Prólogo

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Maria, assim como todos os dias da sua vida, estava fugindo. Acabara de roubar um saco de tâmaras de uma venda. E, como sempre, os guardas estavam atrás dela. Ela pulava barris, derrubava caixas e pulava muros a fim de despista-los. Alguns minutos de correria pelas lages da noturna Paris e ela já havia despistado os guardas e estava de volta em seu esconderijo na parte pobre da cidade.

Mal chegara lá e sua gata, Genevieve, já estava lhe dando as boas vindas esfregando-se em seus pés. Maria agradeceu a gata acariciando sua cabeça e repousa em um sofá que fora jogado fora por alguém que não o queria, mas que foi achado por Maria, que fez dele sua cama. Genevieve sobe em seu colo e se mia, ansiando por comida.

– Você cuidou bem da casa? – pergunta Maria à Genevieve, que por sua vez mia em resposta – Muito bem, então aqui está.

Diz Maria, oferecendo um punhado de tâmaras à gata, que aceita de bom grado. Maria se levanta do sofá e coloca água fresca no pote de sua gata antes de pegar para si. Ela come um par de tâmaras e olha para Genevieve sobre o sofá, já terminara de comer suas tâmaras e estava deitada. Ela admira a beleza de sua gata branca, cujo pelo já começava a parecer cinza por viver sempre suja. Suas orelhas, porém, eram pretas, juntamente com a ponta de duas de suas patas e de seu rabo.

Após alguns momentos admirando sua gatinha, Maria sobe pela escada de mão que levava para o topo do prédio abandonado no qual seu esconderijo ficava. Maria gostava de ir ali e admirar a noite estrelada. Fazia-a esquecer que era pobre, esquecer que talvez amanhã a comida acabe. Era o céu estrelado que todos viam. Tanto ricos quanto pobres, tanto os felizes quanto os tristes, tanto os corações apaixonados quanto os corações partidos: todos viam o mesmo céu noturno. Não importa o que você tem. Só importa que o céu está lá, para quem quiser ver. Isso era a maior prova de que só nós podemos nos fazer felizes. O céu era a melhor coisa na vida de Maria, com exceção de Genevieve, é claro.

Ela olha para o céu quando vê uma estrela cadente. Como ela sempre ia para o telhado elas já não deveriam ser novidade, mas Maria ficava simplesmente encantada com cada uma delas. E sempre que via uma, sempre fazia o mesmo pedido:

– Estrela do céu, me de o que meu coração deseja. Me dê uma chance de provar o meu valor. Me dê uma chance.

Ela não pedia riqueza. Ela pedia a chance de tentar se tornar rica sozinha. Ela não pedia um amor para sua vida. Ela pedia a chance de encontrar esse amor sozinha.

– Qual é a graça se nós ganhamos tudo pronto na mão? – dizia ela, para sua própria gata quando discutia o futuro consigo mesma – temos que nos mostrar dignos daquilo que queremos.

Ela fechou os olhos por um segundo e inspirou a brisa noturna. O cheiro de perfumes de madames que passavam de carro por aquela parte da cidade sem nem olhar pela janela se misturava com o cheiro dos pães que eram assados durante a madrugada para alimentar os trabalhadores que acordavam cedo. Maria sentiu o sono chegar e desceu para junto de sua gata, que levanta a cabeça em resposta ao barulho da velha escada de ferro.

– Me desculpe, Genevieve.

Pediu Maria, se aproximando do sofá e colocando Genevieve no seu colo e começando a se deitar no sofá duro. Não era a melhor forma para dormir, mas era melhor que o chão, já que não era tão frio. Ela puxa um cobertor esburacado e se cobre, enquanto a gata se ajeita numa almofada que lhe fora designada. Pouco tempo depois elas já estavam adormecidas, mergulhadas em seus sonhos de mundos diferentes. Mundos nos quais elas não tinham preocupações. Mundos nos quais elas poderiam viver bem, já que felizes elas já eram no mundo real, mesmo morando em um prédio abandonado. Elas tinham uma a outra, e é isso que importava.

~♡~

Não muito longe dali, uma outra alma solitária se apoiava no batente da janela de sua luxuosa mansão, com um gato preto de focinho branco aos seus pés. Por trás de sua espressão monótona em sua mente pairava a tristeza.

– Ah, Felix – suspirou para ao gato em seus pés – A vida é injusta às vezes. Por que meu pai e meu tio ficam me pressionando a casar logo? Só tenho dezessete, ainda é muito cedo.

O gato mia, fazendo Elise pegá-lo no colo e levá-lo até sua cama para o acariciar. Ela se sentia solitária, mesmo com as dúzias de empregados em sua casa. Só porque há pessoas ao seu redor não significa que elas estarão ao seu lado sempre. A única amiga que Elise realmente tinha era Charlotte, a sua antiga babá, que agora era a encarregada de limpar seu quarto. Embora ela tenha tudo que alguns sempre sonharam o que ela mais inveja é a felicidade de algum, as pessoas de classes mais baixas, que não vêem o tanto de dinheiro que elas tem como o limite para sua felicidade. Pessoas como Maria, qual ela nem conhecia.

Em meio aos seus devaneios olhando pela janela ela vê uma estrela cadente. Não via uma fazia muito tempo, e, muito embora não acreditasse na mágica da estrela, ela juntou suas mãos e fez um pedido naquela noite em especial.

– Estrela que brilha no céu, realize meu desejo. Me dê alguma razão pra viver além de me casar com alguém. Por favor.

Ela abriu os olhos lentamente e ficou olhando o céu noturno até ser despertada de seus pensamentos por um miado agudo.

– Está bem, Felix, você pode dormir na minha cama hoje.

Após ouvir isso o gato se animou e começou a se esticar na cama e rolar, como um cão. Elise riu e se deitou, cobrindo-se com seus grandes e quentes cobertores. Felix se aconchegou perto de sua barriga e logo pegou no sono, diferentemente de sua dona, que ficou pensando em como fazer seu pai esquecer o casamento. Como não obteve sucesso, achou que o melhor a fazer era copiar o seu gato e dormir. E assim o fez.

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⏰ Última atualização: Jun 20, 2020 ⏰

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