CÉU NOTURNO

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                                                                                              I

O céu noturno e hologramas publicitários marcavam o horizonte de Paine City. Hovercarros voavam para todas as direções. A vida urbana após a meia-noite era extremamente agitada. Indivíduos boêmios e entorpecidos povoavam bares e restaurantes, porém suas vozes eram abafadas pela cacofonia do trânsito e anúncios de todos os lugares. Assim era a atmosfera do distrito Entertainment Valley. Este lugar fora arquitetado para entreter a todos: pobres, ricos, empresários, operários e prostitutas. Divertimentos, negócios e desinibição generalizada compunham a atmosfera local. Todos os sentidos eram abafados e manipulados. Justamente neste lugar inebriante que Reyes iria encontrar seu contato, em um bar de alta classe: Perséfone's.

Externamente o lugar era um tanto quanto modesto, o oposto de outros estabelecimentos do distrito, pomposos e luminosos. Perséfone's adotava uma arquitetura vintage, atrativa para membros de alta classe, que desejavam personificar os grandes barões do início do século XX. Uma escadaria ligava o terraço à recepção. Logo ao entrar, havia uma névoa estabelecida no ambiente, proveniente dos narguilés consumidos. Essências de todos os tipos se misturavam, produzindo um odor pungente. As pessoas ao redor aparentavam estar em outro plano, uma dimensão alternativa. Substâncias psicotrópicas, em outros distritos proibidas, eram distribuídas e utilizadas por quase todos. Uma multidão hedonismo, servil aos prazeres da carne. Apenas os funcionários se mantinham alertas e vigilantes, provavelmente armados.

- Bem-vindo ao Perséfone's.

O recepcionista se dirigiu a Reyes, após se aproximar do balcão.

- Olá, tenho uma cabine reservada para duas pessoas, nome de Senhorita Yellow.

- Ah sim, aqui está. Tudo bem. Primeiro necessito que o senhor coloque sua face neste scanner, para registrá-lo como cliente e identificar a sua etnia.

Um scanner, com uma concavidade em forma de uma face estava instalado em uma haste proveniente do balcão. Reyes posicionou seu rosto na máquina

- Feche os olhos, por favor. Alertou o recepcionista.

Uma forte luz surgiu e, em segundos, estava terminado.

- Senhor Reyes. 1,80. 75 kg. Sem histórico criminal. Ascendência mesoamericana.

Um sistema geral de cadastro fora desenvolvido e era utilizado por todos os estabelecimentos e órgãos governamentais do país. Todos os dados de um indivíduo ao alcance de um digitar de uma tecla.

- Me desculpe, Senhor Reyes. Terá de esperar um pouco. Estamos no limite de clientes de ascendência mesoamericana. Certamente não tardará a alguém sair.

Toda praça, prédio, restaurante ou bar permitiam um certo limite de indivíduos de qualquer etnia. Um grupo não poderia se sobrepor a outra em larga escala, isto poderia gerar animosidades, reminiscências do passado, lembranças amargas, injustiças cometidas.

- Tudo bem.

Reyes não se ressentia com este tipo de coisa, é assim que as coisas funcionam. Falsa sociedade igualitária. Sem guerras. Sem violência. Sem crimes, aparentemente. Abaixo da superfície era um mundo mesquinho e cruel. Conglomerados empresariais lutavam pelo poder, formavam alianças com governos. O próprio Reyes era uma ferramenta para manter o status quo. Assassinatos. Contraespionagem. Furto de informações sigilosas.

Minutos se passaram, Reyes concentrava-se no ambiente, sua percepção sensorial, desenvolvida ao longo dos anos, permitia antever ameaças. Seu estilo de vida permitia uma inversão de papéis: o caçador se torna a caça muitas vezes.

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