A lembrança do que poderia ter sido

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Ela caminha por toda a casa que construiu observando os seus detalhes. Cada tijolo ligado por um cimento de histórias. Dias, que ela passou sem julgar apenas vivendo. O seu esforço para não pensar no que seus sentimentos lhe diriam em seguida, já que os seus dedos não saiam do teclado, sempre a pressionar uma história que poderia ter acontecido.

Sua memória não julga pela música que ouve, nem muda a sintonia de seus sentimentos que gritam entre as veias. Apenas busca lembrar da história que teve e as tardes em que brincava e criava. Não parecia ser algo tão perigoso, apenas em seu quarto já estava segura para cometer os próprios erros e não ter medo do que a julgaria depois.

A notificação que chegou traz lembranças que ela já deveria ter esquecido. Por isso, nesta noite fria, enquanto caminha pela casa, ela se envolve em um cobertor e carrega uma taça de vinho que há tempos não via. Era quase como decoração. Era inimaginável escrever algo como aquela cena em que suas lágrimas se misturavam com o doce e seco vinho. Sua maquiagem feita para o trabalho desmanchava em seu rosto e escorria por seu pescoço, enquanto ela se recusava a secá-las.

Era como se quisesse se sentir de verdade por algo, e não somente os estímulos de um algo. Deixou na mesa o celular com a notificação e via a sua sala com a pouca iluminação. O sol já não estava presente naquela noite escura, em que só esperavam os ciscos do céu em meio ao peito cheio de histórias do que nunca aconteceu. Apenas ela sabia de seus sonhos e desejos guardados e imersos em toda a profundidade de sua espera. Sem nenhum retorno até esta notificação.

O que era de se esperar, apesar de não simples de se aceitar era que um dia essa notificação chegaria, cedo ou tarde, mesmo com a covardia. A verdade era o destino e ele seguiria, assim como ela. Apesar de se arrepender a cada passo e a cada batida de coração, ela não mais derrama lágrimas pelo fato. Sua camisola preta rendada já se encontra encharcada no peito pelo choro do fim daquela tarde. Não há muito o que ela espere agora, apesar de olhar para a sua sala como se buscasse uma resposta. Talvez fosse pela saudade saudosa, talvez pelo arrependimento sufocado.

Mas nem tudo é para sempre, pode ser que o amor não seja como eles esperam, talvez nunca seja a ser como era com ela. Assim o tempo haveria de passar e retornar ao mesmo ciclo, que desta vez, ela poderia não estar mais sozinha, o que não impediria um simples e cuidadoso arrependimento no peito. Haveriam de se encontrar um dia sós novamente?

Se este fosse um de seus objetivos, não teria deixado passar as pequenas oportunidades, não deixaria perder o contato e o diálogo e teria sempre o número em mãos. Mas se o universo assim quisesse, iriam se encontrar em alguma esquina, poderiam se esbarrar na fila de um supermercado, ou embarcar em um mesmo avião. Assim nunca foi por quase dez anos, então não parecia ser mais uma opção de futuro.

Ele deixou de tentar, assim como em um momento ela deixou de esperar e seguiu o seu destino, construiu a sua vida e encontrou a própria felicidade que agora passa a cada centímetro um olhar angustiado com o medo do destino encontrado. Há anos, quando ainda se conheciam, ela teria pensado que de tudo o que era o amor, para ela não seria. Não fazia parte de seu destino o compartilhar uma vida, porque encontrava em sua personalidade o mais alto grau de independência.

Assim o que era forte é visto como fraco e a mente vaga em busca de suas respostas e definições que possam ser aceitas, enquanto o coração pulsa desesperadamente pelas resoluções do passado. Já não é mais uma opção.

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⏰ Última atualização: Jul 02, 2020 ⏰

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29 dias de Escrita CriativaOnde histórias criam vida. Descubra agora