AUTODESTRUIÇÃO

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POR UM DESLUMBRE. Apenas por um breve deslumbre, pude sentir o arrependimento ser domado em meio ao caos. Pude sentir minha alma fluir por entre o desespero. Me permito fechar os olhos em decadência de meu último suspiro. Apenas dois passos incertos para o fim do início. Apenas uma escolha para a destruição. Fora minha escolha. Minha vez.

Sinto-me culpada por tal ato. No entanto, a ansiedade me corrompia de maneira exorbitante. Não havia mais nada. Minha essência se fora, junto a dor.

As lágrimas involuntárias deslizavam por minha face cansada.

Suspiro, sinto o ar percorrer pelo meu corpo pela ultima vez. A adrenalina não corresponde ao arrependimento. Antes, eu me remoía por não viver, hoje, sinto repulsa de ainda estar viva. É estranho pensar que tudo tem um propósito, quando ele justamente o leva a morte. Não estou tirando minha vida pelo simples fato de não querer viver, apenas espero que a dor passe.

Automutilação não se compara a dor emocional. Cargas e mais cargas de ansiedade a toda hora me guiaram até beira do penhasco. Cabe a mim escolher o que fazer por diante. Não estou fazendo a melhor escolha — e disso eu tenho a mais pura certeza —, mas, a este ponto, nada mais importa. Ninguém nunca irá compreender o que se passa em minha cabeça. Nem eu mesma entendo.

Sorrio fraco quando resolvo caminhar apressadamente em direção ao parapeito da varanda. Décimo andar. Minhas mãos calejam. A dor irá passar.

A dor irá passar.

Meu olhar é vacilante, contudo, direciono minha atenção para a carta que deixara sobre a mesa, ao lado de uma rosa vermelha.

Não espero que ela entenda o porquê de ter posto uma rosa ao lado da carta.

Deixei-a apenas como uma mensagem antes de partir.

Estou preparada para ir.

Estou submersa no mar de cargas emocionais por muito tempo.

Sinto muito, mamãe. Sei que não era esse o futuro que esperava pra sua filha. A garota antes sonhadora e cheia de objetivos. Meu único objetivo neste momento não é bem para o meu futuro.

Mais um suspiro.

Elevo minha ânsia, cerro os meus punhos. Subo sobre o parapeito. Apenas um ato para o declínio. Viro-me de costas. Hoje é um belo dia para morrer.

Assusto-me quando ouço a porta de meu apartamento ser destrancada. Era ela.

— Eu te amo, mamãe — foram minhas ultimas palavras, quando, por fim, deixei que meu corpo fosse jogado contra a correnteza de emoções.

Vi-me caindo do décimo andar. A pressão e velocidade que meu corpo sentia no momento fora temporária. Outra lágrima resolve escapar de meus olhos profundos. Posso ouvir, ainda de longe, em queda, os gritos e súplicas de minha mãe. Não estarei lá para cuidá-la.

Não imaginei que essa seria minha morte. O meu fim. Meu corpo, fraco e perto de estar sem vida, não reage mais como antes. Sinto os meus ossos sendo quebrados por tamanha queda.

Esses foram os meus últimos momentos antes de partir. O oceano resolve levar o meu corpo consigo. Queria que isso acontecesse. Posso descansar em paz, agora. Não há mais dor, não há mais ansiedade. Levo comigo o fardo de ter sido fraca. Fui apenas mais uma em meio as almas perdidas.

Como um passe de mágica, sinto afundar-me ao mar. Pestanejo, permitindo que todo o ar que me resta vá embora.

Um.

Dois.

Três.

Quatro.

Cinco.

Cinco minutos fora o suficiente para minha alma ser liberta. Não há mais como voltar. Não há mais como me arrepender. Estou livre.

Em meio ao mar, meu corpo se fora. Minha alma está livre.

É libertador. Não sinto nada.

DECLÍNIO [CONTO]Onde histórias criam vida. Descubra agora