"Mamãe dizia que ele tinha a cor do mel nos olhos e na pele seus reflexos dourados, nos seus cabelos, morava o brilho do sol onde ninguém além da menina da casa cor-de-pêssegos podia tocar..."
Assim como as estrofes coloridas bordadas num poema de versos brancos, Jeon Jungkook era o garoto que, lido por qualquer um, jamais faria sentido, jamais teria beleza oculta por descobrir, jamais seria visto com bons olhos por qualquer gente que flagrasse o jovem fazendo suas caminhadas noturnas ou fumando um cigarro barato no telhado quando eram seis e quinze da tarde, horário em que no céu, é tecida toda essa romantização que costuma-se ver nos livros e filmes por aí sobre a noite e as estrelas.
De toda a turma do bairro da rua Treze, ninguém se atrevia a falar com o garoto da casa amarela, ninguém ousava arriscar tocar com os próprios olhos a faísca do seu olhar brilhante de mel.
-Achávamos que ele não falava nossa língua.- dizia mamãe- Quando ele se mudou pra cá eu o ouvi conversar com a família nesse idioma que não conhecia, até que meus pais disseram uma semana depois da chegada deles, à mesa do café da manhã: "Nossos novos vizinhos são coreanos, não é incrível? Vamos todos dar boas vindas à eles esta tarde, chamar para um café, sim?". É claro que naquela tarde eu não ficaria em casa pra um café, e por coincidência, Jeon também não estaria lá atendendo ao convite.Ele tinha apenas dezessete anos, assim como minha mãe. Ele certamente colocaria uma jaqueta de couro, sapatos legais, usaria seu melhor perfume e iria tentar se enturmar nalguma discoteca. Era isso que minha mãe pensava.
-Naquela tarde, eu sabia que não poderia sair pela porta da entrada, afinal, meus pais me veriam e iriam me obrigar a receber as visitas, tomar café e comer bolinhos sem recheio, e eu queria é ir pra 'disco' que teria na rua Vinte, minhas amigas estariam me esperando na calçada. Disse aos meus pais que estava com cólica e logo me deixaram em paz no quarto, pude me arrumar para mais uma noite.
Ela atravessou as cortinas brancas e lá da janela, pôde ver suas três amigas esperando ela na calçada do outro lado da rua, acenando, sorrindo, jovens pondo tudo a perder.
Mas como mais um detalhe além do pôr-do-sol laranja daquele fim de tarde, inesperadamente lá estava Jeon, aos últimos reflexos do dia, no telhado de sua casa.
- Claro que me assustei. Quando eu pulava o batente da janela e o percebi ali, numa distancia de no máximo dois metros, nossos olhares se cruzaram por uns segundos que se eu dissesse-lhe filha, que foram breves, eu estaria deixando muita descrição de lado. Ele tinha a cabeça apoiada na mão, sim, ele usava uma jaqueta legal, tão legal que não vi mais ninguém pela cidade que tivesse uma jaqueta parecida com a de Jeon; tinha o olhar triste, sério, impenetrável. Não troquei uma palavra com ele, as meninas quase gritavam meu nome do outro lado da rua e eu não poderia ser pega de jeito nenhum, fechei a janela com cuidado, e quando vi já estava correndo pelo gramado e rindo com minhas amigas no fim da rua.- Acredito que o fato de mamãe ter demorado para contar sobre Jeon, consiste em ela achar que naquela época, todos aqueles jovens, incluindo ela própria, não eram um exemplo a se seguir, não tinham moral pra serem contados como historinha pra criança antes de dormir.
Ela mal sabia o nome dele, mas disse que quando voltou pra casa aquela noite, pensou no seu vizinho que depositava tantos sentimentos no sol que se esvaia atrás do dia.
-Ele talvez até fosse sair aquela noite. Estava bem arrumado, tava na cara. Mas desistiu. Era isso que eu pensei, claro. Ele era um garoto estranho, muitas vezes o vi no telhado sem fazer nada, talvez olhava pro céu, talvez esperava alguém, talvez quisesse ficar sozinho, ou quem sabe nada disso. Ninguém nunca descobriu Jeon ...
(...)
Uma vez ouvi vovó Isabel dizer que aqui em casa, onde o que agora é uma garagem com portão e tudo, antes era um jardim de entrada, desses que acompanha com pedrinhas de brilhantes o ladrilhinho até a porta de maçaneta dourada. E visualizando o cenário descrito, é possível perceber que vovó teve um carinho enorme por esse jardim que não fora cultivado nem preservado; ela contava como quem sonhava, sobre as flores que cresceram esbeltas na primavera e a amoreira plantada perto da caixa branca de correspondências, mas havia uma espécie de rancor em seu olhar ao falar da grama verdinha e seus reflexos d'ouro:
-Aquele moleque atravessava meu quintal toda noite, parecia que tinha pressa de viver! pisava na grama esmagando as plantinhas 'tudo'! Eu sempre acordava em plena madrugada com o barulho dos seus passos frenéticos, mas, ele mesmo, estava sempre silencioso. Na verdade...lembrando bem...teve um dia que o ouvi rir alto, ele não corria sozinho pelo gramado não, não daquela vez.
(...)
-Ninguém nunca descobriu Jeon...- mamãe dizia- a não ser, é claro, pela garota da casa cor-de-pêssegos.
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❛Honey Boy!❜-Um Comentário a Respeito de Jeon 🌻🍯 ❴ONESHOT❵
Fanfiction"Essa é uma narração sobre o menino que um dia morou na casa vizinha, a do portão azul e paredes amarelo-ocre, o garoto que ninguém nunca se deu ao luxo de entender, sobre alguns boatos que "deslouvaram" seu nome, e sobre o que talvez tenha sido seu...