A Lua não sabe guardar segredo

A Lua não é ninguém

Eu disse à Lua que você é estonteante de todas as formas. Também segredei que seu riso é a coisa mais engraçada que já ouvi, mesmo que todos digam que é esquisito.

Falei também que você tem coragem,  força e lealdade. Sobre como não suporta ver injustiças e se envolve em problemas por sentir coisas demais e demonstrar tudo de menos.

Contei a ela como nos conhecemos por acaso, quando a moça da cafeteria trocou nossos pedidos e eu achei seus cabelos vermelhos muito mais interessantes do que a torta de morango que você recebeu em meu lugar.

Ela riu quando falei sobre sua tentativa desesperada de conseguir meu número com a cantada besta sobre "misturar o vermelho de seus fios com o azul dos meus e fazer roxo", - que deu muito certo, visto as borboletas que fizeram festa em meu estômago - apenas para descobrir que éramos colegas de bancada no laboratório de química da faculdade e estariamos juntos até o fim da graduação.

Eu também disse a ela como você ama qualquer coisa envolvendo música e seu talento para escrever canções. E admito que cantarolei alguns trechos das que você me mostrou, mesmo sabendo de seus pedidos para que não as revelasse a ninguém.

Mas a Lua não é ninguém, e duvido que me ouviram cantar aqui de cima.

Contei a ela que adorava o perfume que você coloca quando resolve sair, de modo que seus hábitos entregam facilmente sua rotina imutável. Sempre fazendo tudo igual, ainda que você não o perceba.

Em resumo, eu disse a ela tudo o que me lembrava a seu respeito. Todas as suas qualidades e defeitos e paixões.

Despejei tudo e, no final, admiti - talvez mais para mim mesmo do que para ela realmente - que te amava.

Ah, Song Mingi, eu te amava demais.

E disse isso a Lua, implorando para que não o contasse a ninguém.

Eu só descobri que ela não sabia guardar segredo quando te vi encarando o céu pela janela de seu quarto, em mais uma noite em que me acomodei ao lado dela para sussurrar-lhe minhas admirações por você.

Naquele momento, você olhou exatamente para onde eu estava, com uma emoção tão forte reinando em seus olhos pequenos que jurei que ultrapassaria as regras do mundo e conseguiria me enxergar.

Sua expressão era vidrada como quem tem uma conversa silenciosa consigo mesmo, enquanto a luz da Lua cheia fazia brilhar os cabelos que há anos já não eram vermelhos, mas brancos como a neve pura.

Então você abriu os lábios e começou a murmurar a ela tudo que outrora contei, mas pela sua visão.

Me envergonhei quando você disse que fui a primeira coisa que notou ao entrar na cafeteria, e xinguei porque você revelou que pediu para a garçonete trocar os pedidos para poder se aproximar de mim.

Gargalhei quando mencionou ter pensado que ia desmaiar quando aceitei te entregar meu número, mesmo após a cantada barata com as cores. E sobre como se trancou no banheiro da faculdade, quase tendo um piripaque ao descobrir que éramos colegas de bancada.

Também teve a audácia de dizer a ela que eu tinha uma cueca da sorte e que você costumava escondê-la quando eu ia te visitar.

Em certo ponto, você já não falava baixo, e sorria com a nostalgia de uma juventude que deveria demorar mais para passar do que somente aqueles poucos anos.

Fiquei surpreso quando até se arriscou a cantar alguns trechos de uma de suas canções, apesar de preferir o ritmo e poesia do rap.

E chorei quando falou que a havia composto para mim, ainda que nunca tivesse tido coragem para me dizer.

Você recontou toda a nossa história, de um ponto de vista que eu nunca conheci.

E no fim, ao invés de pedir para que ela guardasse segredo sobre seus sentimentos, me supreendeu ao desejar que ela me dissesse que você também me amava demais.

Então entendi que ela nunca havia mantido sigilo sobre nossas conversas, e te contara tudo o que lhe confidenciei.

Se indignou por, quando pudemos, não termos exposto o suficiente para o outro o quanto nos faziamos bem.

Ah, Mingi... Lua não sabe guardar segredo...