Karma

Capítulo 2: a vizinha

Acordei super cedo, empacotei as coisas, fiz uma faxina geral na casa. Às nove já estava falando com o Chris ao telefone, ele iria me ajudar com a mudança. O frete chegaria às onze e tudo já estava dentro das caixas. Verifiquei cada cantinho para confirmar se não deixara nada para trás. Cozinha, ok. Banheiro, ok. Ia olhei cada cômodo com atenção.

Quando Chris chegou, o frete já adiantava a mudança. Confirmei o endereço com o motorista para que tudo chegasse ao destino certo. Seguiria de carro com Christian logo atrás.

— Vem cá, Chris. Preciso que me ajude com esta caixa. – Disse apontando para o último quadrado de papelão que restara na casa. — Está pesada, ein. Quero ver se esses músculos são de verdade mesmo – O provoquei, enquanto apertava o muque que ele fez questão de exibir após meu comentário.

— Claro que são! – Brandou em meio à minha risada.

Chris era personal trainer em duas grandes academias da cidade. Vivia tentando me convencer a ser uma de suas alunas. "Você precisa ganhar massa, está muito magrinha". Dizia, enquanto eu reclamava que com o trabalho no restaurante eu mal tinha tempo para respirar, muito menos me dar o luxo de malhar.

Com tudo dentro do caminhão, seguimos o trajeto até Ipanema. Durante o percurso Chris me contou sobre os seus planos para sexta-feira.

— Contratei um karaokê! – Revelou, enquanto dirigia. — Você sabe que eu amo gente bêbada cantando. Elas se tornam as melhores pessoas do mundo, não existe timidez, apenas humilhação.

Gargalhamos juntos. Pela janela, já era possível observar Ipanema se aproximando. Recostei meus braços na porta, e apoiei meu queixo neles, com os olhos fechados, deixei que a brisa tocasse meu rosto levemente, o cheiro da maresia invadia minhas narinas. A praia era um dos meus lugares favoritos desde que me entendo por gente. Quando criança adorava brincar na areia, construía os meus castelos, brincava de ser princesa e sereia. Gostava mais quando fingia ser mulher peixe, imaginava a minha calda colorida, os meus cabelos enfeitados com conchinhas, meus colares de perolas. Dividia meus maiores segredos com os peixinhos, eram ótimos ouvintes, por sinal.

— Chegamos Any! – Informou Christian me trazendo de volta a realidade.

Subimos todas as caixas, um total de 20, para ser exata. O cansaço já nos dominava, mas ainda estávamos longe de terminar. Agora precisávamos esvaziar cada caixa e colocar cada coisinha no seu devido lugar.

Ding dong. Eu e Chris nos entreolhamos confusos enquanto a campanha tocava. Ding dong. Abandonei a caixa que estava desempacotando e corri para atender. Era uma mulher, que aparentava ter mais ou menos a mesma idade que eu e a mesma altura também. Os olhos amendoados se fechavam acompanhando o sorriso que estampava no rosto.

— Oi, tudo bom? Eu moro aqui na porta ao lado, no 603. Seremos vizinhas. Me chamo Maite Perroni, prazer. – Se apresentou estendendo uma das mãos para que eu pudesse cumprimentá-la.

— Anahi Portilla, prazer. – Enquanto me apresentava, ela me entregou um potinho que segurava com a outra mão.

— São sanduíches de atum. Sei que mudanças dão fome e você e o seu namorado devem estar famintos.

— Meu namorado? – Franzi o cenho.

Christian estava há alguns palmos atrás de mim e se aproximava com um enorme sorriso debochado no rosto.

— Ela não faz o meu tipo. – Brincou, enquanto tomava o pote de sanduíches das minhas mãos e Maite o encarava um pouco assustada com a resposta. — Cá, entre nós – disse baixinho se aproximando do ouvindo da vizinha. — da fruta que vocês gostam, eu chupo até o caroço.

— Ay, Christian! – Disse dando um leve tapinha em seu braço, enquanto os três gargalhávamos em uníssono.

— Mai, o que acha de se juntar a nossa festa sexta feira? – Ele perguntou retomando o assunto enquanto Maite limpava as lágrimas da gargalhada no conto dos olhos.

— É, Mai. Vai ser uma comemoração para celebrar a mudança.

Reafirmei o convite e Maite agradeceu, prometendo que viria. Chris comentou que teria karaokê e os dois começaram a conversar animados sobre as canções que poderíamos cantar juntos. Todo aquele papo começou a me deixar ansiosa para o tal open house organizado por Christian e torci para que sexta chegasse logo.