Poesia das Espadas.

Prólogo

Mãos grandes passeavam pelo seu corpo. Eram mãos indesejáveis, repugnantes. O que tornava àquelas mãos assustadoras não era sua aparência, até porque tinham uma aparência completamente normal, mas sim suas intenções. Os dedos passaram pelo abdômen, depois os seios , até que chegaram no pescoço. Os dedos dominaram, e depois sufocaram, e no meio daquela escuridão, surgiu olhos brilhantes que para ele apenas refletiam desejo, mas para Annabella, era apenas maldade compulsiva. Ele sorriu e fez o que ela não queria.

Annabella acordou.

Era manhã, mas o sol ainda não havia consumido os céus com sua luz alaranjada, ainda era uma escuridão aconchegante e perigosa. E havia uma mão em seu pescoço. Ela estava deitada sob uma capa grande e grossa de pele de urso jogada no chão. Bella olhou ao seu redor, era uma floresta e logo ao seu lado, estava um córrego. As mãos que estavam no seu pescoço não eram cheia de intenções maldosas. Mas cheias de carinho.

— o que está fazendo?

— Carinho, não gosta? — Respondeu Kyle.

— não no meu pescoço! — respondeu ríspida e se levantou. A manhã fria atacou seu corpo despido e ela pegou sua capa jogada na grama e se cobriu. — Essa é a última vez que fazemos isso. Preciso sair da cidade, tenho compromisso.

Kyle suspirou.

— Você sempre diz isso, e acaba voltando pra mim.

— Agora é sério. — lançou um olhar triste para ele. Kyle se vestia e ela observou suas costas cobertas de cicatrizes e manchas verdes.

Kyle era guarda do fogo. Apesar do nome, ele tinha apenas a função de patrulhar as estradas à noite e acender as lamparinas ao longo do caminho. Mas Bella sabia que ele fazia outras coisas além de acender lamparinas; as cicatrizes e suas noites juntos na floresta era uma prova disso.

— Você guardaria um segredo? — Ela se virou ainda com um olhar triste.

— Claro que posso. Você já guarda metade dos meus segredos, é justo eu também guardar os seus. — Seus cabelos longos e escuros cobriram seus olhos por um momento, ele amarrou em um rabo de cavalo, agora mostrando um olhar de preocupação. Desde que Kyle conhecera Bella, ele soube que era uma mulher reservada. E de repente, contar um segredo não era um bom sinal.

— Vou me tornar uma renegada, vou sair da cidade, vou embora. — Ela foi até o córrego e encheu as mãos com água e molhou o rosto, assim ele não saberia que estava chorando.

— Mas por quê? — Ele se ajoelhou e ficou ao lado dela. — Você está chorando? Não é todo dia que isso acontece... — seu tom soou sarcástico o que fez Bella rir um pouco; no tempo que ela estava vivendo, e pelo que passava, às vezes ela merecia sorrir.

— Não posso dizer, mas, quero que fique sabendo que eu... eu tenho uma filha, nós temos. — Kyle arregalou os olhos, sem acreditar — Quero que cuide dela... — Bella foi interrompida por gritos vindo dentre as árvores.

— Droga, são os outros guardas do fogo. Vai embora, à tarde nós conversamos, agora vai!

Bella correu e se escondeu nas árvores, observando Kyle ao longe. Observando cada detalhe dele, cada movimento, para não esquecê-lo.

— Aí está você Kyle, dormiu na floresta de novo? — Das árvores saiu quatro guardas. — Escutou alguns gemidos na floresta? Parece que havia alguma criatura aqui.

— Não, não ouvi — Kyle ficou um pouco constrangido e preocupado, afinal, era para ele ficar à noite toda vigiando as estradas. — Desculpa, às vezes o sono é muito intenso...

Annabella ficou ali parada, observando. Ela não contou que já era uma renegada, e que, naquela noite, Kyle havia se deitado com uma criminosa e traidora. A chance dela dizer que o amava pela última vez se foi. Teria que ir embora naquele momento.

— Apenas queria ver se tinha acontecido alguma coisa com você. Espero que não durma mais Kyle, você é um ótimo soldado, não quero vê-lo sendo rebaixado. — falou um guarda do fogo a Kyle, e virou para ir embora.

Foi nesse momento que ele se virou para olhar Bella, e Kyle a viu chorando. Ele percebeu que ela iria embora naquele momento.

Annabella decidiu se tornar renegada para evitar uma grande tragédia, um grande problema.

E esse problema era uma espada.

E um sonho de um mundo pacífico.