Claire's Anatomy

Não acredito que havia sido convencida de ir numa festa durante a primeira semana de aulas do último semestre, o último! O mais importante! Mas claro que Geillis não se preocupava com isso, para ela a festa de boas vindas era um dos eventos sociais mais importantes da vida dela. Pelo menos naquela semana, já que ela frequentava todas as festas da universidade e fora dela. Ainda não conseguia entender como ela mantinha todas as notas tão altas como eu, aliás isso me deixava mais brava do que ela me arrastar para essa maldita festa.

Mas agora já era tarde demais para argumentar algo com a minha melhor amiga, estávamos dentro do táxi que nos levaria até o grande galpão afastado da universidade, onde a festa estava acontecendo. Falavam que era uma festa para dar boas vindas para os alunos novos, mas era apenas mais uma desculpa para todos beberem muito e fazerem besteiras. Não me julguem, também gosto de me divertir, também gosto de beber uma vez ou outra, afinal sou inglesa. Pelo menos na minha certidão.

Poderia me considerar uma nômade, vivi na Inglaterra parte da minha infância, mas quando meus pais faleceram num acidente de carro, meu tio veio ao meu resgate e, mesmo querendo me criar da maneira mais tradicional possível, sua profissão me levou para todas as partes do mundo. Tio Lamb era um arqueologista que gostava de explorar o mundo atrás de descobertas históricas. Posso confessar que no início eu só queria voltar para a minha casa e me trancar no meu quarto até meus pais voltarem, mas isso não era possível e com um tempo percebi que meu tio tinha a melhor das intenções, mesmo que de uma maneira bem diferente.

Por essa nossa vida tão diferente, meus estudos acabaram atrasando um pouco, não que fosse culpa do meu querido tio, mas por eu sempre querer explorar mais e mais o que esse nosso grande mundo tinha para oferecer. Só que um dia percebi que queria um lar, um lugar para ficar mais de um ano, um lugar onde pudesse criar raízes, fazer amizades fortes e duradouras, além de seguir a carreira que era o meu sonho desde sempre. Agora como que eu fui parar na Universidade de Edimburgo? Bom, isso é uma outra história.

Meu tio Lamb tinha recebido uma oferta da Universidade de Oxford anos atrás. Queriam que ele desse palestras sobre o seu livro para os estudantes do curso de História e qualquer outro aluno que se interessasse por artefatos egípcios e seus significados para a história do mundo antigo e moderno. Nunca havia visto Lamb tão animado para algo em anos! Ele estava cansado de viajar, de dormir em acampamentos e não conseguir me dar a educação que ele tanto queria. Mas era algo que ele nunca assumiu diretamente pra mim, então essa oferta veio como uma ótima oportunidade para finalmente termos um lar na cidade que nascemos.

Tudo estava ótimo quando nos mudamos. Comecei a frequentar algumas aulas para correr atrás dos créditos que precisava para finalmente ingressar na universidade como aluna do curso de medicina. E além de tudo, agora tinha uma casa, amigos e um namorado. Sim, isso mesmo. Namorar não era algo que planejava quando voltamos para Oxford, mas um professor de História fã do tio Lamb conseguiu fazer eu mudar de ideia. E foi por causa dele, Frank, que me fez estar aqui em Edimburgo, numa festa que não queria estar. Acho que já deu para notar que o namoro não foi bem sucedido como o resto das coisas da minha vida e por isso decidi recomeçar, do zero, em um novo país, uma nova cidade e uma nova universidade. E dessa vez sem romance!

- Claire! Sério mesmo que vou ter que te arrastar para fora do carro? – Geillis falou me tirando dos meus pensamentos.

- Você já fez isso pra me tirar de casa, obrigada. – respondi de forma sarcástica.

Saí do carro e segui minha amiga até a entrada da festa. Por mais que estivesse com raiva da Geillis por praticamente me arrastar para cá, não podia negar que ela era uma ótima amiga, mesmo com sua maneira totalmente não tradicional de amizade. Foi ela quem me acolheu quando cheguei em Edimburgo sem conhecer ninguém, mas não que tenha tido muita escolha, afinal fomos obrigadas a dividir um pequeno apartamento que era fornecido pela universidade. Só que ela, com seu jeito impulsivo e louco, me tirou do buraco emocional onde havia me enterrado quando descobri que Frank tinha me traído com metade da população feminina de Oxford. Bem, isso eu não sabia, mas era o que Geillis afirmava depois de ter contado minha triste história.