Capítulo Único

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Me sentia vibrar em antecipação enquanto esperava a porta da frente ser aberta. Meu estômago se contorcia, as tão costumeiras dores se acentuando por meu corpo inteiro. Mal conseguia me controlar sob meus pés pela ansiedade, os segundos parecendo se arrastar por toda a eternidade.

"Como ele está?"

A porta mal havia sido aberta quando as palavras dispararam de minha boca, e eu nem tinha prestado atenção ao cheiro para saber quem estava me recepcionando. Fiquei ainda mais ansioso quando vi seu pai, já que para ele estar em casa era porque as coisas estavam realmente ruins.

Ele suspirou e me deu passagem, começando a falar apenas quando eu estava devidamente sentado em sua sala, meus pés cobertos apenas por meias batucando em um ritmo frenético contra o chão frio enquanto tentava desesperadamente controlar meus feromônios. Tudo o que eu menos queria agora era impregnar sua casa com a minha preocupação. Seria, além de tudo, uma bela falta de respeito.

"Ele mal está saindo da cama". Seus olhos estavam perdidos nas paredes quando começou a narrar em voz baixa o que eu gostaria tanto saber. "Ele foi piorando gradativamente durante esses meses, e eu te juro que ele nunca ficou tão mal. Não sabemos se os remédios perderam o efeito ou se é pelo tempo desde sua última visita, mas as dores estão cada vez mais frequentes também, e..."

Ele suspirou novamente, passando as mãos pelos cabelos de forma cansada, seu cheiro dominando a sala conforme seu nervosismo aumentava ao lembrar o caso do filho. Suspirei também, jogando as costas no sofá e passando as mãos pelo rosto enquanto sentia a culpa esmagadora possuir meu corpo, causando uma dor quase física.

"Aiko está o ajudando com o banho", falou, se referindo à esposa enquanto se levantava. "Ela lhe dirá quando puder entrar."

Dito isso, ele caminhou para algum outro cômodo de sua casa, me deixando sozinho naquela sala que já me era tão familiar.

Fechando os olhos, tentei me lembrar do porquê de ter me afastado, mesmo sabendo das consequências que meus atos poderiam acarretar. Minha tão sonhada faculdade era em outra cidade, e ninguém me perdoaria se eu não aceitasse a vaga, nem mesmo ele. Não perdoariam se eu tivesse negado aquela oportunidade única de intercâmbio de três meses totalmente pago pela faculdade, experiência ofertada uma vez por ano para o melhor calouro do departamento viajar junto aos veteranos que também se destacaram.

Eu estava construindo um futuro para nós dois, eu repetia para mim mesmo, tentando me convencer. Eu estava abrindo um caminho para ele, para que ele soubesse que, mesmo em nosso caso, ele poderia tentar também.

Suspirei, resignado. Eu odiava aquilo. Odiava a culpa que me consumia todos os dias, odiava saber que não estava onde deveria estar e odiava que esses sentimentos não estavam ao meu alcance para mudança. Elas vinham de algo muito maior, que eu já lutava a muito tempo para ignorar, para não deixar que controlasse toda minha vida.

Mas eu não podia deixar de me sentir sortudo. Dentre tantas e tantas pessoas no mundo, algo tão raro e especial havia ocorrido conosco. Eu havia sido escolhido pelo universo para ser seu companheiro. Meu coração aquecia e um sorriso involuntário se abria em meu rosto assim que eu pensava sobre isso.

Eu só queria que ele soubesse também.

Eu só queria saber se ele sentiria o mesmo.

Eu só queria acabar de uma vez com esse sofrimento todo.

Pulei no lugar quando senti um cheiro suave vindo do corredor, me levantando para ver Kozume Aiko aparecer na sala com a aparência ainda mais abatida que o marido, contorcendo as mãos nervosamente na toalha que segurava.

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