Prólogo

503 37 6
                                    

"Tá ok, Gizelly. Respira fundo e solta com calma". Era esse o meu mantra enquanto caminhava por aquela rua escura. Minha ansiedade parecia que ia atingir o pico a qualquer momento, resultando numa crise e eu não estava conseguindo me controlar. Era coisa demais pra minha cabeça. Eu tinha tanto pra falar, mas ao mesmo tempo tinha medo que alguém calasse a minha voz pra sempre.

- Isso não tá acontecendo. - Susurrei enquanto caminhava, algumas vezes olhando para trás. Tinha medo de ver uma sombra e me deparar com aquela pessoa. Parecia um pesadelo.

O apartamento que antes era tão perto, parecia que agora tinha cinquenta quilômetros de distância. Minha única vontade era correr até o condomínio, entrar no apartamento e me abrigar embaixo da coberta. Eu precisava sentir aquela paz que eu só tinha lá.

Minha mente tentava buscar uma resposta do porquê tudo aquilo estava acontecendo comigo. Eu só tinha vinte e quatro anos e estava sendo perseguida por aquela pessoa que eu não conseguia nem pronunciar o nome. Eu tinha acabado de me formar e estava prestes a conseguir o emprego dos meus sonhos. Não era justo morrer antes de conseguir colocar as mãos no meu primeiro salário.

Voltei a respirar profundamente e agarrei meu celular na bolsa. Minhas mãos trêmulas mal conseguiam agarrar o aparelho, que por pouco não caiu no chão. Juntei minhas forças e parei embaixo da marquise de uma pizzaria. O lugar não estava aberto, mas ainda tinha alguma iluminação entre as frestas da placa de ferro que me separava deles. Olhei meu celular e não acreditei que aquilo estava acontecendo. Eu tinha pouca bateria e não tinha nenhum pontinho de sinal.

O condomínio estava a dois minutos, mas minhas pernas pareciam começar a travar. Eu precisava continuar andando. Guardei o celular na bolsa e me forcei a caminhar. Depois de dois minutos, vi o portão amarelo aberto e sai correndo até o elevador. Não dei boa noite ao porteiro, nem nada. Eu só queria chegar ao maldito décimo andar e acalmar meu coração de uma vez por todas.

Apertei o botão do elevador e pareceu uma eternidade até a porta se abrir automaticamente. Entrei no elevador e apertei o número 10. Quando as portas se fecharam, pude me encostar no espelho e suspirar. Eu estava a salvo.

O elevador abriu suas portas parando no décimo andar e corri até o apartamento. Bati à porta, toquei a campainha, forcei a maçaneta e senti meu coração disparar ao ouvir o barulho da chave entrando na fechadura, rodando e abrindo a porta. Sons tão significantes e antes insignificantes.

- O que houve? - Não respondi nada e me lancei em seus braços. - Você parece nervosa com alguma coisa.
- Só me abraça, por favor. - Pedi, liberando minha fragilidade. Naquele momento não tinha orgulho, não tinha vaidade, não tinha nada. Eu estava em casa de novo e em segurança.
- Gi, aconteceu alguma coisa? - Novamente não disse nada e fechei meus olhos enquanto apertava suas costas com tanta força que jurava poder quebrar todos seus ossos a qualquer momento. Suspirei e permiti que as lágrimas rolassem por meu rosto.
- Que isso? - Foi soltada abruptamente e encarada fixamente. - O que tá acontecendo?
- Aconteceu uma coisa muito grave. - Comecei a falar enquanto ainda chorava. - Mas eu preciso de um copo d'água.
- Eu vou buscar. - Assenti. - Não sai daí.

Sentei no sofá e só vi quando o copo d'água foi estendido em minha direção. Agradeci e comecei a beber com calma enquanto minha mão era acariciada.

- Que barulho é esse? - Ouvi uma voz no fundo da sala e senti que podia engasgar. - O que tá acontecendo?
- A Gizelly tá...
- Gizelly. - Aquela voz interrompeu tudo ao meu redor. O sorriso dado a mim com tanta repulsa e ironia me deixa nauseada.

No final das contas, minha ameaça e minha segurança andavam literalmente lado a lado e estavam parados na minha frente. Todo o meu esforço de lutar para chegar àquele apartamento parecia, naquele momento, em vão. Eu já não me sentia em casa ali, na verdade, me sentia quase como no inferno. Meu inferno particular causado por uma pessoa específica. E eu não sabia como reagir a toda aquela situação.

A realidade me atingiu tão forte naquele momento que ao entendê-la com clareza, meus olhos se fecharam e perdi meus sentidos.

NósOnde histórias criam vida. Descubra agora