3. As muitas e diferentes dores

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– Acho melhor você lavar o rosto. – O hálito de Noah bate contra o meu rosto. Só não consigo sentir o cheiro por causa que meu nariz está entupido de tanto chorar.

– E eu acho melhor você voltar para as piscinas. – Ele permanece parado à minha frente.

– Eu quero muito saber o que aconteceu. Mas sei que não tenho esse direito porque, como você mesmo disse, a gente nem se conhece. 

– Que bom que você tem esse senso. – Tento passar e acabo suspirando – Se me der licença, eu preciso voltar à droga daquela quadra.

Eu senti. Senti que Noah queria me dizer alguma coisa. Pelo tempo que ele ficou parado me encarando, eu soube que algo estava engasgado em sua garganta para sair. Seria uma crítica? Uma pergunta sobre o que teria me deixado nesse estado? Ou até mesmo um xingo por eu ser um babaca ignorante? 

Sim, definitivamente tinha algo ali que ele queria me dizer, mas Noah não o fez.

Ele apenas deu dois passos para trás, me permitindo a passagem, e eu segui até uma das pias à frente. Em silêncio, passei a água pelo meu rosto e, com isso, a vontade de chorar automaticamente voltou. Não por causa da bolada que eu levei do asqueroso do Gabriel, mas sim pelo meu estado atual. No que eu me transformei. Eu sou ridículo.

Respiro fundo e apoio minhas mãos na beira da pia. O estágio está apenas no começo e, como sempre, já estou fodido, como em tudo na minha vida.

– Está sangrando. - Ouço Noah dizer e sigo seu olhar até meu pulso, que pinga sangue no chão. – Posso ver?

– Não precisa. - Minha voz sai alterada –  Eu só devo ter me arranhado em uma das grades que dividem as quadras, nada demais.

– Ok. Espero que fique bem, de verdade. – Abre a porta do vestiário. – Sabe onde me encontrar.

E ele esperou. Durante longos – quase infinitos – segundos, Noah ficou lá na porta me encarando e esperando uma resposta minha. Ou talvez ele só estivesse me chamando de frouxo mentalmente. O que não seria mentira, porque realmente não houve uma resposta minha para ele.

Três horas de estágio e uma ida ao banheiro depois, o desespero bateu em mim quando me vi urinar sangue depois de meses que isso não acontecia

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Três horas de estágio e uma ida ao banheiro depois, o desespero bateu em mim quando me vi urinar sangue depois de meses que isso não acontecia. É óbvio que eu não saí correndo mais uma vez, mas me segurei muito para não fazer isso. Quando o professor, enfim, nos liberou, eu não suportei esperar mais e peguei o primeiro ônibus à caminho da clínica médica. 

– Ah, Rafael – Jaques suspira e encosta as costas à cadeira, largando a caneta em cima do seu bloco de receitas – Bom, eu posso deduzir que não está tudo bem só pelo jeito que você invadiu a minha sala. Acertei?

– Eu mijei sangue hoje. Faz muito tempo que isso não acontece. 

Jaques é o urologista que me atende desde o dia em que eu vim para São Paulo. Não vou mentir, ele tem muita paciência comigo, porque eu sei que sou um paciente insuportável.

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