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O sétimo baile | 15 dias para o apocalipse

Sempre odiei bailes de último ano. Nas últimas duas décadas estive em seis deles e posso garantir que nenhum foi muito diferente do outro, assim como minha experiência nos colégios que os hospedaram. É uma das desvantagens do meu envelhecimento ainda não ter me alcançado, ainda pareço ter dezessete anos e, se eu quiser que meu pai leve a vida que ele quer viver, preciso seguir algumas regras.

— Ei. Lucien. Você vem hoje à noite? — Escuto o sussurro quase gritante vindo do garoto do meu lado. Ele, definitivamente, não queria que a responsável pelo comitê de eventos nos pegasse falando de algo que não fosse iluminação naquele momento. Luke sabia o quão assustadora sua irmã podia ser e não queria derramar a gota que faria a taça de tensão transbordar.

— Estudando.

Eu não sussurro de volta e recebo um olhar de quem está sendo repreendido. Como se eu também devesse ter medo da irmã dele. Dou um pequeno sorriso com a ponta dos lábios e reviro os olhos. Ele se aproxima.

— Você? — pergunto sem grandes intenções.

— Cassie está fora da cidade, ela volta em tempo pra prova final e pra formatura.

— Não havia notado que ela não veio hoje.

Era mentira. Eu havia sorrido por toda a manhã por causa disso, mesmo sendo algo quase inteiramente prejudicial e desrespeitoso. Não me envergonho.

— Mas por que você não vem? — insiste ele.

— Eu lhe disse, tenho que estudar.

Foi a vez dele de revirar os olhos.

— Você vai se formar com honra, todas as suas provas tiveram A no último semestre. Qual o real motivo?

Eu queria poder dizer pra ele o real motivo. Dizer pra ele que enjoei de bailes de formatura muito antes de começarem a existir sistema de prostituição entre os garotos para conseguirem pares. Mas não posso, isso traria perguntas. Não gosto de muitas perguntas.

— Não tenho par. Por que esse caralho não acende?

Enquanto focava na caixa de fios que servia para acender todas as lâmpadas do ginásio, senti os olhos de Luke vidrados em mim. Odiava quando ele fazia isso. Isso tornaria tudo mais difícil.

Quando a formatura acabasse, meu pai e eu iríamos embora. Eu gostaria de ir pra faculdade com Luke. Conseguir uma vaga lá, no mesmo dormitório que ele até — embora eu tenha certeza que ele irá alugar uma casa — não seria difícil. O real problema estaria em não ter sequer um pêlo facial crescendo pelos próximos cinco anos. Rugas de expressão, olheiras, nem mesmo uma manchinha, nada. O problema estava nisso.

— Acho que você deve conectar o cabo azul também. — disse ele. Estava errado. O cabo azul conectado àquela caixa me faria levar um choque que poderia me fazer parar no hospital. Claro, se eu fosse humano.

Quando conectei o cabo azul, todo o ginásio se acendeu. Luke sorriu orgulhoso de si mesmo e não pude evitar sorrir de volta. Ele tinha o melhor sorriso que já tinha visto, eu já vi vários sorrisos. Por um sorriso como esse, vale a pena trapacear um pouco.

— Você estava certo. — Levantei do chão e passei as mãos pela calça, afastando toda a poeira. Isso havia sido bom para mim também, poderia ir pra casa cedo. Quão mais longe eu ficasse e por quanto mais tempo, melhor.

Se existia algo que eu entendia era um destino planejado. Por mais que eu odiasse, Luke e Cassie estavam noivos, mesmo com tão pouca idade, consequência de uma gravidez inesperada. Eles iriam pra mesma faculdade e se casariam. E eu iria pra outra cidade, nunca mais poderia vê-lo.

— Mas como assim você não tem par?

Nós iríamos voltar para o assunto quando enxergamos uma figura feminina correndo em passos minúsculos, de forma quase histérica, em nossa direção. Alissa estava encantada e com as mãos na boca, puxou à mim e seu irmão em um abraço e fez um barulho com a boca fechada que parecia com um "hm..." bastante agudo.

— Eu amo vocês! Ficou perfeito. — elogiou, desfazendo o abraço e olhando ao redor mais uma vez. Era a primeira vez que ela elogiava algo ou alguém em semanas, isso, a repentina demonstração de afeto, que era assustador pra mim. — E então, Lucien, devo te esperar na recepção hoje?

— Claro que sim. — Luke respondeu por mim e eu o encarei sem entender. — Ele é o meu par.

Filho das TrevasOnde histórias criam vida. Descubra agora