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Eu nunca chorei tanto quanto chorava naquele momento.

As lágrimas caíam dos meus olhos borrando o papel em meu colo, inclusive borrando marcas de lágrimas antigas, mas eu sabia que as lagrimas tinham significados totalmente diferentes. E Lili me olhava em silêncio no carro, ela sabia que eu precisava apenas chorar, apenas liberar tudo que eu sentia trancado em meu peito.

— Ela me amava tanto, e eu amava tanto ela. Porra, por que isso aconteceu comigo? Por que? — eu pedia entre soluços, desesperado, quase engasgando com as lágrimas.

— Eu vou buscar água e... Quem sabe vodca. Merda. — ela disse baixo, saindo do carro para ir até o pequeno posto do outro lado da rua.

Continuei chorando, obvio, meu peito doía tanto, tudo doía. Eu estava preocupada, com raiva, com remorso, triste, eu queria ela de volta, eu queria saber como ela estava, eu não dava mais a mínima para a droga do meu passado. Eu só precisava saber como ela estava.

Em alguns segundos batidinhas no vidro me assutaram, e quando olhei, era apenas uma senhora preocupada com uma garota maluca chorando dentro de um carro preto no acostamento de um estrada.
Depois de explicar três vezes que eu estava bem, recusar suas tentativas de pedir ajuda e conseguir à fazer ir embora, eu limpei meu rosto com as mangas da minha camiseta. Achei a situaçao irônica, pois eu realmente preciso de ajuda, mas ninguém pode me ajudar nisso.

Lili estava demorando, então eu decidi sair e ir até o posto também, quem sabe eu comprava alguns chocolates e me sentia melhor. Assim que entrei, a vi conversando com o garoto do caixa, ele sorria e ela também, acabei rindo baixinho e passei por ela, indo direto à sessão de doces, precisava de algo para me fazer esquecer dor do meu peito e se tinha uma coisa que fazia isso muito bem, com certeza era a droga do chocolate

— Eu geralmente como os de amendoins, além de deliciosos eles enchem mais, e algo me diz que eles são seus preferidos. — uma voz soou ao meu lado.

Assim que me virei confusa como alguém que acabou de receber uma prova de matemática, acabei sorrindo surpresa como se tivesse com uma nota boa nela, vendo a silhueta tão bem arrumada de Heyoon ao meu lado. Ela segurava o celular mostrando a mensagem de Lili, avisando que precisava dela comigo agora, e eu acabei fazendo um bico, pronta para voltar a chorar, mas sabia que eu não podia fazer isso na frente dela.

— Estava chorando, não estava? Ou melhor, ainda está. — Eu apenas consegui assentir antes de desabar novamente, desta vez nos braços de Yoon.

Heyoon era absurdamente confortável, e seu cheiro nunca havia mudado, cheiro de lar, de segurança, e ela sabia disso, pois me apertava o suficiente para transmitir um sincero "eu estou aqui". Ela sempre esteve aqui por mim, desde nossos anos juvenis até hoje em que é uma adulta e eu... uma tentativa falha de vida.

(...)

— Você nunca me contou isso... Se eu soubesse, eu teria ajudado. — seu tom de voz intercalava entre decepção e mágoa.

— Me desculpa, eu tinha medo que ela me machucasse também.

Após passar três horas sentada ao lado de Heyoon na areia da praia, a contando sobre a professora Savannah e tentando arranjar coragem para contar das cartas, eu conseguia me sentir melhor. Pelo menos um pouco.

A real história por trás de nós, era que, naquela época, Heyoon Jeong era apenas uma garota mais nova que pela inteligência conseguiu estudar numa turma à frente das garotas da sua idade, conhecendo Sofya, a típica popular diferentona que não ligava para a fama que tinha. Cogitamos a ideia de nos apaixonar naqueles anos, mas nossa amizade era tão boa, que nem mesmo uns beijos embaixo da arquibancada conseguiram nos tornar mais que boas amigas. Então ela conheceu Sina, e eu... vocês já sabem.

Tentava me lembrar de como conheci Lin, mas a única coisa que vinha na cabeça era um site idiota de relacionamento virtual, eu nunca a vi, isso eu tinha certeza absoluta. Eu nunca vi Lin na minha vida, nem sequer em meus sonhos.

— Está brava comigo? — a pior coisa que eu poderia desejar era Heyoon brava comigo.

— Não, tudo bem. Eu escondi coisas de você também.

A olhei confusa, meus olhos brilharam por um segundo torcendo para ser algo sobre o que meu coração tanto aclamava, mas Heyoon contou uma história idiota sobre ter transado com um ex namorado meu quando estávamos na festa de férias de verão do Bailey. Acabei rindo e lhe dando alguns tapas, tentando me lembrar daquela época.

— Bailey... — vagas lembranças da carta em que li, onde minha suposta namorada dizia sobre um boato em que Bailey espalhou sobre mim me veio à cabeça, me fazendo questionar: — O que aconteceu com ele?

Ela pensou um pouco, suspirando enquanto pegava o celular e abria alguma rede social que não me dei o trabalho de identificar. Mostrou um perfil e lá estava, Bailey May. E porra... Não sei o que ele fez comigo, mas sei o que eu gostaria que fizesse.

— Uau, ele tá bonito. — disse com um leve sorriso, lembrando o quanto ele sempre foi bonito.

— É... Você se lembra dele? Do que ele fez? — o tom de voz de Yoon nunca me enganava, ela sentia um certo rancor.

Neguei, não sabendo se queria mesmo lembrar, estava cansada de descobrir as drogas que fizeram meu passado ser o que era, ou melhor, as pessoas que o fizeram. Mas ao mesmo tempo fiquei curiosa, já que o suposto boato deixou Lin tâo irritada, talvez fosse alguma bobeira que a deu ciúmes.

— Você apareceu com uns chupões no pescoço uma vez na aula, e ele disse que vocês acabaram se divertindo até demais no banheiro do Starbucks. Você acabou sendo chamada de Expresso Especial por quatro semanas e até fizeram umas montagens... Criancice. — contou, fingindo rir para não parecer algo tão grande, típico dela.

— Nossa, isso é uma merda. — fiz uma careta e a olhei irritada — Ta rindo por que?

— Porque você deu um soco na cara dele depois, foi tão legal. Ele ficou sem ir pra escola até o olho dele voltar ao normal e todo mundo ficou quieto, com medo de apanhar também. — Yoon ria debochada. Acabei sorrindo, me permitindo rir alto e me gabei por ser uma baixinha forte, esquecendo todos os lados ruins dessa história por um tempo.

Comecei a me sentir realmente melhor, lembrar do passado, das tardes que passava com Heyoon. Tudo era ótimo até ela conhecer Sina. Não que Sina seja um problema, mas acho que comecei a me sentir sozinha quando elas começaram a namorar, ainda mais por saber que Lin estava doente, talvez fosse por isso que tantas coisas bobas me afetavam de uma forma realmente grande.

— Eu senti tanto a sua falta. — ela confessou, me olhando de relance enquanto seus dedos tocavam a areia da praia.

E ali, vendo as ondas quebrarem na superfície, o céu nublado, a brisa gelada, as gaivotas fazendo aquele barulho irritante e gostoso ao mesmo tempo, eu o olhei com um sorriso.

— E eu senti a sua.

10881- SoflinOnde histórias criam vida. Descubra agora