tim-tim

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se não fosse você, seria eu. não percebeu? fiz a escolha óbvia. pode me deixar falando sozinho agora, o que quer que tenha construído até agora ruiu sob seus pés descalços. pode pegar aquele livro e rasgar as páginas grifadas, tudo o que você diz é besteira.

era tudo sobre meu egocentrismo e auto destruição, nunca sobre a sua boca desprovida de sentidos ou sua mente fosca. não pode pensar que eu ficaria ruminando aquelas palavras ou orbitando meu pequeno planeta ao redor da sua existência questionável.

certo, tivemos problemas de comunicação. você só ouvia o que queria e eu conversava com as paredes. sempre fui aquele bobão sentado no fundo do ônibus contando histórias sem sentido dentro da própria cabeça. se tivesse se esforçado um pouco mais, talvez você pudesse ouvir o som da chuva torrencial batizando a cidade naquele primeiro de abril.

o sinal mal interpretado escapou para o pesadelo obscurecido pelo desejo de apagar com as mãos o tempo transcorrido. se minha insensatez ou sua arrogância serviram os pratos do cardápio, certamente meu orgulho pagou o preço. vou mastigar cada pedaço de você com o nojo que queima meu corpo e cuspir tudo no caldeirão de espectros rejeitados. que tipo de falta você faria, afinal?

não tenho olhos de minerva para ver tudo, mas tenho o faro de mil cães privados de condições existenciais e sinto o cheiro do seu desprezo mesmo que esteja do outro lado do país. poderia afiar facas certificadas em duas horas de um programa de tv marítimo. a antropofagia seria mais adequada a nossas aspirações, de qualquer forma.

pule para a próxima etapa e tente não fazer um papel ridículo no caminho. já estive nesta plataforma de abundâncias sutis, você deveria ter visto. claro, seus olhos sempre estiveram bem fechados quando se trata de mim. quando menos esperar, alguém irá arrancá-los. a sopa precisa de ingredientes.

voltarei a enfiar o canudo na boca e ficar bem quietinho vendo as disputas corruptas por seu corpo inútil. ao entardecer vou sintonizar meu canal em desenhos animados e esquecer suas leituras de cartas estúpidas. sinais de fumaça não chegam a altura de minhas aspirações, e cartas amassadas serão devidamente rasgadas e engolidas com soníferos e refrigerante de uva.

hoje a noite eu não vou te salvar, e amanhã talvez você me agradeça. durma, sonhe com anjos exterminadores e acorde com a intragável realidade e o vazio de minhas palavras íntimas e esquisitas demais para seu cérebro fosco.

use seus truques do modo que lhe aprouver antes que a ampulheta esvazie e a árvore carregada caia sobrepujada por raios de uma tempestade elétrica que, se minhas preces forem atendidas, queimará seus nervos direitinho.

espero que tenham um bom jantar quando seu corpo for servido ao molho de maçãs estragadas e vinho falsificado. tim-tim, imbecil.

antropofagiaOnde histórias criam vida. Descubra agora