Carta ao Meu Por do Sol

Querido alguém,

Se você está lendo esta carta, eu gostaria que você presta-se atenção e que absorvesse essas palavras para você pois a história de hoje é sobre o meu por do sol.

Tudo começo quando eu conheci ela. Uma mulher que sempre tinha um sorriso em seu rosto e possuía uma alma leve, todos a sua volta sempre estavam sorrindo e se divertindo. Eu era o oposto dela, era introvertido, não sorria muito, não tinha muitos amigos e era o cara esquisito no fundo da sala que evitava chamar a atenção.

Me lembro do dia em que pela primeira vez eu a vi desanimada, sem aquele sorriso costumeiro em seu rosto, ela estava usando seu moletom preto preferido que tinha a frase good days escrita, entrou na sala sem cumprimentar ninguém, sentou na cadeira a minha frente e passou o resto do dia assim. Era estranho vê-la daquele jeito tão triste. Quando a aula de anatomia acabou eu a chamei baixinho, quase que inaudível mas ela me ouviu e virou pra mim, me lançou um sorriso simples sem mostrar os dentes e sussurrou um simples "o que?", perguntei se havia algo errado, se ela estava bem, se precisava de alguém para conversar e foi assim que na hora do intervalo eu e ela nos sentamos em um canto reservado e ela me contou tudo que havia acontecido, eu simplesmente a ouvi, não disse nada apenas a abracei e assisti ela chorar e se encolher em uma bolha de tristeza profunda. A partir desse dia eu não sai mais do lado dela e meus sorrisos que eram raros tornaram-se frequentes e verdadeiros. Seis meses depois estávamos criando um vínculo forte. No começo nós saiamos acompanhados pelos amigos dela e tempos depois estávamos saindo só eu e ela.

No dia 20 de Maio de 2018 ela me chamou para passar a noite com ela e me pediu também para chegar às 17hrs, sem pensar duas vezes eu disse que sim e lá estava eu na hora marcada em frente a porta da sua casa, eu estava tão nervoso que minha mão estava suada de um jeito que eu nunca tinha visto, ela abriu a porta pra mim, me abraçou apertado, me puxou para dentro e me levou para uma pequena varanda onde tinha duas cadeiras, uma ao lado da outra. Cada um sentou em uma cadeira e ficamos em silencio, eu estava confuso pois não sabia o que estava acontecendo, perguntei para ela se estava bem e a mesma não respondeu, continuou olhando para o por do sol enquanto abraçava suas pernas contra o peito, ela suspirou e olhou para mim e me analisou dos pés a cabeça, virou novamente a cabeça para frente e naquele momento eu entrei em pânico por dentro, até ela começar a falar e essas foram as exatas palavras dela.

"Como é possível o por do sol ser a coisa mais linda e ao mesmo tempo tão simples... Todo dia eu sento aqui e fico olhando o sol e sua luz ir embora, dando espaço para a escuridão da noite iluminada pela luz fraca da lua. Em dias bons eu me sinto como o sol, imponente, inabalável e em dias ruins eu me sinto com um dia nublado, sem cor, sem vida. Desde que meus pais morreram naquele fatídico dia..."

Quando eu a olho vejo a mesma com os olhos marejados e os lábios formando uma linha fina.

"Eu não tinha vontade de levantar da cama, só queria ficar naquela bolha de sofrimento, tristeza e moletons grandes onde eu me encolhia dentro e sumia mas você mudou isso, quando se permitiu me escutar e simplesmente me abraçar sem dizer as palavras que eu já estava cansada de ouvir, naquele dia me passou pequenas memorias suas me olhando e desviando olhares quando eu te olhava, foi até um pouco engraçado se eu não tivesse me sentido mal com aquilo, você sempre estava por perto mesmo estando longe e eu nunca te notei, nunca fui falar com você. Depois de todos os nossos encontros eu me sento aqui independente do horário e fico absorvendo todas as emoções que você me trouxe em apenas algumas horas e todo encontro são emoções diferente e mais fortes.
Minha mãe tinha me ligado poucas horas antes do acidente e me falou sobre isso, de refletir sobre nossas atitudes, sobre como tratamos os outros, na hora não fez muito sentido mas a cada dia que passa eu entendo mais o que ela quis me dizer. Então todo dia eu sento aqui na hora do por do sol pois era a hora que ela mais gostava e fico refletindo sobre tudo, em como foi meu dia, minhas atitudes, se eu poderia ter feito melhor, se eu aproveitei ao máximo, se eu dei o meu máximo. Essa foi a última lição de vida que ela me deu mas é a mais inesquecível e eu nunca vou me esquecer. Você deve estar me achando doida falando isso mas eu precisava pois antes de dizer o que eu realmente preciso... Timothée eu te amo e eu quero muito ficar com você porque desde aquele dia eu me sinto completa, meus sorrisos se tornaram ainda maiores e eu achava que isso era impossível, meus dias se tornaram mais alegres e estranhamente mais emocionantes, então é isso... eu te amo."

E foi ai que eu simplesmente a beijei, nosso primeiro beijo que marcou o começo de uma vida inteira juntos e todos os dias eu a via ir até a varanda da nossa casa e sentar lá admirando o sol ir embora, todo dia eu me sentava com ela mas eu não admirava o por do sol e sim ela.
Ela era meu por do sol. A luz alaranjada batendo contra sua pele clara e iluminando seu cabelo o deixando loiro mesmo ela sendo morena e o cheiro de camomila que ela transpirava tornava tudo mais perfeito. Muitos anos depois ela adoeceu, era câncer, ela lutou bravamente mas a doença era mais forte e a venceu, antes dela partir eu a levei para casa e nós sentamos na varanda juntos, ela em meu colo com a cabeça apoiada em meu peito, assistindo o por do sol... O seu ultimo por do sol, ela aguentou firme até o sol ir embora e a lua começar a iluminar a noite, as ultimas palavras que saíram da sua boca foram "obrigada por essa vida incrível" e tão rápido quanto ela chegou, ela se foi. Eu chorei, chorei muito. Todos os dias enquanto eu via o sol se por eu sentia que ela estava do meu lado, segurando a minha mão e me mantendo firme.

Agora chegou a hora de eu me encontrar com o meu por do sol. Espero que está historia tenha lhe trazido alguma lição ou emoção e sempre lembre-se dias ruins existem mas dias bons também.

Atenciosamente Thimothée