capítulo 6

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Eu conto a história para Lauren escondendo os detalhes mais íntimos, porque duas latas de cerveja estão longe de serem o suficiente para que eu me abra tanto para uma garota que acabei de conhecer.

Ela me interrompe algumas vezes para fazer comentários excelentes como "Em algum ponto da vida, literalmente toda Lésbica vai ter a vida destruída por uma mulher", ou "Ela estudava cinema? Isso já era um sinal de que não ia dar certo"

ou um simples e direto "Filho da puta!".

Em nenhum momento Lauren parece ter pena de mim. Ela parece se

solidarizar, claro, mas na maior parte do tempo ela sorri como se estivesse

orgulhoso da pessoa que eu me tornei. Não sei se é exatamente isso que ela

pensa, mas, contando essa história pela primeira vez depois de tanto tempo,percebo que esse é o jeito como eu me sinto. Sinto orgulho de ter sobrevivido a Hailee.

— Agora é a sua vez de falar, pelo amor de Deus. Eu não aguento mais o som da minha própria voz — eu digo.

— Bem, a minha história também é meio dramática, não sei se você está

preparada.

Eu apoio a cabeça sobre os joelhos dobrados, tentando arrumar uma posição confortável, e olho fixamente para Lauren, mostrando que estou totalmente preparada para o drama.

Assim como eu, ela também bebe um longo gole de cerveja antes de começar.

— Eu ainda morava com meus pais no Maranhão quando a One Direction anunciou o
último show. A minha vida estava uma bagunça, eu não tinha ideia de como
seria o meu futuro e a minha relação com a minha família nunca foi das melhores. Mas, assim que anunciaram os shows, eu botei na cabeça que viria para São Paulo de qualquer jeito. Comecei a fazer de tudo pra juntar dinheiro.

Literalmente tudo. Desde trabalhos como designer para algumas lojas da minha cidade, até animação em festa infantil.

Eu dou uma risada.

— Na época estava fora de cogitação falar para os meus pais que eu sou lésbica.

Minha família toda sempre foi muito religiosa e eu tinha certeza de que ia morrer sem sair do armário.
— Ela olha para o chão e ri de si mesmo — Até parece, né?

Eu abro um sorriso porque depois de tanto tempo consciente da minha

sexualidade, isso deixou de ser a coisa mais importante sobre mim.

Se essa conversa estivesse acontecendo com a Camila de dezoito anos, ouvir alguém falando que é lésbica em voz alta me causaria calafrios de empolgação por

encontrar uma pessoa como eu. Hoje é tudo tão natural que em nenhum momento eu imaginei que Lauren poderia ser hétero. Para ser sincera, eu sempre parto do pressuposto de que ninguém é hétero porque gosto de esperar o melhor das
pessoas.

— Mas é claro que meu segredo não ficou a salvo por muito tempo.

— Eu estava esperando por isso — eu digo. —Não de um jeito cruel, claro! É só que você disse que ia ter drama, então eu meio que deduzi.
— Pois você está certíssima — Lauren diz, fazendo um cafuné rápido na minha cabeça sem nenhum aviso prévio, o que, obviamente, faz com que eu derreta um
pouquinho por dentro.

— Na época, mesmo trabalhando muito, —
ela continua — eu sempre arrumava tempo para me dedicar a uma coisa. Tá, é meio ridículo, você vai rir de mim.

— Lauren, eu estou passando a minha madrugada sentado no chão para

conseguir um ingresso para ver 5 caras de 30 anos cantando música teen. E provavelmente vou parcelar esse ingresso em três vezes. Eu não estou em posição de ridicularizar ninguém.

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