A História por detrás da História
Era uma vez uma família: uma mãe, um pai, um rapazinho como Teddy e um outro rapazinho que não passava de um bebé. E era uma vez um dia de neve. E uma viagem de carro. E um misterioso acidente de carro. E uma tragédia incomensurável.
Era uma vez um membro dessa família que aguentou um pouco mais, embora quando as notícias chegaram até mim, que estava no campo, no estado de Nova Iorque, a devastação já fosse total. Contudo, a tenacidade desse rapazinho, seguida da sua rendição, nunca mais me deixou. Será que esse rapaz sabia o que havia acontecido ao resto da sua família? Será que escolherá partir com eles?
Era uma vez uma família de quatro, cheia de vida. E que, depois, deixou de existir. Aquilo que ficou em seu lugar foi o desgosto. O meu é o de muitas outras pessoas.
Mas aquilo que também ficou foi algo que não consegui compreender plenamente, do fundo da minha mágoa. À medida que vários amigos, vindos de todo o país, se reuniam de forma espontânea para um velório ad hoc na cidade de Oregon, onde os nossos amigos tinha vivido em tempos, enquanto lambíamos as nossas feridas e nos deixámos mergulhar de cabeça na nossa perda, senti uma clareza, uma orientação, uma bússola moral. Como iria aquela tragédia mudar-nos? Como iríamos nós mudar-nos a nós mesmos? Como poderíamos fazer frente àquela situação; não só das suas mortes, mas também das nossas vidas? Quando a tristeza começou a tornar-se dilaceraste, quando senti uma profundidade em termos de mágoa que nunca antes conhecera, descobri algo que me pareceu divino. Será que os nossos amigos acabados de partir olhavam por nós? Seria isso Deus?
É claro que aquela dor transcendente não dura para sempre. As trevas descem sobre nós, a atrocidade da perda por que passamos não deixa de nós surpreender. Mas a vida normal continua, sem parar, e, aos poucos, a nossa perda vai normalizando, vai-se integrando na vida de todos os dias até que, três ou cinco anos depois, descobrimos que estamos bem, mudados, mas... mas que ainda somos capazes de ouvir as vozes dos nossos amigos, de contar histórias sobre eles, de pensar neles todos os dias. E que ainda ponderamos sobre questões relacionadas com eles,momo se um deles tivesse optado por morrer ao descobrir que toda a sua família havia sido eliminada da face da Terra.
Foi no meio desse nevoeiro que um dia, quase sete anos depois, uma estranha me apareceu na cabeça. O seu nome era Mia. Tinha 17 anos e tocava violoncelo (o que para mim constituía uma novidade, pois não sabia nada sobre violoncelos é muito pouco acerca de música clássica). Mia não tinha qualquer espécie de relação com as pessoas a que me referi. Porém, assim que a conheci, percebi que ela iria levar-me numa viagem, ao longo da qual me responderia à questão que vivia em mim há tanto tempo: O que farias se tivesses de escolher? Quando comecei o livro, não sabia qual iria ser a resposta de Mia; sabia apenas que apenas ela à poderia dar, com base na vida ficcional que ela é eu estávamos a criar em conjunto.
Muitas pessoas me perguntam se escrever o livro foi um processo demasiado emotivo ou difícil. Foi emotivo, sim. Escrevi através de um muro de lágrimas. Mas isso é o contrário de difícil. Uma parte dessa graça transcendente dos dias após a tragédia regressou a mim. Talvez tal se devesse ao facto de estar a criar personagens que eram de certo modo baseados em amigos eu adorava, de tal no seu mundo. Era como se todos eles estivessem na sala em que eu escrevia.
E, de certa forma, estava, mesmo. De certa forma, nunca me tinham deixado. E, no fundo, a questão é esta, não é? É assim que conseguimos sobreviver à perda. Porque o amor nunca morre, nunca se vai embora, nunca esmorece, desde que não o deixemos partir.
O amor pode tornar-nos imortais.
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Se Eu Ficar
RomanceNaquela manhã de Fevereiro, quando Mia, uma adolescente de dezassete anos, acorda, as suas preocupações giram à volta de decisões normais de uma rapariga da sua idade: permanecer junto da família, do namorado e dos amigos ou deixar tudo e ir para No...