisse no altar.

"Eu não quero me casar." Ela queria querer. Queria, de verdade. Mas não podia. Ela sorriu para ele, tentando tranquilizá-lo com o olhar. Os ombros dele relaxaram, mas só um pouco. A tensão restante era a típica de um noivo. Ele estava dentro de um black-tie preto, perfeitamente assentado, um lenço verde na lapela. Sorriu de volta para a mulher.

"Eu não quero me casar." A mão dele se estendeu, e ela a segurou. Cuide de quem eu amo, disse o irmão do meio ao noivo. Teve como resposta uma garantia de que assim seria feito. Com um olhar desconfiado, os dois homens que ela chamava de família foram sentar-se em seus respectivos lugares.

"Eu não quero me casar." Contemplar seu futuro marido, satisfeito, mas temeroso, a fez sentir-se culpada. Gostaria de descobrir qual era o seu problema – Por que não era feliz com que lhe era oferecido? Por que não poderia querer se casar? Por que não se alegrava com o homem magnífico ao seu lado? –, mas ali, no altar, recebendo a bênção do celebrante, achou impossível.

"Eu não quero me casar." Assistiu o ritual se arrastar, totalmente alheia a tudo. A visão que tinha da situação era parecida à que tinha de um sonho; surreal, desfocada. Até que lhe perguntaram se aceitava aquele matrimônio.

"Eu não quero me casar." Pensou mais uma vez. Uma última vez.

– Sim – Exalou decididamente. – Eu aceito.

O sorriso de seu noivo – agora marido – foi tão grande que ela temeu que rasgasse o rosto masculino. Ouviu também o sim dele, e, com os olhos cheios de lágrimas, trocaram as alianças. Então veio a permissão dada pelo juiz: Pode beijar a noiva.

Quando a boca dele encostou-se à dela, ela se lembrou de porque não queria se casar. Não queria por não suportar o tamanho do amor que tinha por ele; porque não queria sentir que faria tudo por ele; porque não queria se preocupar tanto por uma pessoa que não ela mesma; porque não queria se deixar dominar... Porque tinha medo. Amar tanto alguém quanto ela o amava era assustador.

"Você queria, sim, se casar." Sua mente acusou, e ela sorriu. Agora não parecia tão terrível assim. Tocou o rosto do marido e disse que o amava. Depois disso, afastou todo e qualquer pensamento da mente. Estava ocupada demais se protegendo da chuva de arroz.

Porque, afinal, ela se casou.

NOTAS FINAIS

Capa pela maravilhosa @fofarizey. <3Um doce pra quem identificou todo mundo que aparece no capítulo! :-PEsse texto é bem, antigo, mas achei que ia ficar legal se eu encaixasse ShikaTema nele. O que acharam?Beijão!Ah! Reviews?

MatrimônioOnde histórias criam vida. Descubra agora